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O Brasil vai legalizar a Cannabis? Esse foi um dos assuntos mais debatidos na semana, já que retornou à mesa dos ministros do STF. No entanto, o que se discute neste texto não é se a Cannabis deveria ser ou não ser legalizada, mas, sim, se o STF é a instituição adequada para tomar essa decisão, diz Anne Dias na Crusoé.
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00:00Como vocês já devem saber, ontem, por oito votos a três, o Supremo Tribunal Federal aprovou a tese da descriminalização da maconha.
00:10Isso não quer dizer que ela tenha sido liberada. Vamos explorar isso com calma aqui no programa de hoje.
00:17Essa decisão ainda vai passar por modulação. Os ministros ainda vão definir uma tese sobre a quantidade máxima de maconha que a pessoa pode portar
00:27para que ela seja considerada traficante ou não. Mas mesmo assim, os ministros deixaram claro ontem que isso não significa que o cidadão vai poder fumar maconha na rua.
00:39Não é disso que se trata. É outra questão. É uma questão muito mais complexa.
00:44Para falar sobre esse tema, para explorar um pouco mais esse tema de forma técnica, eu estou aqui com o professor de Direito Criminal do IMEK Rio de Janeiro, o Taiguara Líbano.
00:55Doutor, seja muito bem-vindo.
00:58Boa tarde, Wilson.
01:00E também sou com a delegada de polícia Luana Darfico.
01:04Por favor, doutora. Seja muito bem-vinda.
01:05Boa tarde. Boa tarde. Boa tarde a todos os ouvintes e aos colegas que estão aqui presentes.
01:11Doutora, quero começar com a senhora por um motivo muito simples. A senhora, como é delegada de polícia, a senhora sente isso na prática.
01:17E a senhora nas redes sociais tem feito um alerta importantíssimo.
01:22Até agora há pouco vi um desabafo da senhora dizendo que é bem chato ficar combatendo fake news.
01:29Para que fique muito claro para todas as pessoas que nos escutam, que nos acompanham, que nos assistem nesse momento ao vivo.
01:36Foi liberada a maconha, sim ou não?
01:38De forma alguma. Inclusive foi algo reiterado no plenário que o STF não estava liberando a maconha.
01:48E aí a gente tem até uns desdobramentos que se tornam cansativos.
01:53A realidade, Wilson, é que a legislação brasileira é muito elitizada.
01:58No sentido de que a população, o povo, não consegue compreender a complexidade do fato.
02:05Porque a própria lei é complexa demais.
02:09E nesse ponto a gente precisa lembrar que o STF, ele é o guardião da constituição, assim dito, de uma forma simples.
02:19E é a ele que compete julgar a constitucionalidade ou inconstitucionalidade de uma lei.
02:24A gente precisa lembrar que essa ação que bateu na porta do STF era para considerar a descriminalização do artigo 28 para todas as drogas.
02:37A grande discussão aqui, e eu ouvi até o senador Plini falando antes, etc e tal, é que se tivesse seguido o papel que o STF tem que seguir,
02:49que é ou eu vou dar provimento à inconstitucionalidade ou não, ele deveria atender ao pedido do recurso.
02:58Mas ele extrapolou um pouco, ele não considerou mais crime, mas considerou ilícito administrativo,
03:05sem dar até agora informações concretas como que isso vai funcionar.
03:09É, porque tem um detalhe, né, a questão da modulação do, enfim, da gramatura da droga ainda vai ser alvo do julgamento de hoje, né, doutora?
03:18Quer dizer, ainda precisa se definir esse parâmetro.
03:19E são três correntes, né, que foram citadas no julgamento de ontem, né?
03:22Quer dizer, aquela ala mais conservadora do André Mendonça citou, ok, podemos liberar até 25 gramas.
03:29Aí, acho que se não me engano...
03:29É, o André começou com 10 gramas, na verdade.
03:31Com 10 gramas, depois ele evoluiu para 25, se não me engano, né?
03:35Aí ele foi com o pessoal de deixar o legislativo decidir.
03:39É, e aí temos aí a ala do Alexandre de Moraes que falou até 60 gramas.
03:43Quer dizer, eu imagino que para você fiscalizar e para você combater isso, deve ser algo muito complicado.
03:51Porque o nosso sistema judicial, ele é um sistema complexo.
03:54Se o policial militar lá na ponta não consegue ter um conjunto probatório consistente,
03:59quando chegar no final da ação penal, aquele cidadão ali, você não sabe para onde ele vai.
04:04Se ele vai para a cadeia, se ele vai ser libertado.
04:06Enfim, doutor, imagino que deve ser algo muito complicado na prática de se aplicar isso, não?
04:11Exatamente.
04:12Na prática, no dia a dia, é o que eu falo.
04:15Esse alvoroço todo sobre a decisão do STF, ele advém de pessoas que talvez desconheçam hoje as consequências do artigo 28.
04:25Então, eu parto desse pressuposto.
04:26Hoje, no Brasil, o usuário, aquele que porta droga para consumo, ele não é preso, né?
04:33Então, o primeiro ponto é esse.
04:35O usuário, hoje, no Brasil, ele não é preso, porque as medidas previstas no artigo 28, nenhuma prevê restrição da liberdade.
04:43O usuário, hoje, no Brasil, não serve sua condenação para fins de reincidência.
04:48O usuário, no Brasil, não pode ser conduzido coercitivamente.
04:52Então, afinal de contas, o que muda diretamente entre ilícito penal e ilícito administrativo, que é agora a decisão do STF?
04:59É a geração gerar maus antecedentes.
05:02É aquele fichamento.
05:03Ele passa a não ser mais fichado.
05:06Agora, a maconha no Brasil, e é importante frisar isso, ela é ilegal.
05:11É ilegal você fumar maconha, usar maconha, portar maconha.
05:15Só que agora há uma ilegalidade criminal e há uma ilegalidade o quê?
05:22Administrativa.
05:23Isso faz consequência, como parâmetro para a comparação, a mesma coisa do cigarro eletrônico hoje no Brasil.
05:30A mesma coisa do porte de uma arma de brinquedo, de um spray de pimenta,
05:35que são produtos que não podem ser adquiridos, portados por qualquer cidadão.
05:40No momento em que há uma abordagem, esse produto vai ser apreendido.
05:44Então, se você estiver com um cigarro de maconha, não ache que o policial, que a autoridade administrativa do Estado,
05:51não possa apreender esse cigarro de maconha.
05:54O que vai mudar é o quê?
05:56Que você não vai ganhar um inquérito, um TCO, no caso, envolvendo esse fato.
06:02Vai ganhar o quê?
06:04Aí são as várias perguntas sobre a decisão do STF, porque faltou muita informação.
06:10E na prática, na prática mesmo, o que se desejava com essa decisão,
06:14o que se tinha de argumento pró a decisão de descriminalização,
06:19principalmente era desafogar o judiciário, desafogar a polícia
06:22e também diminuir as injustiças entre os usuários de classes sociais mais baixas e mais altas.
06:30E eu não vejo, eu olho com preocupação essa decisão do STF.
06:36Primeiro, porque, como eu disse, o policial vai continuar apreendendo,
06:39a delegacia vai ter que ter uma balança, vai apreender essa droga,
06:45vai desenrolar, talvez, a investigação para ver a origem dessa droga.
06:50Então, no final, será que a gente tem um argumento que comporte?
06:55Será mesmo que, a partir do momento que eu uso o direito administrativo sancionador
06:59no lugar do direito penal, para poder implicar a multa,
07:03eu estou diminuindo as injustiças sociais?
07:06A partir do momento que portar a droga para consumo,
07:09eu coloco como pena administrativa a multa.
07:13Isso é pior ou melhor do que estava no 28, que era uma advertência verbal?
07:18Então, fica aí os questionamentos.
07:19Será que, realmente, essa decisão do STF,
07:23ela é para ser comemorada pela ala que gostaria da descriminalização?
07:28Então, assim, a gente fica com bastante preocupação no Brasil.
07:32É, doutora, eu fico imaginando, ontem, inclusive, até ironizando o meu Twitter,
07:35o que vai ter de vendedor de balanço de precisão,
07:38que está feliz hoje.
07:40Hoje, olha, se eu tivesse investimento, eu investiria em balanço de precisão,
07:44porque eu vou te falar, viu, o que vai se vender de balanço de precisão
07:49a partir de hoje não está escrito.
07:51Doutor Taiguara, seja muito bem-vindo, obrigado pela sua participação.
07:55Eu quero pegar um pouco o gancho da doutora Luana,
07:57porque, para as pessoas entenderem,
08:00essa é a grande diferença, inclusive, essa tese da punição administrativa
08:06foi algo já citado pelo ministro Dias Toffoli.
08:09Quer dizer, na prática, vou reforçar aqui,
08:12você sai de um ilícito penal para uma sanção administrativa.
08:17Isso pode incentivar a questão do porte de maconha.
08:21E outra coisa, você acha que o Supremo usurpou competência
08:26do Legislativo nesse caso?
08:30Perfeito, Wilson.
08:31Prazer, novamente, reitero, a falar com vocês.
08:35Doutora Luana, com muita maestria, praticamente esgotou o tema, né?
08:39Então, eu vou aqui acrescentar algumas observações.
08:44De fato, o Supremo, em decisão de ontem,
08:48formou maioria para entender pela descriminalização parcial,
08:54a verdade é essa, do artigo 28 da lei de drogas,
08:58lei 11.343, o tocante apenas à substância cannabis.
09:02De forma, então, que considera-se, a partir dessa decisão,
09:09a conduta do porte ou da posse da droga ilícita
09:14quando se trata da cannabis,
09:16passa-se a considerar um mero ilícito administrativo.
09:20Portanto, não mais circunscrito à competência no âmbito criminal.
09:24Como a doutora Luana colocou, há uma série de questionamentos.
09:27Quer dizer, esse ilícito administrativo será julgado e processado onde?
09:31Numa vara criminal ou será numa vara de outra natureza?
09:37São questões que ficam em aberto, né?
09:41E para além disso...
09:44Alô, vocês me ouvem?
09:47Oi, te ouço, doutor.
09:49Caiu rapidamente, mas eu te ouço ainda.
09:52Prossegue, doutor.
09:54Nilson?
09:55Eu estou te escutando, doutor.
09:57O senhor me escuta?
09:58Sua conexão deu uma pequena falhada.
10:02Está juntando? Perfeito.
10:02Ok, é que travou aqui para mim.
10:04Agora sim, vamos lá, siga.
10:06Ah, perfeito.
10:07Mas agora eu estou te ouvindo também.
10:09Perfeito, querido.
10:10Você fez uma pergunta também acerca da atuação do Supremo Tribunal Federal,
10:16se usurparia ou não a competência do legislativo.
10:18O fato é que temos observado, especialmente no contexto político recente do Brasil,
10:27conflitos entre poderes.
10:29Conflitos entre poderes são inerentes, inclusive, à dinâmica do sistema de tripartição de poderes,
10:35já desenhado lá atrás por Montesquieu.
10:38E o próprio pensador apresentou a ideia de um arranjo, que seria o quê?
10:44Os freios e contrapresos.
10:46Cada poder tem a sua competência precípua, mas há também os freios e contrapresos.
10:54Portanto, a competência de legislar, sem dúvida alguma, é do parlamento.
11:00Então, há parcial razão dos parlamentares, no sentido de que, olha,
11:05entendemos que caberia ao parlamento criar os crimes, criar os tipos penais, definir as penas.
11:13De fato, essa é a competência do parlamento.
11:17Por outro lado, também compete ao Poder Judiciário exercer o controle de constitucionalidade.
11:24Como disse o doutor Luana, o Supremo Tribunal Federal é o guardião da Constituição
11:28e isto não é uma brasilidade, não é uma jabuticaba, não é uma coisa exótica do Brasil.
11:36Essa é a sistemática que se observa em todos os estados constitucionais.
11:41Quem exerce o controle de constitucionalidade é a Corte Suprema, no caso brasileiro, o Supremo Tribunal Federal.
11:49Então, entendo que o Supremo tem legitimidade, sim, para deliberar acerca da constitucionalidade ou não do artigo 28.
11:57E restam aí questões importantes para definir, por relação à quantidade, né?
12:02Qual é a quantidade que será considerada aquela onde o sujeito está portando para uso pessoal
12:08ou aquela onde você já presume que haverá o porte para a comercialização.
12:15Então, são questões a serem definidas, inclusive, no julgamento,
12:18na sessão de julgamento de hoje do nosso Supremo Tribunal Federal.
12:21Agora, doutor, tem uma questão aí que aí eu fico realmente com a dúvida.
12:26Porque na decisão de ontem, o STF, aí é uma questão jurídica prática,
12:31aí eu vou deixar isso inclusive para os senhores.
12:34Enfim, o meu conhecimento de direito penal é um conhecimento prático
12:37da época que eu cobri o mensalão, isso já há 10 anos.
12:40Porque o que ocorre?
12:43Na decisão de ontem, os ministros decidiram,
12:44olha, vamos estabelecer aqui um patamar X para que seja considerado o tráfico ou não, né?
12:52Isso, inclusive, ainda é um estabelecimento relativo, né?
12:57Porque, dependendo de cada caso, essa gramatura pode ser identificada como o tráfico ou não,
13:01dependendo do antecedente daquela pessoa, caso ela seja pega em flagrante ou não.
13:05Enfim, em linhas gerais, o voto é um pouco nessa linha.
13:09E, enfim, jogaram a bomba para o Congresso.
13:12Só que tem um detalhe, só que no Congresso tem a votação,
13:18ontem o presidente da Câmara, o Arthur Lira,
13:20instituiu a comissão especial que vai discutir a PEC de drogas
13:23que proíbe o porte de qualquer natureza.
13:26E aí, como é que fica?
13:27Se for aprovada a PEC, essa decisão vai para o lixo?
13:31Tecnicamente, como é que funciona, senhores e senhora?
13:35Perfeito.
13:36A doutora Luana quer falar?
13:37Posso terminar aqui a posição?
13:39Perfeito.
13:41Bom, Wilson, o que ocorrerá, sem dúvida alguma,
13:45é que os parlamentares que forem minoria nessa votação,
13:50após concluída a tramitação legislativa,
13:53possivelmente vão ajuizar uma ação declaratória de constitucionalidade dessa PEC.
13:57E quem irá apreciar essa ADIM será o Supremo Tribunal Federal.
14:02e que, ao que tudo indica, não resta dúvida,
14:05que considerará inconstitucional a PEC 93 barra 2023.
14:12É o que se desenha.
14:14Naturalmente que haverá, com isso, uma grande grita,
14:17um grande clamo público.
14:20Enfim, mas a sistemática é essa.
14:23Essas são as regras do jogo.
14:25Quem exerce o controle de constitucionalidade é a Corte Suprema.
14:28Doutora Lona, e aí, o que nós fazemos com isso?
14:32Porque, na prática, entra naquela discussão.
14:35É o Supremo com a possibilidade de usurpar, mais uma vez,
14:39uma ação do Poder Legislativo.
14:41E ainda, por cima, é uma PEC.
14:43Porque o recurso extraordinário, ele discute um projeto de lei.
14:47Eu estou falando até de uma possibilidade de uma discussão,
14:50de uma emenda constitucional, que é mais grave ainda,
14:52quer dizer, que depende de qual não qualificar tanto na Câmara quanto no Senado.
14:55E aí, vamos ficar nesse pandemônio judicial?
14:58Pois é, Wilson.
14:59Eu peço até licença para falar de uma forma simples,
15:03porque, para mim, a gente está chutando cachorro morto
15:05quando você olha na prática.
15:07Primeiro porque emendas constitucionais, dispositivos constitucionais,
15:11não podem prever crimes.
15:12No máximo, mandados de criminalização.
15:14O que vai acontecer é que essa PEC vai falar que será crime.
15:18Só que, como eu disse, na prática,
15:21o artigo 28, que continua sendo um ilícito penal para as outras drogas,
15:26lembrar isso, é muito importante,
15:28LSD, crack, cocaína, não foi atingido pela decisão do STF.
15:32Em comparação com o ilícito administrativo,
15:36a diferença é somente a geração de maus antecedentes.
15:41Então, se o combate, por exemplo,
15:43se a ideia do Estado é combater, de certa forma, o porte de drogas,
15:50e eu entendo que doer no bolso do outro é melhor do que eu dar uma advertência verbal,
15:56e a advertência verbal é isso mesmo, é só chamar a atenção, falar,
15:59então, na verdade, é melhor que fique com o ilícito administrativo.
16:03Então, assim, nem mesmo aqueles que estão aí reproduzindo esse discurso
16:08de que, ah, vamos continuar como está, tem noção,
16:12estão tendo uma noção muito clara do que estamos trabalhando.
16:16Então, a gente tem que ponderar na balança.
16:18Será que é essencial mesmo só o nome de fato?
16:22É essencial que a nomenclatura seja ilícito penal?
16:25É essencial que a nomenclatura seja ilícito administrativo?
16:28O que resolve mesmo, que a gente tem que parar para pensar,
16:32é a sanção e a inibição do uso de drogas, do porte de drogas no país,
16:36porque ninguém discorda que, desde 2006, o Brasil, a nossa lei de drogas,
16:42não resolveu o problema de drogas no país.
16:44Então, a gente precisa olhar para isso.
16:47Outra coisa, essa quantidade de drogas que nós vamos trabalhar hoje,
16:52que o STF está aí querendo se definir,
16:56ela serve, de um lado, para a presunção de que aquela droga portada serve para consumo pessoal.
17:06Mas todos os ministros falaram que deve-se observar o caso concreto.
17:10Então, não ache que você, por estar com menos de 60 gramas,
17:14vai sempre se encadrar no ilícito administrativo.
17:17Se tiver outras informações, tem um caderno anotado, dinheiro,
17:21tudo que faz perceber que você está com aquela quantidade de droga para venda,
17:26você vai ser enquadrado como traficante.
17:29É difícil, porque o 33, ou isso, tem 18 verbos.
17:33São 18 condutas que permitem enquadrar o autor em tráfico.
17:39Enquanto o 28 é simplesmente o porte, a porte da droga para consumo pessoal.
17:44E aí, a gente tem um reverso disso, que não está sendo falado,
17:48e que eu estou discutindo, inclusive, com colegas.
17:50E até deixo aí para o doutor falar que a situação de que
17:54aquele que portar mais de 60 gramas,
17:58ele cai, então, numa presunção de traficância.
18:02Será que o reverso não é tão perigoso quanto o cenário atual?
18:06Então, fica aí a discussão para o Brasil perceber
18:09que essa decisão do STF, na prática, muda pouca coisa.
18:15A gente está perdendo tempo com essa discussão
18:17entre legislativo, entre PEC e Judiciário,
18:20e a gente precisa realmente discutir políticas públicas
18:22de combate de drogas no país.
18:24Doutora, só para ficar claro,
18:25acho que o doutor Taiguara pode nos ajudar.
18:28Reversão de traficância, só para a gente esclarecer esse conceito,
18:31porque como é um conceito técnico,
18:32então, só para a gente deixar claro aqui para a nossa audiência, por gentileza.
18:35Basicamente, o STF está querendo botar um critério objetivo
18:40para eu definir se esse cara está consumindo para uso próprio
18:45ou se ele é traficante.
18:47Esse critério objetivo, que é olhar, cara, crachar,
18:51ele não existe hoje no Brasil.
18:53Ele é subjetivo.
18:54Cada juiz entende de um jeito,
18:55cada um acha que uma quantidade é de uma forma, etc.
18:58Então, eles querem estabelecer um critério de quantidade objetiva.
19:02Até agora, mesmo com todas as vírgulas,
19:05o que está ganhando, ao meu ver, são os 60 gramas,
19:08porque a decisão da ministra Carmen Lúcia
19:10deixa os 60 gramas com 5 votos.
19:13Então, vamos supor que se estabeleça os 60 gramas
19:16como caráter objetivo.
19:18Ele é um dos requisitos para ser o consumo pessoal.
19:21Ele não é todos os requisitos.
19:23Eu ainda preciso olhar.
19:24Se eu estiver com 60 gramas,
19:26mas estiver cometendo o verbo vender,
19:28oferecer, você não pode oferecer droga
19:31para o seu amigo um baseado de maconha.
19:33Não pode.
19:34Você vai cair no 33.
19:36Agora, usou-se esse argumento para falar,
19:40olha, eu vou impedir as punições que vemos no Brasil
19:43de homens, pessoas pobres, pretas, marginalizadas,
19:48que estavam sendo colocadas como traficantes
19:50com 20, 15 gramas de maconha.
19:54Só que o contrário.
19:55E quantos no Brasil, com mais de 60 gramas,
19:58vamos botar 61 gramas,
20:00não foram colocados como porte para consumo pessoal.
20:05Então, se a gente também caminha no reverso perigoso,
20:08a partir de 61 gramas,
20:09então ele vai ter presunção de que ele é traficante.
20:13Mesmo que a situação ele estivesse portando para consumo pessoal,
20:16vai dar o quê?
20:17Muito mais trabalho para a defesa
20:19e também vai gerar injustiças no meio do direito.
20:23Então, assim, é bem complicado.
20:25Todos os desdobramentos da decisão,
20:28embora até eu veja aí uma boa vontade do STF.
20:31doutor Taiguara, para a gente complementar.
20:35Não, perfeito, Wilson.
20:37Realmente, os desafios são importantes.
20:40O Supremo precisa definir uma série de questões.
20:43Como o doutor Olona disse,
20:44se trata de um hard case, não é uma questão simples.
20:48De fato, será necessário analisar o caso concreto.
20:51É possível que se cogite de alguém comercializando droga,
20:55no caso canates,
20:56em uma quantidade inferior a 60 gramas,
20:59que pese ser o cenário menos provável,
21:00mas é possível ocorrer isso.
21:02De igual modo, também é possível que uma pessoa usuária
21:04seja interpelada por uma autoridade policial
21:07portando quantidade superior a 60 gramas.
21:11Quer dizer, e me parece que o Supremo tem que dar conta disso.
21:14Como?
21:15Quer dizer, estabelecer um parâmetro,
21:16mas também entendendo que há um distinto,
21:21que há possibilidade de, em alguns casos peculiares,
21:25que, fugindo do critério meramente quantitativo,
21:29você possa formar a convicção adequada
21:31sobre aquele caso concreto.
21:33Então, portanto, essa zona de imprecisão,
21:37de indeterminação, permanecerá.
21:41Na verdade, de forma indesejável,
21:43porque a decisão do Supremo vem aqui justamente
21:46para repelir a seletividade na aplicação da lei penal,
21:51porque, em regra, jovens, pobres e negros,
21:55usuários de bairros periféricos,
21:58eram taxados como traficantes,
22:00ao passo que em bairros não periféricos,
22:04isso poderia enquadrá-los como usuários,
22:09se encontrados com a mesma quantidade de dólar.
22:11Quer dizer, então, essa discricionariedade,
22:15essa seletividade, não será superada.
22:19Quer dizer, ainda haverá problemas.
22:22E aí, espero que o Supremo tenha muito equilíbrio
22:25para que possa proferir uma decisão mais segura,
22:30gerando um ambiente um pouco mais palatável
22:32na sociedade e na classe política.
22:34Doutor Taiguari, me lembrei de uma frase
22:36que eu escutei pela primeira vez em 2013
22:41com o doutor Alberto Zaccaras Toron,
22:43criminalista, que, obviamente, os senhores conhecem,
22:45quando ele me falou sobre aquele princípio
22:47do direito norte-americano,
22:48hard case make better law.
22:50Então, eu acho que estamos aí diante do clássico
22:53hard case make better law.
22:55Gente, olha, doutor...
22:58Doutor Taiguari, muito obrigado pela atenção.
23:02Doutora Luana, muito obrigado pela participação.
23:04Obrigado pela gentileza mais uma vez.
23:06Só para a gente fechar, só uma questão prática, doutora.
23:10A pessoa falou sobre a questão da aplicação da lei.
23:13Tem uma questão que eu fico pensando,
23:15porque isso eu já observei, tá?
23:17De novo, é questão de você observar o fato concreto.
23:19E eu gosto desse Brasil real.
23:21Como é que a gente teorize, fale N coisas, nananã.
23:24Eu gosto de ir um pouco para a base.
23:27E eu já vi muito barra desse,
23:29muito boteco desse,
23:31em que você tem um camaradinha
23:33que oferece um baseado para três, quatro.
23:36Essa pessoa falou da questão dos 60 gramas,
23:38se isso pode ser considerado como tráfico ou não.
23:41E a decisão de ontem do Supremo,
23:42os ministros foram muito claros.
23:44Gente, olha, estamos descriminalizando a maconha,
23:47mas isso não significa que você possa usar em praça pública.
23:51Agora, eu fico imaginando a abordagem policial
23:53do cidadão que, por exemplo, está no boteco,
23:56está lá com a sua trouxa de 60 gramas de maconha,
24:00sai oferecendo para os amigos,
24:01e aí, se um cara desse pega em flagrante,
24:04obviamente ele pode responder para o tráfico.
24:06Ou eu estou aqui imaginando coisas.
24:08Tá, perfeito.
24:09De novo,
24:10o artigo 33 tem 18 verbos,
24:12entre eles,
24:13oferecer ainda que gratuitamente droga.
24:16O artigo 28,
24:18que foi o artigo enfrentado pelo STF,
24:22ele fala simplesmente
24:23porte ou posse para consumo.
24:26Então, assim,
24:27em outras palavras,
24:28o uso da droga
24:30e o porte da droga pessoal
24:32para o seu consumo
24:34é o que sofreu a descriminalização.
24:37Inclusive,
24:37também preciso fazer uma ressalva
24:39que o STF permitiu,
24:41lá nos votos,
24:42o plantio,
24:43o cultivo e a semente
24:44que estão no paráfrofo primeiro.
24:46Até colocaram,
24:47acho que seis plantas fêmeas,
24:48né,
24:49nessa quantidade.
24:51Agora,
24:52oferecer,
24:54entregar,
24:55ainda que gratuitamente,
24:56você saindo do porte
24:58e do próprio uso da droga,
25:00dentro desses estandards aí do STF,
25:03você vai cair direto no 33.
25:06Então, assim,
25:06não ache que está liberado droga,
25:09você não pode oferecer droga.
25:11Tem ainda que se você oferecer,
25:13eventualmente,
25:13para a pessoa do seu convívio,
25:15né,
25:16para juntos consumirem,
25:17você cai um 33,
25:19assim,
25:19melhor,
25:20que é o 33,
25:21parágrafo terceiro,
25:22que é o tráfico compartilhado
25:24e que não é um crime equiparado
25:25hediondo,
25:26mas ainda você vai ser o quê?
25:29Criminalizado.
25:30E outra coisa,
25:31ao contrário,
25:32por exemplo,
25:32do cigarro eletrônico,
25:34do colete balístico,
25:35que se você importar,
25:37mesmo não sendo o crime
25:38o porte aqui,
25:39você vai responder por contrabando,
25:41na maconha,
25:42você vai responder pelo 33,
25:44porque o verbo importar
25:45está no 33,
25:47no tráfico de drogas,
25:48que eu preciso lembrar
25:49que é crime equiparado
25:51hediondo e inafiançável.
25:53Então, assim,
25:54é bem importante
25:55deixar claro isso,
25:57maconha continua
25:58ilegal no Brasil,
26:00só não é uma
26:01ilegalidade criminal,
26:02e sim administrativa.
26:11Obrigado.

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