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O professor da disciplina de direito e economia do Insper, Felipe de Mendonça Lopes, comenta os resultados das pesquisas acadêmicas feitas no Brasil sobre o Supremo Tribunal Federal. Ele atestou que a corte é mais governista que o STJ, que seus ministros alongaram os votos depois do advento da TV Justiça e que buscam votar de acordo com a maioria. Mas afirmou não terem sido encontradas evidências de que eles votam de acordo com o presidente que os indicou para o cargo.
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NotíciasTranscrição
00:00Olá, seja muito bem-vindo. Eu sou o Duda Teixeira e esse é mais um Cruzoé Entrevistas. Hoje vamos
00:14conversar sobre como a ciência explica o STF. Para falar sobre o assunto, a gente convidou
00:21o Felipe de Mendonça Lopes. Felipe que é economista e dá aula de Direito e Economia
00:27no INSPE. O Felipe já está aqui comigo no estúdio, tem vários estudos que ele fez que são muito
00:35interessantes que a gente vai comentar eles aqui mais para frente. Felipe, seja muito bem-vindo aqui
00:40ao Cruzoé Entrevistas. Olha, é um grande prazer estar aqui, Duda, muito obrigado pelo convite. O Supremo
00:46está aí sempre na pauta do dia, é muito agradável ser convidado a falar sobre o Supremo. É um ótimo
00:53assunto, né? Bom, Felipe, eu queria começar conversando. Nós tivemos aí, há algumas
00:59semanas, o voto do ministro Cristiano Zanin, que foi indicado pelo Lula. Aliás, teve mais de um voto
01:06dele. Ele foi contra a descriminalização da maconha e foi contra considerar como injúria racial as
01:13as ofensas às pessoas LGBTQIA+. Foi super criticado pela esquerda, pelo PT, e aí o Lula veio com uma
01:23ideia de que o voto, os votos dos ministros do STF fossem sigilosos. Aí te pergunto duas coisinhas.
01:30É possível, seria possível fazer isso e poderia ter algum efeito positivo?
01:38Olha, parece muito difícil implementar na prática um voto sigiloso no Supremo, né? Porque assim, o Supremo,
01:47além do que está escrito na Constituição, né? O Supremo, ele tem uma tradição muito longa, né? De
01:52transparência, né? Mesmo antes, se a gente for pensar no mundo antes da existência da TV Justiça,
01:59né? Que foi, que iniciou, né? A transmissão das sessões do Supremo em 2002, né? Se a gente for pensar no mundo
02:06anterior a 2002, as sessões do Supremo sempre foram públicas, né? Sempre qualquer pessoa pôde acessar o
02:14plenário do Supremo e assistir, né? O que, ou seja, o que os ministros estivessem decidindo naquele
02:20momento, né? Então, para você efetivamente tornar sigiloso, né? O voto dos ministros, você teria que, de
02:27alguma forma, impedir que as pessoas sequer acessassem o plenário do Supremo, né? Durante, né? As discussões dos
02:34ministros, né? Então, você teria que ter sessões fechadas. Uma coisa nada democrática, né?
02:40Além de me parecer pouco democrático, né? É uma decisão que vai totalmente contra a história do
02:47Supremo, né? O Supremo, ele sempre foi uma corte aberta, né? Mesmo nos momentos mais negros da nossa
02:54história, né? Na ditadura militar, o Supremo sempre foi uma corte muito aberta, né? Então, você tentar,
03:00de alguma forma, bloquear a publicidade das decisões, me parece, além de pouco prático, né? Pouco
03:08factível, me parece uma decisão bastante polêmica. Aí teria que fechar o plenário, teria que proibir a
03:15divulgação dos votos e teria que fechar a TV Justiça, ou não permitir a transmissão, né? Dos julgamentos
03:26vídeos, pelo YouTube ou pelo canal. Mas isso aí até teria um impacto positivo, não? Então, a gente,
03:34a TV Justiça, né? O impacto da TV Justiça no Supremo teve várias facetas, né? Na época que a TV Justiça
03:42foi criada, isso foi uma lei lá de 2002 que criou a TV Justiça, inclusive foi o próprio ministro Marco
03:49Aurélio, no exercício da presidência da república, que sancionou a lei que criou a TV Justiça, né? Você teve
03:55uma certa polêmica, aparentemente, né? Alguns ministros do Supremo, na época, não se sentiam muito
04:01confortáveis com a ideia, né? Mas foi, o fato é que foi implementado, né? E a gente tem pesquisa, né?
04:08Hoje em dia eu desenvolvi um trabalho de pesquisa, né? Que mostra, né? Que o fato de você
04:14televisionar, né? As sessões ao vivo ali, você modifica o comportamento dos ministros, né? E como que
04:22você modifica o comportamento dos ministros, né? Eles gostam, digamos que eles gostam da exposição
04:29que a TV eles dá, né? E ao gostar dessa exposição que a TV eles dá, eles buscam falar mais, ficar mais tempo
04:36falando na televisão, né? Então, você tem votos mais alongados, né? E você tem mais tempo gasto, né?
04:45Em interações entre os ministros, né? Então, você, o que dá pra gente documentar, né? É que depois da TV
04:53Justiça, os acordos se tornaram mais longos, né? E as discussões também se tornaram mais longas.
05:01Os acordos são esses textos que juntam os votos todos com a discussão, né?
05:07Exatamente.
05:07E você calculou quanto mais longo, não é isso?
05:11Isso! Eu fiz uma média, né? O trabalho que eu fiz, ele tem lá um exercício econométrico,
05:18bonitinho, né? Eu uso um método que chama de diferenças e indiferenças, né? Pra estimar exatamente
05:23o impacto da TV Justiça. E eu chego, né? Só pra ilustrar, né? Num número de 26 páginas a mais,
05:32se eu não me engano, né? Esse é o número que eu chego a mais no tamanho dos acordos.
05:36Mas por que que esses 26 páginas é importante, né? É porque os ministros, eles, nas sessões,
05:42nada mais fazem do que ler, né? Essas 26 páginas, né? Eles ficam lá, né? Lendo seus votos.
05:48Então, isso estende a duração das sessões do Supremo.
05:52Imagino que você não leu tudo também, né? Certamente não!
05:57E você tem uma ideia de qual que era o tamanho de um acordão médio, assim?
06:01Ah, agora eu não vou me recordar exatamente dos números, né? Varia bastante, né?
06:09Mas você tem claramente ali uma mudança de padrão, né? Depois do início da TV Justiça,
06:15com extensão de votos e extensão de discussões.
06:18Super interessante.
06:19Felipe, uma outra coisa que a gente está observando, na hora que entra o Zanin, ele senta ali à direita,
06:25e aí tem uma dança das cadeiras, né? Eles têm uma regrinha de como eles sentam e têm uma regrinha também
06:31de como eles votam. Você podia explicar que regra é essa e se ela interfere, de alguma maneira,
06:39nos votos dos ministros?
06:41Exatamente. O Supremo tem toda uma coreografia, né? Desde a roupa que eles usam, né? O exército dos capinhas, né?
06:50Que ficam os assessores que ficam atrás dos ministros, né? E parte desse cerimonial, né?
06:57Desse teatro que é o Supremo, né? Você tem a questão da serionidade, né?
07:04Então, sempre o juiz mais sênior, e quando eu digo mais sênior, é o mais antigo da corte, né?
07:11Ele vota mais perto da presidência da corte, né? Ou seja, se vocês forem pegar visualmente o Supremo,
07:18ele fica mais perto daquela bancada onde se senta, né? Hoje se senta a Rosa Weber, né?
07:24Que é a presidente do Supremo, né? Então, quanto mais perto, né? Você está naquela fileirinha de cadeiras,
07:30mais sênior você é, mais antigo na corte você é, né? Então, como agora o Zaninha entrou, ele ocupa o assento
07:39que fica mais longe da Rosa Weber, né? Justamente por ser o ministro mais júnior, né? O ministro que ocupa
07:45aquela posição há menos tempo. E isso também tem um impacto na ordem que os ministros votam, né?
07:54E como que isso funciona, né? Sempre que um caso chega no Supremo, qualquer caso, né?
08:00É sorteado um relator para esse caso, né? E qual que é a função do relator, né? A função do relator,
08:05ele vai, na prática, tomar ali algumas decisões interlocutórias do caso, né? Algumas decisões, né?
08:13Que são anteriores à decisão de mérito, né? E ele vai fazer o relatório do caso, né? Por isso que ele se chama
08:20relator, né? E distribuir esse relatório para os demais ministros e ele é o primeiro a votar, né?
08:27Então, sempre no Supremo, o relator do caso, qualquer que seja esse caso, ele vai ser o primeiro a votar.
08:33E depois, onde que entra a senioridade, né? O que acontece é que depois do relator, quem vota é o ministro mais júnior, né?
08:44O ministro que entrou há menos tempo na corte, né? E isso vai seguindo sucessivamente, né?
08:50Até que, por último, quem vota é o presidente do tribunal, né? Então, você tem essa ordem, né?
08:56Essa sequência de votos, né? Às vezes, os ministros, digamos, interrompem essa sequência.
09:03Por exemplo, um pedido de vista pode interromper essa sequência, né? E até um pedido de vista pode bagunçar,
09:09às vezes, as coisas, porque, às vezes, fala, ah, sei lá, um ministro pediu vista.
09:13Daí, outro ministro fala, ah, então, eu quero antecipar meu voto, né?
09:17Então, às vezes, acontece esse tipo de coisa, mas, via de regra, né? Essa é a sequência, né?
09:22E essa sequência, ela também impacta nos votos dos ministros, né?
09:27Então, a gente tem trabalho, por exemplo, mostrando, né? Que, depois que os ministros, eles vão votando ali,
09:34um na sequência do outro, né?
09:35Depois que você tem uma maioria formada, ou seja, eu tenho seis ministros, dos onze,
09:41que votaram todos, né? Em uma determinada direção, a probabilidade do voto seguinte, ou seja,
09:49do voto posterior a essa formação da maioria, ser uma divergência, ela cai, né?
09:57Ou seja, o ministro que vota, né? Depois que a maioria foi formada, né?
10:02Ele tem uma probabilidade mais baixa de divergir.
10:05E o que que isso mostra pra gente, né? Acho que isso mostra pra gente que os ministros,
10:10eles são seres humanos como quaisquer outros, né?
10:12Que eles não gostam de discordar um dos outros, eles não gostam de ficar na minoria, né?
10:18Existe aí um valor inerente, né? A fazer parte da maioria da corte, né?
10:23Então, quando você tem essa maioria formada, né?
10:27Os ministros que ainda faltam votar, eles tendem, né?
10:30A convergir pra essa maioria que foi formada.
10:33Entendi, quer dizer, todo mundo quer evitar problema, né?
10:36Exatamente.
10:36Você já formou a maioria, você fala, ah, tudo bem, vou com a maioria, né?
10:41Exatamente.
10:42Agora, me parece que isso acaba privilegiando os mais novos, né?
10:46Porque quem acaba indo com a maioria são os mais velhos, né?
10:49Os mais experientes.
10:50Pois é, os mais novos que acabam formando a maioria, né?
10:55Eles que, como eles votam antes, né?
10:57Eles acabam formando essa maioria.
11:01Super interessante, legal falar com o professor que você explica tudo aí, né?
11:05Agora, Filipe, aquilo que todo mundo quer saber e todo mundo fala, né?
11:09Qual que é a influência política no STF?
11:12Os ministros são indicados pelo presidente, embora tenha lá, passar por uma sabatina no Senado,
11:20essa sabatina dá sempre o ok.
11:24Agora, esses ministros, cientificamente, dá pra mostrar isso?
11:28Os ministros, eles acabam votando de acordo com o presidente que indicou eles?
11:33Então, engraçado, né?
11:36A evidência disso pro Brasil é baixa, né?
11:40Você tem pouca evidência, né?
11:43De que os ministros, eles votem de acordo com o ministro que os indicou.
11:46Isso, né?
11:47É de forma diferente, por exemplo, de outras cortes ao resto do mundo, né?
11:52Então, a gente tem, por exemplo, muita literatura, né?
11:55Nos Estados Unidos, por exemplo, que mostra que os juízes da Suprema Corte, né?
12:00A identidade do presidente que indicou o juiz da Suprema Corte, ela tem impacto significante no voto, né?
12:07Então, no Brasil, né?
12:09Você teve várias pesquisas, né?
12:12Tentando, né?
12:13Achar esse mesmo efeito e, por enquanto, né?
12:16Se eu puder dar, assim, um big picture, né?
12:19Um resumo de como que tá essa literatura, é que, por enquanto, a gente não tem uma evidência muito forte.
12:26O que a gente tem de evidência, né?
12:30Isso sim, é que o Supremo, ele é uma corte, digamos, governista.
12:34Então, o Supremo, né?
12:37Ele...
12:39A posição da União tem muito peso, né?
12:41Nas decisões do Supremo, né?
12:44E como que a gente sabe disso?
12:45A gente sabe disso, né?
12:47Por pesquisas, né?
12:48Por exemplo, eu fiz uma pesquisa que o que ela faz, né?
12:52Eu peguei votos, né?
12:55Peguei casos comparáveis, né?
12:59Do STJ e do STF, né?
13:01E como que eles são comparáveis?
13:03Eu selecionei ele por matéria, né?
13:05Então, eu peguei uma amostra, né?
13:08De casos tributários do Supremo versus uma amostra de casos tributários, né?
13:13Do STJ.
13:14E eu sei, né?
13:16É intuitivo, né?
13:17É natural que o governo, ele tá sempre procurando mais arrecadação.
13:20Então, ele quer vencer esses casos tributários, né?
13:23Então, daí eu consegui comparar, né?
13:27STJ versus STF, a probabilidade do governo ganhar, né?
13:31E no STF, ela é consideravelmente maior, né?
13:36Do que do STJ.
13:38O que é engraçado, né?
13:39É que a gente...
13:40O que eu também tentei testar
13:42é se existe o que eu chamaria de voto estratégico.
13:47E o que é isso, né?
13:48É algo do tipo, ah, ok, eu sei que os ministros do STF
13:52são mais governistas na média do que os ministros do STJ, né?
13:57Mas será que ele fica...
13:59Que o ministro...
14:01Qual que era aí?
14:02O ministro X.
14:03Ele fica mais governista
14:05quando o partido que o indicou tá no executivo?
14:09Né?
14:09Isso daí seria uma ideia de você ver, né?
14:11O voto estratégico.
14:12E eu não encontro evidência disso.
14:14Então, por enquanto, né?
14:17A gente tem pouca evidência
14:19de um comportamento, digamos, ativamente político, né?
14:22Na média aí dos votos dos ministros.
14:25Agora, isso vai um pouco contra o que a gente vê no dia a dia, né?
14:30Por exemplo, o Ricardo Lewandowski, que foi ministro,
14:33sempre votava a favor do Lula, né?
14:37Ou do PT.
14:39Não é, não?
14:40Então, não necessariamente, né?
14:45Se você acabou mesmo de dar o exemplo do Zanin aí,
14:48que votou contra pautas tão queridas do Lula e do PT, né?
14:53E a gente tem o exemplo do caso do Mensalão, né?
14:56O maior algoz do PT no Mensalão foi o Joaquim Barbosa,
15:00que foi indicado pelo próprio Lula.
15:01E outros juízes, né?
15:03Como o Ayres Brito, né?
15:05O Peluso também votaram para condenar
15:07diversos figurões petistas, né?
15:09No caso do Mensalão.
15:11E todos esses foram indicados pelo Lula.
15:13Tá.
15:14Então, eu entendi que o STF, os ministros,
15:16então, não votam...
15:18A ciência não consegue mostrar, né?
15:20Que tem uma relação com o presidente,
15:23que indicou os ministros.
15:24Eles não vão votar de acordo com o presidente,
15:27matematicamente, né?
15:28Não se prova isso.
15:31Mas que é uma corte governista, né?
15:33Exato.
15:34Mais do que o STJ.
15:38Por que o STJ é menos governista que o STF?
15:41Então, a minha hipótese, né?
15:42A hipótese que a gente avança nesse trabalho
15:44sobre o que compara STJ e STF, né?
15:48É que o STJ, ele é menos governista,
15:52porque no STJ, o processo de indicação do ministro é diferente.
15:57E como que isso funciona, né?
15:59No STF, quando aparece uma vaga, né?
16:02Para um ministro, né?
16:03Abre uma vaga por uma aposentadoria, né?
16:06O presidente da república, ele pode indicar, basicamente,
16:09qualquer pessoa para o Supremo.
16:11Você tem um requisito constitucional de notório saber jurídico
16:15e reputação ilibada, né?
16:17Mas isso é extremamente vago, né?
16:19Você não tem nenhum parâmetro objetivo, né?
16:22Para delimitar as escolhas do presidente da república.
16:25No STJ, não, né?
16:28No STJ, você tem parâmetros fixos, estabelecidos para, né?
16:34Vagas para magistratura, vagas para o Ministério Público
16:37e vagas para advocacia, né?
16:40Então, é basicamente um terço Ministério Público,
16:42um terço Advocacia e um terço Magistratura.
16:46E, né, também o que é importante, né?
16:49Os nomes que vão ser indicados para o STJ,
16:52eles passam por diversos crivos antes de ir para o presidente da república.
16:57Então, por exemplo, se abre uma vaga para a advocacia,
17:01o que acontece é que a OAB, né,
17:04através de um processo de escolha interna, vai formar uma lista.
17:08Essa lista vai para o STJ,
17:11o STJ vota em cima dessa lista,
17:14e só depois dessa lista reduzida a três nomes, né,
17:18a lista tríplice, vai para o presidente da república.
17:20Então, o presidente da república só pode,
17:23só vai ter uma escolha entre três nomes possíveis
17:25para uma vaga para o STJ.
17:28E isso, a nossa hipótese é que isso
17:30reduz tremendamente a discricionariedade do presidente
17:34na hora de escolher o ministro para o STJ.
17:37E torna, portanto, essa corte mais,
17:40mais independente,
17:42não, independente acho que não é bem a palavra,
17:44mas torna essa corte um pouco menos suscetível, né,
17:48a pressão do executivo do que o Supremo.
17:52A hora que reduz a discricionariedade,
17:57quer dizer, é que o presidente não pode nomear qualquer pessoa.
18:02Exatamente.
18:02Claro que não é qualquer pessoa,
18:04mas é um mínimo muito baixo que é exigido por STF, né,
18:07reputação libada e notável saber jurídico.
18:10O resto, qualquer um entra.
18:12Aí tem a questão da idade também, né,
18:13mas o engraçado é que esse notório saber jurídico, né,
18:18é tão vago que, assim,
18:22não, não, que não existe nem formalmente
18:24uma exigência que a pessoa seja formada em direito, né,
18:27ela pode ter adquirido esse notório saber jurídico
18:30de alguma outra forma, né,
18:31a princípio não haveria nada ilegal
18:34do presidente da república indicar um médico,
18:36indicar um engenheiro para o Supremo.
18:38Felipe, agora abusando você que é professor,
18:40você sabe dizer em outros países
18:43se existem crivos também
18:46para indicar os ministros das Cortes Supremas
18:50ou dos tribunais constitucionais,
18:52isso tem algum efeito no voto deles?
18:55São Cortes governistas também?
18:58Olha, tem ampla variedade
18:59quando a gente olha no mundo, né,
19:01de formas diferentes de indicar os ministros do Supremo,
19:05quer dizer, do Supremo, né,
19:06da respectiva Suprema Corte, né,
19:09então, por exemplo, a gente segue o modelo americano, né,
19:13nós e grande parte da América Latina,
19:15a gente segue o modelo dos Estados Unidos,
19:17que é essa ideia de você dar bastante liberdade, né,
19:19para o presidente escolher os ministros da Suprema Corte.
19:24Mas se você olha em outros países,
19:26na Europa, por exemplo, né,
19:28você começa a encontrar mais variedade, né,
19:31por exemplo, na Alemanha, né,
19:33existe um mecanismo proporcional, né,
19:36na Alemanha, por exemplo, é um terço das indicações
19:39vem do Executivo,
19:40um terço da Câmara Alta, né,
19:42do que seria o Senado,
19:44e um terço do que seria da Câmara Baixa,
19:46do que seria a Câmara,
19:47a Câmara dos Deputados da Alemanha.
19:49Na Inglaterra, né,
19:51que tem uma das supremas cortes mais novas do mundo,
19:54né, que foi criada aí no governo Blair,
19:57você tem uma comissão externa, né,
20:00que escolhe, né, os juízes
20:02e faz a recomendação para o primeiro-ministro.
20:05Na África do Sul, você também tem algo parecido
20:07com uma comissão, né,
20:09enfim, se você olha o mundo, né,
20:11não existe um mecanismo único, né,
20:14para a indicação dos juízes para a Suprema Corte,
20:18e naturalmente, né,
20:19conforme varia esse mecanismo de indicação,
20:22você vai ter cortes com perfis diferentes, né,
20:24nos Estados Unidos, você tem uma corte
20:26altamente polarizada, né,
20:28tal qual é a política americana, né,
20:30hoje a política americana é altamente polarizada,
20:32e isso se reflete na Suprema Corte americana.
20:34Em outros países, não.
20:36Na Alemanha, duvido que o cidadão médio alemão
20:39consiga te dizer o nome de um juiz da Suprema Corte alemã.
20:43Exato, parece que na Alemanha
20:44eles só sabem o nome do assessor de imprensa, né,
20:47ou do porta-voz que dá as notícias, né,
20:50mas dos ministros ninguém sabe nada.
20:52É, não, se você entra no site da Suprema Corte,
20:55você vê lá o nome dos ministros, das biografias,
20:57mas isso não é uma coisa
20:58que o cidadão comum da Alemanha, né,
21:01vai ter interesse, né,
21:02porque isso não está simplesmente na pauta de notícias, né,
21:06os ministros, eles não saem por aí dando entrevistas, né,
21:09é um outro perfil de corte,
21:11é um perfil totalmente diferente.
21:13Eles não têm conta no Twitter,
21:15não têm...
21:15Ah, interessante.
21:18Felipe, agora, uma coisa que sempre me chamou a atenção
21:21é que, enfim, os ministros dão uma ideia muito,
21:27uma opinião muito própria deles, né,
21:29e os votos são muito, às vezes,
21:31são muito diferentes um do outro.
21:35E aí fico pensando,
21:35pô, como é que depois eles pegam e juntam tudo
21:39para dar uma sentença só, né?
21:42Eu assisti, por exemplo,
21:45uma sessão lá no plenário do STF
21:47que era para decidir a dosimetria do Fernando Collor.
21:52E aí cada ministro falava
21:54uma quantidade de pena diferente.
21:57Um falava, ah, quatro anos,
21:59outro falava doze.
22:00Como é que eles pegam isso depois
22:02e fazem uma coisa só?
22:04Pois é, às vezes o Supremo,
22:06ele entra em dificuldades, né,
22:10tentando achar qual que é o voto
22:13que representa o voto da corte, né?
22:15Porque a gente normalmente pensa em decisões judiciais,
22:17como decisões binárias, né?
22:20Tal pessoa ganha ou tal pessoa perde.
22:22Mas nem sempre é assim.
22:24Às vezes você tem certo grupo de ministros,
22:27sei lá, três ministros que defendem uma posição A,
22:30três ministros que defendem uma posição B
22:32e outros quatro que defendem uma posição C.
22:35Então, como você, de três posições distintas,
22:38vai achar o denominador comum,
22:41que é a decisão da corte, né?
22:42A decisão que representa a opinião da maioria da corte.
22:46Às vezes o Supremo passa bastante tempo ali debatendo,
22:50procurando achar qual é a decisão da corte, né?
22:54E é justamente isso, né?
22:55Essa procura para identificar o que seria o eleitor mediano do tribunal,
23:03em cada caso específico.
23:05Às vezes dá bastante problema, né?
23:07Você disse aí o caso da dosimetria do Collor, né?
23:13Foi um problema, mas foi um problema gigantesco também.
23:18Lá em 2000 e bolinha, né?
23:21Quando a gente teve o julgamento do mensalão,
23:24também foi o caos, né?
23:25O cálculo da dosimetria.
23:26E eu suspeito que isso tem a ver com o fato de que
23:32dos ministros do Supremo, né?
23:34Nunca nenhum atuou como juiz criminal.
23:38Então, eles, simplesmente, eles não têm essa experiência, né?
23:43De fazer na prática a dosimetria da pena.
23:47Então, isso que acaba gerando esses debates.
23:50Eles não têm essa experiência na área criminal.
23:55Me parece meio que falta uma estrutura.
23:58E é uma corte que, principalmente, hoje, é criminal, né?
24:03É só ação penal, basicamente, né?
24:05Pega a maior parte do tempo deles, não?
24:09Olha, do jeito que o tribunal foi pensado, né?
24:12Se a gente olha a Constituição de 88, né?
24:15Do jeito que o tribunal, historicamente, foi pensado,
24:17esses julgamentos criminais era para ser a minoria
24:20da demanda da corte, né?
24:23O que se imaginava lá atrás,
24:26que seria a maior parte da demanda da corte,
24:28seriam os casos constitucionais, né?
24:31Tanto que o instrumento direto que existe hoje
24:35de acesso à corte é a DI, né?
24:37Ação de Declaração de Inconstitucionalidade, né?
24:39Que é você ali questionando diretamente
24:43a constitucionalidade de uma lei.
24:45Se esperava, né?
24:46Que isso fosse representar o grosso da carga do tribunal.
24:54Só que o que acontece é que, infelizmente,
24:57com todos esses problemas políticos que a gente teve
24:59nas últimas décadas, né?
25:01O Supremo tem gasto muito tempo, né?
25:04Para julgar ações penais, né?
25:07E o Supremo, ele às vezes muda de opinião, né?
25:11Então, por exemplo, no Mensalão,
25:14o Supremo gastou, basicamente, seis meses do ano, né?
25:18Para julgar a ação penal do Mensalão, né?
25:20Foi...
25:21O Supremo não fez praticamente mais nada
25:23ao longo desses seis meses, né?
25:25Daí, depois disso, né?
25:27Você teve uma iniciativa, né?
25:30Talvez para reduzir a demanda do plenário, né?
25:33E de jogar as ações penais, né?
25:36Para as turmas, né?
25:38E agora, né?
25:39De novo, você fez o movimento inverso, né?
25:42De jogar de volta as ações penais para o pleno, né?
25:46Sim.
25:46Então, o que não era para ser, né?
25:50A principal demanda do pleno do Supremo
25:54acabou virando por circunstância política.
25:56Sim.
25:56Agora, Felipe, agora no julgamento dos réus
26:00dos envolvidos nos atos de 8 de janeiro,
26:06o Alexandre de Moraes, que é o relator,
26:08pediu para que o julgamento fosse para o plenário virtual, né?
26:13Que não fosse feito no plenário físico.
26:16Isso pode ter algum impacto?
26:20Você acha que tem algum motivo para ele estar fazendo isso?
26:22Olha, só o fato dele estar pedindo
26:26já me diz que deve ter algum impacto, né?
26:29Porque se não houvesse, se fosse indiferente, né?
26:33Se não houvesse qualquer diferença
26:35entre você julgar um caso no pleno
26:37ou no pleno virtual, né?
26:39Então, por que jogar de um para o outro, né?
26:44Então, agora, a questão qual é esse impacto
26:46daí é bem mais difícil de dizer, né?
26:49Realmente, me parece que não dá para a gente dizer,
26:55assim, a priori, né?
26:57Se o caso, por exemplo, ele vai ter menos atenção
27:00ou mais atenção, né?
27:01Por estar no plenário físico ou no plenário virtual.
27:04Eu nem sei como que eles pensaram em fazer, né?
27:08As sustentações orais no plenário virtual, por exemplo.
27:11Eu não sei como que eles vão arranjar isso.
27:12Mas, a priori, né?
27:17Tudo que está no plenário,
27:18que se joga para o plenário virtual,
27:21a princípio, deveriam ser casos mais,
27:24entre aspas, fáceis.
27:27Casos que demandariam menos debate.
27:30Então, se o Alexandre de Moraes
27:32está indicando jogar esses casos
27:35para o plenário virtual,
27:37significa que ele provavelmente acredita
27:39que esses vão ser casos relativamente simples
27:41para o Supremo decidir, né?
27:44Se fosse um caso mais complexo,
27:46daí eu imagino que isso permaneceria
27:49no plenário físico.
27:50A minha impressão aí, Felipe,
27:52é que teve um desgaste
27:54com as sustentações orais
27:57dos primeiros,
28:00dos três primeiros réus do 8 de janeiro, né?
28:02A gente teve, por exemplo,
28:04aquele desembargador Sebastião Coelho,
28:06falando aqui estão as pessoas mais odiadas do país, né?
28:09Então, os ministros receberam críticas.
28:12Então, talvez passando,
28:14provavelmente, né,
28:15para o plenário virtual,
28:16essas sustentações não vão ser tão,
28:19não vão chamar tanto a atenção
28:20da população, né?
28:23Agora, existe uma preocupação
28:25que eu vi nesse caminho,
28:27falando aí com alguns especialistas,
28:29é que não existe uma garantia
28:32de que os ministros vão ler
28:34a sustentação, né?
28:36Quer dizer, talvez a defesa
28:38acabe sendo prejudicada.
28:41Não sei se você chegou a ver essa história.
28:43Não, não cheguei a ver essa história,
28:45mas, assim,
28:47me desculpe,
28:48mas eu sou um pouco cético com isso, né?
28:50E por que eu sou um pouco cético com isso?
28:52Porque os ministros,
28:54quando eles chegam para a sessão,
28:56mesmo no plenário físico,
28:58todos eles já estão com o voto escrito.
29:00Então, assim,
29:03por mais que uma sustentação oral
29:08gere mídia, né,
29:10gere a atenção da imprensa,
29:12eu não vejo como isso vai mudar
29:14o voto de um ministro ou de outro.
29:17Também, né,
29:19eu sei que os advogados criminais,
29:22eles prezam muito, né,
29:24esse momento da sustentação oral, né,
29:26mas, assim, eu honestamente
29:28eu sou muito cético quanto ao impacto
29:30que a sustentação oral tem
29:32em algum caso no Supremo.
29:35Interessante.
29:35Quer dizer, o plenário
29:36acaba servindo muito mais ali
29:37para a vaidade dos ministros
29:40que vão ler o voto, né,
29:41o voto já está dado,
29:43então, porque já está escrito, certo?
29:44E a discussão ali,
29:47o debate é a exceção, né,
29:50a gente gosta quando acontece,
29:51mas é raro, né?
29:53É, pois é,
29:54o que eu já vi acontecer,
29:56mas isso eu imagino
29:59que seja mais a exceção,
30:00é de fatos,
30:02alguém, né,
30:03através de uma sustentação,
30:05suscitar alguma coisa nova, né,
30:08alguma coisa que não estava, né,
30:10pelo menos tão explicitamente
30:12em discussão, né,
30:13e isso daí gerar algum impacto
30:15no voto, né,
30:16mas daí como que isso vai acontecer, né,
30:18a pessoa vai sustentar,
30:20vai levantar esse ponto, né,
30:23e daí ou algum ministro
30:25vai pedir vista, né,
30:27ou o próprio relator
30:28vai indicar a suspensão do julgamento,
30:31né, se tem alguma coisa
30:32fora do normal,
30:34mas via de regra, né,
30:35quando ocorre a sustentação oral,
30:39todos os votos já estão escritos.
30:42Ótimo.
30:43Felipe, super obrigado aí
30:45pela aula de STF,
30:47foi super interessante,
30:49eu imagino que o pessoal
30:50que está assistindo
30:51talvez tenha alguma pergunta
30:53para fazer,
30:54então vou pedir,
30:55como o programa é gravado,
30:57pode colocar aí a pergunta
30:58no comentário,
30:59depois eu saio correndo
31:00atrás dele aqui
31:01e a gente publica
31:02uma notinha lá na Cruzoé,
31:05tá bom?
31:06Bom, eu sou o Duda Teixeira,
31:08esse foi mais um
31:09Cruzoé Entrevistas,
31:10a gente falou com o Felipe
31:11de Mendonça Lopes,
31:13economista,
31:14professor do INSPER,
31:15Felipe, obrigado aí
31:16pela sua participação.
31:18Eu que agradeço,
31:18foi um prazer estar aqui com vocês.
31:20É isso aí,
31:21tchau gente,
31:21até a próxima.
31:22Tchau.
31:22Tchau.
31:22Tchau.
31:22Tchau.
31:23Tchau.
31:23Tchau.
31:23Tchau.
31:24Tchau.
31:24Tchau.
31:25Tchau.
31:25Tchau.
31:26Tchau.
31:27Tchau.
31:28Tchau.
31:29Tchau.
31:30Tchau.
31:31Tchau.
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31:34Tchau.
31:35Tchau.
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