No Só Vale a Verdade, Marco Antonio Villa recebe o sociólogo e cientista político, Bolívar Lamounier, para debater o futuro da política brasileira e soluções para a crise. Lamounier clama por mudanças profundas na política brasileira, enfatizando a importância do voto consciente para determinar o futuro do país.
Confira o programa na íntegra em: https://youtube.com/live/BI7i69yxs-o
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00:00E nessa situação então, professor, que a gente está passando agora, conflitos constantes entre os três poderes.
00:08Há uma disputa o executivo-legislativo e aí os dois acabam um ou outro demandando o Supremo Tribunal Federal.
00:17Lembrando a quem nos acompanha que o poder judiciário é inerte, ele só age quando demandado ou quando provocado, se assim preferir, no sentido jurídico.
00:25E nós vivemos crises constantes nos últimos anos, o Supremo Tribunal Federal agindo porque é demandado.
00:32Aí é acusado de estar judicializando a política ou legislando em nome do legislativo.
00:38E o legislativo deixa de legislar, inclusive matérias constitucionais que vêm de 1988, que estava sendo legislado há um tempão.
00:46E o executivo, muitas vezes através da medida provisória, acaba também legislando o que seria a tarefa do legislativo.
00:53O legislativo quer ver a execução das emendas parlamentares, que é a tarefa do executivo à execução.
01:00Bem, em suma, vivemos um carnaval, como se dizia antigamente, uma confusão entre os poderes.
01:07Como é que nós vamos pôr ordem nesses poderes?
01:09É uma nova Assembleia Constituinte?
01:11É as pessoas terem bom senso?
01:13Como que nós podemos resolver essa questão?
01:15É, essa é a questão.
01:18O Supremo Tribunal Federal, muitas vezes faz coisas que eu não gosto, mas o Supremo, muitos membros dele foram nomeados pelos últimos presidentes, né?
01:33Ali tem problemas, mas nós não podemos mexer, é o sagrado.
01:38Agora, veja bem, é como eu tenho dito desde as cavernas, os partidos políticos confiáveis são uma peça-chave de qualquer democracia.
01:58Os nossos não eram grande coisa antes de 64, mas, bem ou mal, estavam evoluindo.
02:05Depois do período militar, em que se abriu a porteira, a boiada passou.
02:12Então, nós passamos a ter micropartidos, micropartidos com lideranças inexpressivas.
02:21Na verdade, o sujeito, para conseguir ser candidato, tem que pedir a bênção do chefão, do oligarca que manda no partido.
02:30E aí nós chegamos, se não me engano, agora a 25 partidos e tem mais uns 10 na fila.
02:38Se as coisas conseguirem, prosseguirem assim, nós vamos chegar a 100 partidos um dia desses.
02:45A verdade, eu entendo por partido uma organização com amplitude e força suficiente para enfrentar os interesses corporativos.
02:58Quer dizer, os grupinhos que se inserem na administração pública e metem a mão em tudo e não cumprem nada e etc.
03:10Um partido que é menor do que um grupo corporativo não é um partido.
03:16Então, nós temos que começar por aí.
03:19Como é que nós vamos fazer isso?
03:21No momento, eu não vejo como, porque nós temos também uma constituição que é o samba do crioulo doido, como dizia o Stanislau Ponte Preta.
03:33Primeiro, ela tem essa coisa extraordinária que é o passado em julgado.
03:39O sujeito, se for medianamente rico, ele não precisa fazer nada, só contrata um advogado, espera o tempo passar, a acusação prescreve e ele se livra da acusação.
03:55Em vez de cumprir a sentença, logo, foi acusado, condenado, cadeia.
04:01Aí, nós já temos uma bobagem colossal.
04:05Nós temos os correios falidos há muito tempo, mas a constituição proíbe que ele seja privatizado.
04:14Então, é claro que nós estamos num angu, num beco sem saída.
04:19Então, nós temos que, este ano, a partir de agora, passar por cima, no bom sentido, dessas loucuras todas que foram esculpidas na constituição e temos que fazer uma eleição com muito mais qualidade do que nós temos feito.
04:42Nós temos que ter consciência desses problemas, porque convocar outra constituição, fazer uma nova constituição, teria que convocar uma nova constituição e ninguém garante que ela vai ser melhor do que a atual.
04:57Então, nós temos que mudar os atores do drama, os dramatis personae, os que já têm condições de agir.
05:11Nós temos que começar, com toda seriedade, uma convocação em alto e bom som, ao que eu chamei a classe média alta, e, através dela, uma outra parte que vem depois,
05:27que vote pensando que ir à urna não é uma brincadeira, não é uma brincadeira.
05:34O voto não é só o fato de uma pessoa te representar, o voto é também um poder que te permite mandar nele.
05:44Se não está cumprindo as coisas do jeito que devem ser cumpridas, que seja afastado de lá, impeachment, qualquer coisa.
05:52Mas nós temos que mudar essa mecânica já agora, porque se nós não fizermos isso, aquela crise que eu mencionei para daqui a 15 anos, não vai ser para almas frágeis.
06:05Vai ser para almas endurecidas pelo tempo.
06:09Ou seja, nós temos, é isso que eu falo, ensinar a política para adultos, universitários avançados e profissionais estabelecidos.
06:19Essa gente pode fazer a diferença.
06:22É a alta classe média, são os profissionais que já estão na lide, mas que já esqueceram quase tudo.
06:33E, por isso, se enfurnaram em casa, preferem ficar curtindo televisão, mas que não se associam, não fazem uma reunião.
06:42Não organizam na casa de um amigo, uma turma de 20.
06:49Falam, vamos ver como é que está o Brasil?
06:51Vamos ver como é que está o Congresso?
06:52Vamos pensar nisso?
06:54Não, esses pessoal não fazem nem isso.
06:56Então, assim, nós somos um país democrático sem democratas.
07:02Não dá, não dá.
07:03Muito difícil.
07:04Eu me lembrei agora do título de um livro do Ortega, Ser Espanha Invertebrada, né?
07:09Nós podemos dizer que o Brasil é um país invertebrado.
