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  • 22/06/2025
Para Marcela Dantés, natural de Belo Horizonte, a internet facilitou para que os escritores ficassem na capital mineira, e não mais precisassem sair para dar vida às suas obras. A autora publicou o primeiro romance, “Nem sinais de asas”, por uma editora de menor porte, Patuá. Depois vieram “João Maria Mathilde”, pela Autêntica, e o mais recente, o elogiado “Vento vazio” (Companhia das Letras, 2024).

Em entrevista ao Estado de Minas, Marcela Dantés contou sobre a relação de Belo Horizonte com a sua obra e respondeu se considera ou não a cidade como "capital dos livros".

Esta entrevista faz parte da série especial "BH: Capital dos Livros", publicada pelo EM. Confira a reportagem completa no site: em.com.br/especiais

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Transcrição
00:00Eu sempre gostei de escrever, eu me lembro desde criança, desde alfabetizada, de ser uma coisa que me fascinou muito.
00:08Eu lembro que eu fazia as minhas redações de escola e as das minhas primas, porque elas não gostavam e eu adorava.
00:14Minha tia fala que eu falava desde cinco anos de idade que eu ia ser escritora, mas eu acho que eu não pensava nisso de fato como um ofício.
00:21Tanto que eu me formei em publicidade e propaganda na UFMG, trabalhei muito tempo com redação publicitária,
00:28que era uma forma de estar com as palavras, mas de um jeito diferente.
00:33E aí eu lembro que em 2012 eu comecei a ter uma vontade maior de investir mesmo em escrita.
00:41Sempre li muito e aí tinha ali uns blogs, umas pastas escondidas no computador.
00:47E eu comecei a sentir uma necessidade de me aprofundar nisso, de estudar, trocar e eu não conhecia ninguém que escrevia.
00:55É uma coisa interessante, eu não conhecia ninguém aqui em Belo Horizonte que escrevesse com quem eu pudesse, trocar figurinha, enfim.
01:03E aí em 2013 eu fiz uma pós na PUC Minas, que era uma pós em processos criativos em palavra e imagem.
01:12E aí era uma pós para criativos de todas as áreas, para artistas de todas as áreas.
01:17Então ela não era focada em literatura, mas tinha disciplinas de escrita.
01:21E aí eu lembro que eu me senti em casa.
01:25Começar a discutir o texto do outro, escrever, pensar a literatura de uma forma mais racional,
01:32foi um momento muito importante para mim.
01:35E ali eu me propus a fazer o trabalho de conclusão de curso, escrever uma novela.
01:40Então foi a primeira vez que eu escrevi alguma coisa para o outro ler de fato.
01:45Ficou horrível, era muito ruim a novela.
01:47Mas foi um momento importante, esse de se propor a escrever alguma coisa, de pesquisar, de estudar alguma coisa ali, do texto, da linguagem, enfim.
01:57E aí no ano seguinte eu fiz a oficina de escrita criativa do Assis Brasil, lá em Porto Alegre.
02:03Que também foi, eu acho, o grande divisor de águas para mim.
02:08Porque foi a primeira vez que eu estive em uma sala de aula em que todo mundo queria escrever.
02:14Aquilo era muito novo para mim.
02:16Eu achava que só eu queria escrever.
02:18E aí todo mundo, né, assim, escrevendo, comentando o texto um do outro, se debruçando ali sobre as escolhas.
02:25E guiados pelo Assis Brasil, assim, que é um dos caras mais generosos que eu conheço,
02:30que tem um olhar muito atento e muito sensível para o texto do outro.
02:35Então, ele me ensinou demais ali.
02:38E era um momento, eu ia todo mês para Porto Alegre, assim, era uma coisa que, né, era um grande esforço para mim.
02:45Demandou, de fato, muita energia, investimento.
02:49Mas aquilo foi transformador, assim.
02:52Eu me encontrei nesse lugar com outros escritores, com outros aspirantes a escritores.
02:57E aí eu lembro que quando estava acabando, assim, o último dia de aula,
03:01eu queria falar com o Assis, que eu não queria perder esse, né, esse encontro, essa troca.
03:07E aí ele me perguntou, não, tudo bem, mas você está escrevendo um livro?
03:10Porque se você tiver, eu te oriento e a gente segue.
03:14E aí eu disse que estava.
03:15Não estava, mas eu disse para ele que estava.
03:17Então eu saí de lá com essa missão.
03:19Falei, bom, agora eu tenho que escrever um livro,
03:21porque eu prometi para o Assis Brasil que eu vou escrever um livro.
03:23E daí nasceu o Sobre Pessoas Normais, que é uma coletânea de contos, né,
03:28que saiu em 2016.
03:30Então, assim, eu lembro que eu comecei a conhecer as pessoas,
03:34mas muitas pessoas de fora.
03:36E aí é um momento de descoberta, né, assim, descobrir os seus pares,
03:40entender quem aqui na cidade está escrevendo, quais são as editoras, as livrarias.
03:45Eu acho que isso tudo aconteceu aí nessa época, 2012, 2013.
03:49Eu entrei nesse mundo e nunca mais saí.
03:54Eu sou muito grata para atuar também, assim,
03:56porque foi a editora que apostou em mim lá no começo, né, assim,
04:00em 2016, enfim, não tinha experiência nenhuma.
04:03Eu fui na cara de pau, né, que eu acho que os autores me perguntam
04:06o que é que precisa, assim, também para escrever.
04:09Eu acho que uma boa dose de cara de pau, que é isso,
04:12de procurar a editora, mandar o seu original,
04:14se apresentar, contar um pouco do seu trabalho.
04:17Eu lembro que eu mandei o Sobre Pessoas Normais para o Eduardo Acerda,
04:22da editora Patoa, e ele gostou muito do livro e publicou, assim.
04:26Então, né, ele bancou, ele inclusive bancou uma tiragem alta do livro,
04:30porque o livro tem uma contracapa colorida.
04:33Enfim, foi muito bacana, assim, foi um momento, né, muito especial, assim,
04:38ver o seu primeiro livro publicado, o livro, o objeto livro na sua mão, assim.
04:42E daí as portas começaram a se abrir, né, eu acho que eu lancei o Sobre Pessoas Normais
04:48em maio de 2016.
04:51Em julho, o Água Lusa veio aqui para BH, para uma palestra no Cefete,
04:56e eu fui assistir e levei um livro dele para ele assinar para mim.
05:01Eu gosto muito do Água Lusa e entreguei o Sobre Pessoas Normais para ele.
05:05E aí, no dia seguinte, ele me mandou uma mensagem no Facebook,
05:07falando que tinha lido meu livro no avião e que estava encantado.
05:12Ele falou, olha, você é uma escritora, assim, esse é um primeiro livro muito bom.
05:16E me convidou para ser a escritora residente do Fólio,
05:19que estava no segundo ano do Festival Internacional de Literatura lá de Óbidos.
05:23E aí eu fui morar em Portugal, com base nesse convite,
05:26que aí veio o João Maria Matilde, né.
05:28Então, assim, as coisas, elas aconteceram, de fato, muito rápido,
05:31a partir da publicação desse primeiro livro.
05:33E acho que, assim, tem aí um arranjo, né, do acaso que foi muito bacana, assim.
05:40Mas tudo isso porque a Patuá publicou Sobre Pessoas Normais.
05:44Era um mercado muito fechado, assim, né, de editoras.
05:48Aqui, acho que em Belo Horizonte, assim, me lembro, né, da Autêntica e da Quixote,
05:53que estava começando um trabalho bem bacana, uma curadoria muito interessante.
05:57Mas não era uma coisa, assim, tão consolidada quanto está hoje,
06:02que a gente tem várias editoras e muito boas, né, e fazendo um trabalho muito variado.
06:08De fato, conseguir uma editora naquela época era muito difícil, assim.
06:12Era um trabalho mesmo de muita incerteza, enfim.
06:16Eu me lembro que fechar esse contrato, esse primeiro contrato com a Patuá,
06:202016 já, né, já é bem pra frente, assim, foi muito significativo pra mim,
06:26porque era, de fato, um mercado ainda mais fechado.
06:30Eu ainda acho que é fechado hoje, eu ainda acho que a gente tem vários desafios,
06:33mas naquela época, então, era super restrito.
06:36Nunca pensei em sair de BH, assim.
06:38Eu morei quatro, cinco meses em Portugal, nessa residência literária,
06:43que foi, de fato, um momento muito importante pra mim, né, assim,
06:46acho que é a vida do sonho de um escritor.
06:48Tá ali só pra escrever, então, minha única obrigação era entregar uma obra.
06:52E eu acordava e dormia pensando nisso e trabalhando pra isso,
06:57o que não é a minha realidade aqui em Belo Horizonte.
07:00Não era antes e depois que eu voltei também não é.
07:02Eu tenho um trabalho, tenho que passear com o cachorro,
07:05tenho que, né, levar o filho na escola, lavar a louça, enfim.
07:09Todas essas atividades.
07:10Então, eu estava ali em Portugal, nesse lugar que era muito mágico
07:14e era focado exclusivamente na literatura.
07:17Mas tirando esses meses, eu nunca pensei em sair de Belo Horizonte.
07:21Assim, Belo Horizonte, pra mim, é o meu lugar, é a minha casa.
07:24Eu nasci aqui, me formei aqui, eu me formei escritora aqui,
07:28meus laços estão todos aqui e eu não tenho esse plano, assim.
07:31Eu acho que isso, inclusive, é importante pra minha carreira,
07:34estar em casa e me sentir em casa.
07:36E é assim que eu me sinto em Belo Horizonte.
07:38Eu vejo Belo Horizonte como uma grande força literária.
07:42Eu acho que isso é um momento que a gente está revivendo, né.
07:44Eu acho que a gente teve aí, ao longo da história, sei lá, dos últimos 100 anos,
07:49grandes escritores que viveram em Belo Horizonte
07:52e... ou que saíram de Belo Horizonte, mas que vieram, né, de Belo Horizonte.
07:56E agora eu vejo que isso está recomeçando, assim.
07:59Acho que a gente tem grandes nomes da literatura brasileira contemporânea
08:03estão aqui, estão se organizando pra produzir coisas boas aqui em Belo Horizonte.
08:08Eventos importantes, né, assim, lançamentos de livro
08:11e uma escrita muito variada, né.
08:14Então, a gente tem grandes poetas, grandes escritores de prosa,
08:18de todo tipo, assim, todos os gêneros.
08:20E isso é muito legal, assim.
08:21Então, acho que a gente está vivendo um momento muito rico
08:24e muito potente da literatura aqui em Belo Horizonte.
08:27Eu acho que Belo Horizonte é uma capital literária.
08:30Todo mundo que vem aqui, eu falo, olha, vai ali nessa barra,
08:33passa na Rua das Livrares, conversa com os livreiros,
08:35a gente tem ali um patrimônio.
08:37Eu acho que isso é incrível, assim, porque a gente tem gente fazendo literatura,
08:41a gente tem gente divulgando literatura
08:44e a gente tem gente vendendo literatura.
08:46E as pessoas todas que estão em todas essas etapas são muito boas.
08:50Essa é uma combinação rara aí que faz da gente, de fato, uma capital literária, assim.
08:56Eu me lembro que conversando muito com o Alencar, ali na Quixote, né,
09:00e contando pra ele o que eu estava escrevendo,
09:03na época do lançamento do Vento Vazio, eu estava terminando o Vento Vazio,
09:06e aí, passa um pouco, ele me ligou e falou assim,
09:09ó, tem um livro aqui que você precisa ler, assim.
09:11E aí a gente vai nessas construções, então, assim, a gente sabe o que o outro está fazendo, né,
09:16a gente acompanha o trabalho aí, acho que, assim, os livreiros têm também
09:19uma troca muito valiosa entre eles e a gente, livreiros e autores, enfim.
09:24Eu acho que construiu-se uma cadeia muito preciosa aqui em Belo Horizonte.
09:29E aí
09:35E aí

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