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Transcrição
00:00:00Olá, muito bem-vindo. Eu sou Duda Teixeira e esse é o 12º podcast Latitude.
00:00:22Todo sábado, às 6 da tarde, nós estamos aqui conversando sobre os principais fatos
00:00:27do mundo e também sobre a diplomacia brasileira. Nesse episódio, o assunto não é um país
00:00:36do mundo, um fato novo, nós vamos falar com uma pessoa. Nosso convidado é o Lorival Santana.
00:00:43Lorival, que é jornalista, correspondente de guerra, já passou por vários veículos e hoje
00:00:49trabalha na CNN e também é coronista do Estadão. Lorival, seja muito bem-vindo.
00:00:55Obrigado, é um grande prazer estar aqui com vocês. Sou um admirador da casa, da revista,
00:01:01do site e acompanho a trajetória de vocês. É um prazer estar aqui.
00:01:05Legal. Bom, e para me acompanhar aqui nessa entrevista, o Rogério Ortega, o Rogério que
00:01:11trabalha no Antagonista e assina as colunas do Rui Goiaba na revista Cruzoé. Ortega,
00:01:18seja muito bem-vindo também. Não há dúvida. Ortega, que é o criador do bordão do Latitude,
00:01:23então faça as honras da casa. Vamos lá, o Latitude, um podcast para situar você no mundo.
00:01:30Bom, o Lorival trabalha como jornalista e ele também já escreveu vários livros,
00:01:35um livro sobre o Talibã, um livro sobre o jornalismo e esse livro aqui também,
00:01:42que é um livro sobre o medo. Ele usa um pouco a experiência dele nesses conflitos
00:01:50para trazer lições para quem não vai para a guerra, né?
00:01:55Quem precisa encarar o medo em situações civis também.
00:01:58Também, principalmente.
00:02:00Vamos lá, Ortega, quer começar?
00:02:02Vamos, vamos. Eu queria aproveitar o gancho do livro do Lorival
00:02:06para falar um pouco do começo da carreira dele como correspondente de guerra,
00:02:10cobrindo conflitos. O site do Lorival, que vocês podem, sugiro que vocês procurem na internet,
00:02:18porque é muito interessante, tem bastante conteúdo interessante,
00:02:21tem reportagens que ele fez em Belfast, em 94.
00:02:27Ele foi entrevistar o Yasser Arafah, líder palestino em Túnis, dois anos antes.
00:02:32Em 94, ele foi para Belfast, a capital da Irlanda do Norte,
00:02:34cobrir os conflitos de lá, que se resolveriam, quatro anos depois,
00:02:38os chamados acordos da Sexta-feira Santa.
00:02:41Então, eu queria saber de você, Lorival,
00:02:43essa foi a sua primeira cobertura internacional de conflito.
00:02:46Como foi? Como você se preparou?
00:02:48Como você driblou o eventual medo que senti?
00:02:51E o que encontrou de inesperado por lá?
00:02:54Certo. Eu estava baseado em Londres naquela época.
00:02:57Eu trabalhava na BBC e era stringer, ou seja, correspondente freelancer do Estadão.
00:03:01E esse material eu fiz para o Estadão.
00:03:03Então, morando em Londres, eu tinha muita familiaridade com o conflito.
00:03:07Era a época em que Londres não tinha lata de lixo
00:03:10por causa dos atentados terroristas.
00:03:15Só que, para mim, a questão mais difícil,
00:03:19e que foi quando...
00:03:20Bom, eu já tinha um contato com isso no conflito árabe-israelense,
00:03:25que era a questão de a religião ser uma marca que leva ao conflito.
00:03:33A religião identifica as pessoas.
00:03:35É claro que, no caso árabe-israelense, tem uma questão étnica também,
00:03:39que é a língua e tal.
00:03:41Agora, o meu desafio na Irlanda do Norte
00:03:45era entender como dois grupos cristãos,
00:03:48e ambos falando a mesma língua...
00:03:51Com as mesmas tradições, no caso da Irlanda do Norte,
00:03:54da República da Irlanda.
00:03:56É, poderiam se matar.
00:04:00E aí foi que eu aprendi isso,
00:04:04que, na verdade, a questão não era a religião.
00:04:07Eu me lembro de um padre católico na igreja.
00:04:12Eu fui falar com padres católicos e com pastores protestantes
00:04:16para questionar o conteúdo religioso do conflito.
00:04:19E aí ele me falou...
00:04:22Quando, da forma como aconteceu,
00:04:24as it happened,
00:04:26quem estava aqui era católico
00:04:29e quem invadiu era protestante.
00:04:31Então é apenas uma marca,
00:04:33não tem a ver com religião.
00:04:35E aí essa foi uma reflexão
00:04:38que passou a me acompanhar muito nas minhas coberturas,
00:04:41que na minha geração, na nossa geração,
00:04:45as guerras foram muito guerras relacionadas
00:04:48com o sectarismo religioso,
00:04:50no Líbano,
00:04:53enfim,
00:04:54no mundo árabe e muçulmano,
00:04:56na própria Europa,
00:04:58bom, na Geórgia,
00:05:00nos Balcãs,
00:05:02no Kosovo,
00:05:03em todos os lugares...
00:05:03Sempre um elemento religioso.
00:05:05Uma marca diferenciadora de identidade e tal.
00:05:08E aí eu passei a me interessar muito por religião.
00:05:13Estudei muito, muito, muito a religião
00:05:16para poder ir buscar os símbolos
00:05:19que levavam a essas diferenciações.
00:05:22E você é uma pessoa religiosa?
00:05:23Às vezes você está no perigo lá
00:05:26e faz uma rezinha?
00:05:28Não, eu não acredito em Deus,
00:05:30o que é uma desvantagem enorme,
00:05:31porque eu não acredito
00:05:33numa vida posterior,
00:05:35numa recompensa posterior, né?
00:05:38Mas quando você está lá com o Talibã
00:05:40e eles te perguntam isso,
00:05:42o que você responde?
00:05:43É, então,
00:05:45isso é muito duro.
00:05:47Eu, porque,
00:05:48eu comecei falando
00:05:51que eu não acreditava em Deus
00:05:53e isso foi muito complicado,
00:05:54porque nessas sociedades,
00:05:57e acho que até na nossa, talvez,
00:05:59as pessoas não confiam
00:06:00em quem não acredita em Deus.
00:06:02É como se a pessoa não fosse honesta, né?
00:06:04Nos Estados Unidos,
00:06:0629% dos americanos
00:06:08se declaram ateus
00:06:10e só 1% dos congressistas
00:06:15são ateus.
00:06:16Aqui também, né?
00:06:17Se um candidato a presidência
00:06:18se declarasse ateu,
00:06:19meio que seria uma sentença
00:06:20de morte política para ele,
00:06:22eu acho, muito difícil.
00:06:23É.
00:06:24Então, eu digo que eu não tenho
00:06:26uma religião,
00:06:27mas que eu fui educado
00:06:28como um cristão,
00:06:29o que é verdade.
00:06:30E eu lembro uma vez...
00:06:31Você não mente,
00:06:32mas você omite, né?
00:06:33É, não preciso jogar na cara, né?
00:06:37Mais uma vez,
00:06:38viajando com um líder religioso líbio
00:06:41durante a Primavera Árabe,
00:06:43um líder religioso
00:06:44que se tornaria uns responsáveis
00:06:46pela islamização
00:06:47daquele processo e tal,
00:06:49ele...
00:06:50Durante a viagem,
00:06:51eu aproveitei para perguntar
00:06:52muitas coisas sobre o Islã, né?
00:06:54E aí ele falou assim,
00:06:56você já sabe muito sobre o Islã,
00:06:58é melhor você se converter,
00:07:00senão you'll be in trouble.
00:07:01quando você morrer, né?
00:07:02Porque se você já sabe,
00:07:05teve contato,
00:07:06então você não tem desculpa
00:07:07para não se converter, né?
00:07:09Você vai...
00:07:10Tipo, você vai para o inferno,
00:07:11você não terá nenhuma chance.
00:07:14É, Lulival,
00:07:15um pedaço,
00:07:17um trecho do seu livro,
00:07:18você fala sobre o medo,
00:07:20e aí você diz que
00:07:21os momentos que você mais sente medo
00:07:23é quando você está no avião
00:07:25e durante a noite, né?
00:07:27Isso.
00:07:27É, por quê?
00:07:28Isso, isso é muito importante
00:07:30para entender esse livro
00:07:31e os passos que eu...
00:07:33os sete passos que eu proponho
00:07:35para lidar com o medo.
00:07:36Porque quando eu comecei
00:07:38a dar palestras
00:07:39sobre coberturas de guerras
00:07:40há 20 anos,
00:07:43as pessoas perguntavam,
00:07:44mas você não tem medo?
00:07:45Eu falava,
00:07:47tenho, né?
00:07:48Ué, então por que você volta?
00:07:50Ah, aí elas me respondiam,
00:07:51já sei,
00:07:52você gosta da adrenalina,
00:07:54e de jeito nenhum,
00:07:55não gosto de jeito nenhum
00:07:57de sentir medo, né?
00:07:58Então eu mesmo comecei
00:07:59a me investigar,
00:08:01me perguntar,
00:08:02ué, por que eu gosto
00:08:03de cobrir guerras
00:08:04se eu não gosto
00:08:05de sentir medo
00:08:06e se eu sinto muito medo, né?
00:08:08E aí a primeira coisa
00:08:09que eu comecei a observar
00:08:11foi isso,
00:08:11quer dizer,
00:08:12que eu sinto mais medo
00:08:14quando eu não estou
00:08:16cobrindo a guerra,
00:08:17quando eu estou indo
00:08:18para a cobertura,
00:08:19que eu estou lendo
00:08:20sobre a guerra
00:08:21e que aí é a minha imaginação
00:08:23que trabalha,
00:08:24né?
00:08:24E o meu conteúdo interno
00:08:26e quando,
00:08:28e durante a noite também, né?
00:08:30Por exemplo,
00:08:31no Líbano,
00:08:32eu fui sob bombardeio
00:08:35para o sul,
00:08:36lá para Mar Jeiun,
00:08:37que era a 10 quilômetros
00:08:39da fronteira de Israel,
00:08:40onde estava havendo bombardeio,
00:08:42com um líder religioso,
00:08:45que hoje até mora
00:08:46em São Paulo,
00:08:47e ele ia rezando, né?
00:08:50E um avião nos acompanhando,
00:08:53um avião israelense,
00:08:53provavelmente checando
00:08:54que carro era aquele e tal,
00:08:56nenhum carro na estrada,
00:08:57só nós, né?
00:08:59E eles foram, então,
00:09:01bombardeando, assim,
00:09:02pequenos,
00:09:03mísseis pequenos,
00:09:04assim,
00:09:04iam pontuando
00:09:05para a gente ir devagar,
00:09:07lançando mísseis
00:09:08na frente da gente
00:09:09de forma muito precisa,
00:09:11não para nos atingir,
00:09:12mas pegava fogo
00:09:13na encosta
00:09:13da montanha,
00:09:15para a gente ir devagar
00:09:15enquanto ele checava.
00:09:16essa é a minha hipótese.
00:09:19E aí,
00:09:19chegando lá,
00:09:20fiz toda a apuração
00:09:22durante o dia,
00:09:23sob bombardeio,
00:09:24e aí,
00:09:25quando a noite chegou,
00:09:27que eu fui
00:09:27à casa do Sheik,
00:09:30estava toda,
00:09:31já,
00:09:31as janelas,
00:09:32todos sem,
00:09:34não tinha mais as janelas,
00:09:35né?
00:09:36Todos caíram com as esquadrias,
00:09:37assim,
00:09:38intactas,
00:09:38pelo impacto das bombas.
00:09:40Ele estava do lado
00:09:41do bosque
00:09:42de onde o Hezbollah
00:09:43disparava os foguetes
00:09:44para Israel,
00:09:45né?
00:09:46E aí,
00:09:46durante a noite,
00:09:47eu escutava,
00:09:47então,
00:09:47o avião dando a volta,
00:09:49né?
00:09:50Decolando Israel,
00:09:51dando a volta
00:09:51e vindo nos bombardear,
00:09:53né?
00:09:54E aí,
00:09:55eu,
00:09:56e era que nem uma,
00:09:57uma máquina de costura elétrica,
00:10:00assim,
00:10:00tuf, tuf, tuf, tuf, tuf,
00:10:02muito regular,
00:10:02assim, tuf,
00:10:03e a cada tuf,
00:10:04bum,
00:10:04né?
00:10:05Era um míssil que explodia.
00:10:06E eu me senti muito pequeno,
00:10:09assim,
00:10:09me senti que nem uma formiga,
00:10:11assim,
00:10:11e pensei,
00:10:12esse piloto que está lá em cima,
00:10:13ele não sabe que eu existo,
00:10:15nem sabe quem eu sou,
00:10:17e se ele apertar o botão
00:10:18um segundo antes
00:10:19ou um segundo depois,
00:10:21disso é que depende
00:10:21se eu vou voltar
00:10:22a ver meus filhos ou não,
00:10:24né?
00:10:24E eu falei,
00:10:25e ele vai voltar
00:10:26com a sensação
00:10:27do dever cumprido
00:10:28para a base dele,
00:10:29independentemente
00:10:30do que aconteceu comigo,
00:10:31né?
00:10:32Não comigo,
00:10:33mas com os meus filhos,
00:10:34né?
00:10:35E aí,
00:10:36eu pensava,
00:10:37eu sou um irresponsável,
00:10:38eu não devia estar aqui,
00:10:39eu tenho filhos,
00:10:40né?
00:10:40Eu sou a única pessoa aqui
00:10:42que veio por opção,
00:10:43né?
00:10:45Então,
00:10:45no dia seguinte,
00:10:47voltou,
00:10:48voltei a trabalhar
00:10:49sobre o bombardeio
00:10:50e não senti mais
00:10:52esse medo todo,
00:10:53né?
00:10:54Quando as bombas caem muito perto,
00:10:55a gente se assusta,
00:10:57mas aí eu percebi
00:10:58e fui,
00:10:59e com muitas outras histórias
00:11:01que foram acontecendo
00:11:02ao longo de décadas,
00:11:04eu fui observando,
00:11:05então,
00:11:06que,
00:11:07para eu entender
00:11:09por que,
00:11:09como eu lido com o medo
00:11:11e como todos nós
00:11:12podemos lidar com o medo,
00:11:13o fio condutor
00:11:16é sair do meu mundo interno,
00:11:19assim,
00:11:20e a realidade da guerra
00:11:22é tão forte
00:11:23e a tarefa
00:11:25de cobrir a guerra
00:11:26é tão mobilizadora
00:11:27que eu me esqueço
00:11:28de mim mesmo.
00:11:29Eu ia dizer isso,
00:11:30o trabalho,
00:11:31a necessidade de trabalhar
00:11:33e de cobrir a guerra
00:11:34e de reportar
00:11:34passa com que você se esqueça
00:11:36dos meus dramas internos, né?
00:11:40Então,
00:11:40aquela coisa da imaginação,
00:11:42eu digo que a imaginação
00:11:43é um fermento do medo, né?
00:11:45Porque aí você mistura
00:11:46com as suas fantasias, né?
00:11:48E outra coisa muito forte
00:11:51que nos tira de nós
00:11:52é a empatia,
00:11:53a compaixão, né?
00:11:55Se pensar no outro,
00:11:56se preocupar com o outro, né?
00:11:58Na Síria,
00:11:59na guerra,
00:12:00eu fui o único jornalista
00:12:02que acompanhou
00:12:02uma missão da ONU
00:12:04e pude entrar numa área
00:12:05onde eu já tinha entrado
00:12:06com funcionários
00:12:07do governo sírio,
00:12:08que ninguém tinha vindo
00:12:09conversar comigo.
00:12:10Mas eu estava
00:12:11com uma câmera ligada
00:12:12e com capacetes brancos
00:12:13da ONU,
00:12:14só cinco capacetes brancos.
00:12:16E aí,
00:12:17com aquela câmera ligada,
00:12:18as pessoas vinham falar,
00:12:19me contar as histórias, né?
00:12:22E no meio,
00:12:23contando histórias horríveis
00:12:24de guerra e tal,
00:12:26e de ódio, né?
00:12:27E no meio daquilo,
00:12:29uma mulher falou assim,
00:12:30espero que você volte
00:12:33são e salvo
00:12:34para o seu país, né?
00:12:36E aí,
00:12:37eu percebi que
00:12:38na dor dela,
00:12:40no momento em que ela
00:12:41olhava para mim
00:12:42e pensava em mim,
00:12:44né?
00:12:44Ela,
00:12:45aquilo provavelmente
00:12:46aliviava a dor dela.
00:12:48E essa mesma coisa
00:12:49acontece comigo.
00:12:50Eu estou ouvindo as pessoas,
00:12:52eu também me esqueço
00:12:53da minha dor,
00:12:54do meu diálogo interno,
00:12:55do meu monólogo,
00:12:57que é sempre muito doloroso,
00:12:59né?
00:12:59Que todos nós carregamos.
00:13:01Então,
00:13:01eu descobri
00:13:02essas coisas
00:13:02que a empatia
00:13:03e o interesse
00:13:04pelo outro
00:13:04e pelo mundo
00:13:05nos faz esquecer.
00:13:08E quando eu ainda estava,
00:13:09nada disso
00:13:10era consciente
00:13:11para mim,
00:13:12nas palestras,
00:13:13eu comecei a responder
00:13:14de forma totalmente
00:13:15inconsciente
00:13:16a essa pergunta,
00:13:17assim,
00:13:18porque é uma oportunidade
00:13:20de eu me esquecer
00:13:21de mim mesmo.
00:13:21e aí eu pensava,
00:13:23eu ouvia essa resposta
00:13:24e pensava,
00:13:25pô,
00:13:25deve ser horrível
00:13:26ser eu mesmo.
00:13:27E de fato é.
00:13:28Quando você,
00:13:29quando eu estou
00:13:30muito investido
00:13:31em mim mesmo,
00:13:32dando muita importância
00:13:33para mim mesmo,
00:13:35minha vida é muito pobre
00:13:36e eu sofro,
00:13:38né?
00:13:38Então,
00:13:38é uma oportunidade
00:13:39de me esquecer
00:13:40de mim mesmo.
00:13:41Era para isso
00:13:41que eu cubro guerras,
00:13:43para me esquecer de mim.
00:13:45Você teve momentos
00:13:46em guerras
00:13:47que você parou
00:13:48o seu trabalho
00:13:48para ajudar?
00:13:49Alguém que pedia ajuda,
00:13:51alguma coisa assim?
00:13:51Não.
00:13:53Eu nem sequer
00:13:55no terremoto do Haiti.
00:13:58Talvez não tenha havido
00:14:00uma situação
00:14:01em que a minha ajuda
00:14:04fosse realmente crucial,
00:14:06só tivesse eu
00:14:07para ajudar, né?
00:14:08Sempre havia outras pessoas
00:14:09que podiam cumprir
00:14:11essa função, né?
00:14:14Mas muitas pessoas
00:14:16morreram, né?
00:14:17Do meu lado
00:14:17e que poderia ter sido eu, né?
00:14:19Mas eu sempre fiquei
00:14:22no meu papel
00:14:23de jornalista
00:14:24e com certeza
00:14:26isso me ajudou também
00:14:28a lidar com o medo.
00:14:30E aí, falando do Haiti,
00:14:32que não é uma guerra,
00:14:33mas foi uma cobertura
00:14:34muito impactante,
00:14:35corpos espalhados pelo chão
00:14:37quando a gente chegou lá.
00:14:38e eu estava...
00:14:42Aí teve o segundo terremoto,
00:14:43o abalo secundário
00:14:46e eu estava ouvindo rádio
00:14:48junto com o fotógrafo
00:14:50Joane Roriz
00:14:50e o nosso intérprete
00:14:52no carro
00:14:53e fazendo anotações
00:14:55do noticiário,
00:14:56saber onde tinha sido
00:14:57o epicentro do segundo abalo,
00:14:59coisa assim.
00:15:00E aí terminou o noticiário
00:15:01e começou a tocar uma música,
00:15:04uma música clássica.
00:15:05E aí eu desliguei o rádio
00:15:08e falei,
00:15:08eu não posso ouvir música
00:15:09porque senão eu me humanizo.
00:15:12E também foi uma outra coisa
00:15:13que eu ouvi eu falando, né?
00:15:14Eu ouvi aquela pessoa,
00:15:16ah, então eu me desumanizo, né?
00:15:18E de fato, quer dizer,
00:15:20não tem como você
00:15:21fazer uma cobertura dessas
00:15:23no seu lugar de humano, né?
00:15:26Você é apenas o repórter.
00:15:28Se você se deixa levar,
00:15:29você não faz a cobertura, né?
00:15:31É, e você também acaba
00:15:33assumindo um dos lados.
00:15:36Uma das minhas grandes obsessões
00:15:37nas minhas coberturas
00:15:38foi ouvir os chamados vilões, né?
00:15:42Então, acabei ouvindo
00:15:43a Al-Qaeda, o Talebão,
00:15:44o Hamas, o Hezbollah,
00:15:46os cadafistas,
00:15:48os a favor do Bashar al-Assad, né?
00:15:50Algo que eu nunca,
00:15:51depois de conviver muito
00:15:52com os rebeldes,
00:15:53com o heroísmo,
00:15:55com o desprendimento, né?
00:15:57O desejo de liberdade,
00:15:58eu falo, não, agora eu preciso
00:16:00ouvir os outros também, né?
00:16:04Por que que alguém gosta
00:16:04do Kadhafi?
00:16:05Por que que alguém gosta
00:16:06do Bashar al-Assad?
00:16:07E, na verdade,
00:16:08eu me arrisquei muito
00:16:09para ouvir quem gostava
00:16:10do Kadhafi, por exemplo,
00:16:11porque o Kadhafi tinha caído
00:16:12e eu fui atrás de pessoas
00:16:13que estavam escondidas
00:16:14em Trípoli e tive que pagar
00:16:16caro também,
00:16:18mas para mim era muito importante
00:16:19tentar entender
00:16:20e eu entendi essas pessoas também,
00:16:22assim como entendi
00:16:23os terroristas.
00:16:25Agora, por que o medo
00:16:26é maior durante a noite?
00:16:27Porque à noite
00:16:28eu não estava cobrindo,
00:16:30eu estava só deitado na cama, né?
00:16:32E aí eu fico em contato
00:16:34com o meu mundo interno,
00:16:36meu mundo subjetivo.
00:16:40Eu imaginava porque também
00:16:41à noite você tem menos informação,
00:16:44se você escuta uma bomba...
00:16:45Exato.
00:16:46Você não...
00:16:46É.
00:16:47Embora as bombas,
00:16:48quando elas caem,
00:16:49quer dizer,
00:16:50quando você está sob bombardeio,
00:16:52seja de dia ou de noite,
00:16:54você não sabe,
00:16:55é muito imprevisível.
00:16:56imprevisível.
00:16:57E, aliás,
00:16:57a imprevisibilidade
00:16:58é outra coisa
00:16:59com a qual eu tive que aprender
00:17:00a lidar, né?
00:17:02E descobrir que eu não tenho controle
00:17:05sobre as coisas, né?
00:17:06E que eu planejo,
00:17:08eu organizo
00:17:09para não sair apagando
00:17:14um monte de incêndios evitáveis,
00:17:16mas para ter o meu extintor
00:17:18de incêndio cheio,
00:17:19porque vai haver incêndios
00:17:22imprevisíveis, né?
00:17:24Você vê o que você fala,
00:17:26tem que planejar o planejável
00:17:28o máximo possível,
00:17:29mas o imprevisto vai acontecer, né?
00:17:31Planejar sem a fantasia
00:17:33do controle,
00:17:35porque a fantasia do controle,
00:17:37o incentivo para ter essa fantasia
00:17:39é o medo, né?
00:17:40Porque o imprevisível
00:17:41nos aflige.
00:17:43E eu digo que a nossa sociedade
00:17:44é uma sociedade adoecida
00:17:46pelo medo,
00:17:46pela ansiedade.
00:17:47E aí a nossa resposta
00:17:49é a fantasia do controle.
00:17:50Eu vou planejar,
00:17:51eu vou organizar tudo
00:17:52e aí eu terei controle
00:17:55sobre os resultados.
00:17:56É, eu vou garantir
00:17:57um resultado X, né?
00:17:59E a vida sempre nos desmente,
00:18:00nos frustra, né?
00:18:02Só que aí a gente fala,
00:18:03ah, não,
00:18:03é porque faltou
00:18:04organizar aquilo ali.
00:18:07Foi culpa minha,
00:18:08eu não planejei tal coisa.
00:18:10Aí você dobra a aposta.
00:18:12E ao dobrar a fantasia
00:18:14do controle,
00:18:14o investimento nisso
00:18:16também dobra a ansiedade.
00:18:18Então é algo
00:18:19que se retroalimenta, né?
00:18:21Eu estava em 2014
00:18:22no Iraque,
00:18:24cobrindo o avanço
00:18:25do Estado Islâmico.
00:18:27E os curdos,
00:18:28os pechimegras, né?
00:18:30Que estavam fazendo ali
00:18:31aquele primeiro...
00:18:32Contenção.
00:18:34Contenção.
00:18:34E eu estava
00:18:35dois quilômetros,
00:18:38eu estava no fronte
00:18:40a dois quilômetros
00:18:41do Estado Islâmico.
00:18:42que tinha acabado
00:18:46de decapitar um amigo meu, né?
00:18:50Nossa.
00:18:51E eu tive que assistir
00:18:52o vídeo e aquilo.
00:18:55E aí eu estava muito triste,
00:18:57muito mal, assim.
00:18:58Eu pertenço a um grupo
00:18:59de correspondentes de guerra
00:19:00e o meu jornal,
00:19:02na época o Estadão,
00:19:03publicou a foto
00:19:04dele ajoelhado, né?
00:19:07E aí eu fui criticado
00:19:09por esses colegas
00:19:13que cobrem guerra,
00:19:14mas que não estavam lá
00:19:15onde eu estava, né?
00:19:17E aí eu entrei
00:19:19em discussão com eles e tal
00:19:21e estava num momento
00:19:22bem ruim.
00:19:23Aí uma noite
00:19:23a gente estava voltando,
00:19:24eu estava com
00:19:25o Khalid Alansar,
00:19:27que é um repórter
00:19:28iraquiano muito bom,
00:19:31que a gente já se conhecia
00:19:32de outras coberturas,
00:19:33e a gente estava voltando
00:19:34com o nosso motorista,
00:19:37era curdo
00:19:38e era parente
00:19:39de um guerrilheiro curdo.
00:19:41Então ele ficava
00:19:42muito tempo no telefone
00:19:44porque o fronte
00:19:45era muito móvel.
00:19:47E a gente estava voltando,
00:19:48a gente estava baseado
00:19:49em Erdo,
00:19:49a capital do Kurdistão,
00:19:51iraquiano,
00:19:52e de repente a gente
00:19:54viu uma placa assim,
00:19:56Mossul, né?
00:19:57Que era em frente.
00:19:58Mossul era a cidade
00:20:00que os rebeldes,
00:20:01que o Estado Islâmico
00:20:02estava ocupando,
00:20:03a principal cidade
00:20:03ocupada por eles.
00:20:05A gente tinha errado
00:20:06o caminho.
00:20:07E se aquela placa
00:20:08não estivesse lá,
00:20:09a gente iria cair
00:20:10bem no Estado Islâmico.
00:20:12No meio do Estado Islâmico.
00:20:13E a placa já estava
00:20:14cheia de furos,
00:20:15de balas e tal.
00:20:16Qualquer bomba
00:20:18ou vento forte
00:20:19ou tempestade de areia
00:20:20teria derrubado
00:20:21aquela placa, né?
00:20:23E aí o motorista
00:20:24deu um cavalo de pau,
00:20:25assim,
00:20:26e correu
00:20:26na direção contrária
00:20:28e o Khalid falou,
00:20:32a gente não quer jantar
00:20:33com o Estado Islâmico.
00:20:35Aí eu falei,
00:20:35até porque nós
00:20:36seremos o jantar.
00:20:38E aí a gente riu,
00:20:39né?
00:20:39Assim,
00:20:40mas você vê,
00:20:41eu tinha o melhor motorista,
00:20:43o melhor companheiro,
00:20:44o melhor parceiro,
00:20:45colega, né?
00:20:46de trabalho,
00:20:48que estava baseado
00:20:49em Erbil,
00:20:49inclusive,
00:20:50conhecíamos a região,
00:20:51eles conheciam a região,
00:20:53mas eu fiz toda a minha parte.
00:20:55No entanto,
00:20:56foi uma placa
00:20:56que estava lá por acaso
00:20:58que nos salvou.
00:20:59E assim é a vida,
00:21:00né?
00:21:01Você aceitar,
00:21:02descansar
00:21:04nessa incerteza
00:21:06e até rir
00:21:07da sua própria fragilidade,
00:21:11da sua própria vulnerabilidade,
00:21:12isso dá muita coragem
00:21:15e muita tranquilidade, né?
00:21:17Você fala,
00:21:17não,
00:21:18eu faço só a minha parte.
00:21:19O resultado
00:21:20é consequência
00:21:22de milhões
00:21:23de interações,
00:21:24de coisas
00:21:25e de pessoas
00:21:26e de clima
00:21:28e de tudo.
00:21:30É absolutamente imprevisível.
00:21:32Não é responsabilidade minha.
00:21:33E que bom, né?
00:21:34Que bom que eu não sou Deus.
00:21:36Deve ser terrível ser Deus, né?
00:21:38É uma responsabilidade brutal, né?
00:21:40Você meio que já respondeu
00:21:42é uma pergunta
00:21:43que eu ia fazer,
00:21:43que a gente conversou antes
00:21:45sobre acontecimentos inesperados.
00:21:48Eu estava conversando
00:21:49com o Duda,
00:21:49lembrando,
00:21:51você foi para Cuba
00:21:52quando o Fidel Castro morreu,
00:21:53não é isso?
00:21:54Em 2016.
00:21:56E todo grande veículo,
00:21:57vou explicar um pouco
00:21:58para os espectadores,
00:21:59que talvez não estejam familiares,
00:22:00todo grande veículo
00:22:01precisa fazer material
00:22:02obituário
00:22:04com antecedência
00:22:05de qualquer grande personalidade,
00:22:06política,
00:22:07celebridade,
00:22:07etc.
00:22:08Que parece uma coisa mórbida,
00:22:10mas os veículos
00:22:11precisam fazer isso
00:22:12para dar a notícia
00:22:14do tamanho,
00:22:16com a dimensão
00:22:16que aquela personalidade merece
00:22:18imediatamente
00:22:18quando ela acontece.
00:22:19Então, você precisa ter
00:22:20material preparado
00:22:22com antecedência.
00:22:24No caso do Fidel Castro,
00:22:25eu trabalhava
00:22:26no Caderno Mundo
00:22:27da Folha nessa época,
00:22:28a gente tinha um caderno
00:22:29obituário sobre ele,
00:22:30enorme e tal,
00:22:32com vários textos,
00:22:34e um deles
00:22:35especulava sobre os sucessores
00:22:39do Fidel,
00:22:41ali no comando
00:22:42do Partido Comunista Cubano,
00:22:44além do Raul,
00:22:45que já era o meio que
00:22:46sucessor designado,
00:22:47outros.
00:22:48E, no fim,
00:22:48quando o Fidel
00:22:49de fato morreu,
00:22:50o Miguel Dias Canel,
00:22:51que hoje é o chefe lá em Cuba,
00:22:53não estava no radar.
00:22:54Então,
00:22:55essas duas pessoas
00:22:57que a reportagem citava
00:22:58como possíveis sucessores
00:23:00do Fidel,
00:23:01caíram em desgraça
00:23:01e a gente teve que jogar
00:23:02fora o texto
00:23:03e fazer uma coisa
00:23:04completamente nova
00:23:05para contemplar
00:23:06o Dias Canel.
00:23:07Além dessa história
00:23:09de Mursul,
00:23:10de vocês quase caindo
00:23:11no meio ali,
00:23:12no ninho do Estado Islâmico,
00:23:13você pode contar outras
00:23:15de imprevisibilidade,
00:23:17de coisas que você
00:23:17até achou que
00:23:18poderia planejar
00:23:19de antemão,
00:23:20mas tomaram um rumo
00:23:21diferente?
00:23:22E como vocês
00:23:23saíram nesses casos?
00:23:25Bem,
00:23:25eu estava na eleição
00:23:26do Donald Trump
00:23:27e eu estava na Flórida
00:23:29cobrindo aquela eleição,
00:23:31né?
00:23:31e dei o azar
00:23:34na Flórida
00:23:36não ter cruzado
00:23:39com muitos eleitores
00:23:41do Trump.
00:23:41Azar, realmente,
00:23:42porque havia muitos.
00:23:44Mas não fiquei
00:23:46muito preocupado
00:23:47com isso,
00:23:47porque achei que a matéria
00:23:48era a eleição
00:23:50da Hillary Clinton,
00:23:51como todo mundo pensou.
00:23:52A própria Hillary, né?
00:23:54Ainda,
00:23:54como tantos outros
00:23:56jornalistas
00:23:57e políticos
00:23:59e analistas
00:24:00de cenário,
00:24:01tive uma madrugada
00:24:03terrível ali,
00:24:04de descobrir
00:24:05que a minha cobertura
00:24:06estava errada,
00:24:07o meu material
00:24:08não era suficiente,
00:24:10né?
00:24:10E tive que ir a campo
00:24:12e fiz uma matéria
00:24:13muito legal,
00:24:14na verdade,
00:24:14assim,
00:24:15com as pessoas,
00:24:16com os eleitores,
00:24:18no dia seguinte,
00:24:19da própria Hillary,
00:24:20falando,
00:24:20e aí,
00:24:21o mundo acabou,
00:24:22os Estados Unidos,
00:24:22e agora?
00:24:23O que você vai fazer?
00:24:24E as pessoas
00:24:26muito tranquilas,
00:24:27em Miami e tal,
00:24:28falando,
00:24:29não,
00:24:30a gente confia
00:24:31nas nossas instituições,
00:24:33no nosso sistema e tal,
00:24:34nos checks and balances,
00:24:36freios e contrapesos.
00:24:38Mas de obituário,
00:24:39eu também tenho uma história
00:24:40engraçada,
00:24:41eu trabalhava na BBC
00:24:42nos anos 90,
00:24:44e a gente fazia um drill
00:24:46todo ano,
00:24:47um treinamento
00:24:48da morte da rainha,
00:24:49nos anos 90.
00:24:50E aí,
00:24:54tinha uma pessoa lá
00:24:57da limpeza,
00:24:59que era australiano,
00:25:01e a mãe dele
00:25:02era uma grande fã
00:25:03da rainha,
00:25:04morava na Austrália.
00:25:05E ele estava lá
00:25:06limpando
00:25:07e viu
00:25:08tudo aquilo,
00:25:09na televisão,
00:25:11no rádio,
00:25:11tudo.
00:25:12A simulação da morte.
00:25:13Falando,
00:25:14noticiando a morte,
00:25:15mas era só o circuito
00:25:16interno da BBC,
00:25:17aí ele catou um telefone
00:25:20e ligou para a mãe,
00:25:21falou,
00:25:21mãe,
00:25:21a rainha morreu.
00:25:23E ela,
00:25:24como?
00:25:25Eu falei,
00:25:25a BBC está andando.
00:25:27Aí ela desligou,
00:25:28ligou para a TV australiana
00:25:30local,
00:25:31que era no interior
00:25:31da Austrália.
00:25:33A rainha morreu.
00:25:34Eu disse,
00:25:34ué,
00:25:34mas como?
00:25:35Meu filho trabalha na BBC.
00:25:38Nossa,
00:25:38a rainha morreu,
00:25:39aí a Austrália,
00:25:40aí só quando chegou
00:25:42lá na rede nacional
00:25:44australiana
00:25:44que eles checaram.
00:25:45Então,
00:25:46obituários preparados
00:25:47podem ser bem perigosos.
00:25:50Lourival,
00:25:52a hora que você está
00:25:53num lugar de conflito,
00:25:55numa guerra,
00:25:56você conta com informações
00:25:58das pessoas
00:25:59que estão
00:25:59em São Paulo,
00:26:01por exemplo,
00:26:02fora de lá
00:26:03para tomar uma decisão?
00:26:05Sim.
00:26:07Para tomar a decisão,
00:26:09em geral,
00:26:09não.
00:26:11Inclusive,
00:26:11tem uma situação
00:26:12em que
00:26:13de Benghazi,
00:26:14quando Benghazi,
00:26:16o comboio do Gaddafi
00:26:21estava se aproximando
00:26:23de Benghazi
00:26:24para destruir Benghazi.
00:26:27E a instrução foi
00:26:28sair de Benghazi.
00:26:30E eu me recusei
00:26:33a sair.
00:26:36E o pessoal do jornal aqui
00:26:37falou,
00:26:37sai daí.
00:26:38Você conseguiu contra-argumentar?
00:26:40Tipo,
00:26:40não posso sair porque...
00:26:41Não, eu parei de responder
00:26:43os e-mails.
00:26:45E eu considero,
00:26:46eu já tinha sido
00:26:47editor-chefe
00:26:48do jornal
00:26:48naquele momento,
00:26:49eu considero
00:26:50que
00:26:51essa é uma decisão
00:26:53do repórter.
00:26:56E ele
00:26:57tem também
00:26:58que arcar
00:26:59com aquelas consequências.
00:27:00Claro.
00:27:01E aquele foi
00:27:02um momento
00:27:02de muito conflito
00:27:03para muitos repórteres.
00:27:06Também Bagdá,
00:27:07os repórteres
00:27:08que saíram
00:27:08de Bagdá
00:27:09em 2003,
00:27:10ficaram muito
00:27:12magoados,
00:27:14muito mal,
00:27:15se sentiram muito mal.
00:27:16Embora até
00:27:16um colega morreu,
00:27:18mas
00:27:19outros colegas,
00:27:22muitos colegas
00:27:23morreram
00:27:23em Benghazi também.
00:27:25Porque
00:27:25antes da chegada
00:27:27do comboio,
00:27:28as células
00:27:29adormecidas,
00:27:30cadafistas,
00:27:31despertaram
00:27:32e começaram
00:27:34a matar
00:27:34jornalistas,
00:27:35mataram
00:27:36um jornalista líbio
00:27:38que filmava
00:27:39tudo e tal.
00:27:41Estava filmando
00:27:41e a câmera dele
00:27:42mostra ele
00:27:43sendo morto.
00:27:45E civis também
00:27:47para criar
00:27:48o caos
00:27:48na cidade,
00:27:49a insegurança.
00:27:51E naquele momento
00:27:52o Conselho de Segurança
00:27:53da ONU
00:27:53estava votando
00:27:54a intervenção
00:27:56da OTAN.
00:27:57E acabou
00:27:59aprovando
00:28:01a intervenção
00:28:01da OTAN
00:28:02que bombardeou
00:28:03aquele comboio.
00:28:04E depois
00:28:05do bombardeio
00:28:06eu fui
00:28:06percorrer
00:28:07o comboio.
00:28:08Eram
00:28:0825 quilômetros,
00:28:1140
00:28:11caminhões
00:28:13transportando
00:28:14foguetes
00:28:15Grad,
00:28:15esses foguetes
00:28:16russos
00:28:17que estão
00:28:17sendo usados
00:28:17na Ucrânia.
00:28:19E aí
00:28:20eu fui
00:28:21para o hospital
00:28:22e encontrei
00:28:23um menininho
00:28:24de 5 anos
00:28:24chamado
00:28:25Mustafa
00:28:25que tinha
00:28:29levado
00:28:29um tiro
00:28:30de fuzil,
00:28:31tinha um curativo
00:28:32enorme
00:28:32no peito
00:28:33e estava
00:28:34sentindo dor
00:28:35levantando
00:28:35o bracinho.
00:28:37O pai dele
00:28:37já tinha sido
00:28:38enterrado
00:28:39e a mãe
00:28:39estava
00:28:39com o cérebro
00:28:42totalmente exposto,
00:28:43vegetando,
00:28:44só simbolicamente
00:28:45colocada
00:28:46do lado dele.
00:28:48E a história
00:28:49é que
00:28:49eles estavam
00:28:51saindo
00:28:51de casa,
00:28:52fugindo
00:28:53da cidade
00:28:54e aí
00:28:55os cadafistas
00:28:56passaram,
00:28:57viram a cena
00:28:57do casal jovem
00:28:58e a criança
00:28:59no carro,
00:29:00deram uma charré,
00:29:02abriram fogo
00:29:03e o seguiram.
00:29:05E o meu país,
00:29:06o Brasil,
00:29:06tinha se abstido
00:29:09na votação
00:29:10do Conselho
00:29:10de Segurança.
00:29:11E aí,
00:29:12à noite,
00:29:13naquela noite,
00:29:15eu pensei
00:29:17assim,
00:29:18poxa,
00:29:19eu estou aqui,
00:29:20sou o único brasileiro
00:29:21que está aqui,
00:29:23correndo risco
00:29:24de nunca mais
00:29:25ver meus filhos
00:29:26e o meu país
00:29:28se absteve,
00:29:29como se fosse
00:29:30indiferente
00:29:31ao país,
00:29:33se deve
00:29:33bombardear
00:29:34ou não
00:29:35com o boi
00:29:36que vai destruir
00:29:36uma cidade
00:29:37de um milhão
00:29:37de habitantes.
00:29:38E se a OTAN
00:29:39tiver,
00:29:39se o Conselho
00:29:40de Segurança
00:29:40tivesse discutido
00:29:42menos
00:29:42e votado
00:29:44mais rápido,
00:29:45o Mustafa
00:29:46ainda teria
00:29:47uma família,
00:29:48ele não sabe,
00:29:49mas ele não tem
00:29:50mais.
00:29:52Então,
00:29:52esses sentimentos,
00:29:53esses conteúdos
00:29:54durante a noite
00:29:54crescem muito,
00:29:56e aí eu pensei,
00:29:58por que eu estou aqui,
00:29:59meu trabalho
00:30:00não tem nenhum sentido,
00:30:01porque eu escrevo
00:30:02no Estadão,
00:30:04não sei se a Dilma
00:30:04Rousseff lê minhas matérias,
00:30:06se não lê,
00:30:07o fato é que para ela
00:30:09isso aqui é totalmente
00:30:09indiferente,
00:30:11não tem menor importância.
00:30:13E eu, portanto,
00:30:14não tenho menor,
00:30:15meu trabalho não tem importância,
00:30:16mas era durante a noite,
00:30:18no dia seguinte
00:30:19eu acordei,
00:30:19tomei banho
00:30:20e fui fazer o meu trabalho,
00:30:22porque a gente
00:30:23não pode ser motivado
00:30:24pelo resultado do trabalho,
00:30:26mas só pelo desejo
00:30:28de fazer,
00:30:29não para mudar o mundo,
00:30:31mas só para tentar
00:30:32entender o mundo.
00:30:33E aí,
00:30:34nesse caso,
00:30:35ficar em Benghazi
00:30:35foi a decisão acertada.
00:30:37Provou-se a decisão
00:30:39acertada no fim,
00:30:39né?
00:30:40Sim,
00:30:41embora a gente
00:30:42não,
00:30:42embora,
00:30:44depois de tudo isso,
00:30:46eu não tenha conseguido
00:30:47mudar a opinião
00:30:49do governo
00:30:50do meu país,
00:30:52mas eu não tenho
00:30:53esse poder.
00:30:53Está acontecendo hoje
00:30:54coisa parecida
00:30:55com o CRAN,
00:30:56inclusive,
00:30:56na grande maioria
00:30:57das votações
00:30:58na ONU,
00:30:59o Brasil está se abstendo.
00:31:01O Brasil também
00:31:02votou
00:31:03condenando a Rússia,
00:31:05mas principalmente
00:31:06agora o presidente
00:31:07Lula recusou
00:31:08um pedido da Alemanha
00:31:09de repatriar
00:31:12a munição
00:31:12dos tanques
00:31:13Leopard,
00:31:14que seriam
00:31:15exportados
00:31:16para a Ucrânia.
00:31:19E o presidente
00:31:20Lula fez a frase
00:31:21quando um não quer,
00:31:22dois não brigam.
00:31:23então quando uma menina
00:31:26não quer ser estuprada,
00:31:27ela não é estuprada.
00:31:29Quando uma criança
00:31:30sofre bullying
00:31:31na escola,
00:31:32se ela não quer
00:31:33sofrer bullying,
00:31:34ela não sofre.
00:31:35Ou seja,
00:31:36a culpa é da vítima.
00:31:37Sim,
00:31:37exatamente.
00:31:38E isso faz parte
00:31:39da nossa cultura.
00:31:40E eu acho que é
00:31:41um resquício
00:31:43da colonização
00:31:44e da escravidão,
00:31:46porque
00:31:46na nossa,
00:31:48ao longo de vários séculos,
00:31:49300 anos,
00:31:50quem dominava
00:31:53a narrativa
00:31:53era o colonizador
00:31:55e o dono
00:31:56de escravos.
00:31:57Então,
00:31:57quando um escravo
00:31:58era morto,
00:32:00era mutilado,
00:32:01quando uma mulher
00:32:01era estuprada
00:32:03ou qualquer coisa
00:32:03desse tipo,
00:32:05toda a narrativa,
00:32:06o juiz,
00:32:08o patrão,
00:32:09o governante,
00:32:11a polícia,
00:32:11todo mundo
00:32:12culpava a vítima.
00:32:15Foi ela que...
00:32:18Eu vi recentemente
00:32:18quando teve um massacre
00:32:19em Osasco,
00:32:20que a polícia
00:32:21se vingou
00:32:22da morte
00:32:22de um policial
00:32:23abrindo fogo
00:32:24contra jovens
00:32:26que estavam
00:32:26na porta de casa
00:32:27às 10 da noite.
00:32:28E eu ouvi
00:32:29de uma pessoa
00:32:30que prestava serviço
00:32:31para mim,
00:32:32um pequeno empresário,
00:32:33um médio empresário,
00:32:34o que esses jovens
00:32:36estavam fazendo
00:32:37às 10 da noite
00:32:37na rua,
00:32:38na periferia,
00:32:40quando o filho dele
00:32:41podia sair e voltar
00:32:42às 3 da manhã,
00:32:43às 2.
00:32:43O filho dele
00:32:44pode se divertir,
00:32:45o filho do pobre
00:32:46só pode trabalhar,
00:32:47estudar e dormir
00:32:48e comer,
00:32:49não pode se divertir.
00:32:51Então,
00:32:51a vítima no Brasil
00:32:52é culpada.
00:32:55E o presidente Lula
00:32:56disse à revista Time
00:32:57que os elenhos,
00:33:01que é um bom comediante,
00:33:03que gosta de televisão
00:33:05e que estava sendo feito,
00:33:07fazendo uma guerra
00:33:08para aparecer na televisão.
00:33:10E que tudo bem,
00:33:11mas a gente não pode fazer
00:33:12uma guerra
00:33:12para uma pessoa se divertir,
00:33:14que ele estava se divertindo.
00:33:16Isso chocou o mundo,
00:33:17essa entrevista.
00:33:17Mas é parte
00:33:19da cultura brasileira.
00:33:20Eu vejo muita gente
00:33:21dizendo isso,
00:33:23respondendo todos os dias
00:33:24às minhas análises,
00:33:26nas quais eu responsabilizo
00:33:27a Rússia
00:33:28por ter invadido a Ucrânia,
00:33:29que não,
00:33:30não, não.
00:33:30A responsabilidade
00:33:31é da Ucrânia
00:33:32e do Ocidente.
00:33:32A Ucrânia provocou.
00:33:34Provocou.
00:33:35Quando a OTAN
00:33:36nunca fez
00:33:37qualquer movimento
00:33:38no sentido
00:33:38de invadir a Rússia.
00:33:40E, aliás,
00:33:40nenhum país
00:33:41desde a Segunda Guerra Mundial.
00:33:42O último país
00:33:43que invadiu a Rússia
00:33:44foi a Alemanha nazista,
00:33:45com a qual a União Soviética
00:33:47e stalinista
00:33:48tinham feito um pacto
00:33:49e ambos invadiram a Polônia,
00:33:52dividiram a Polônia,
00:33:53só que depois
00:33:54o Hitler traiu o Stalin.
00:33:57Foi totalmente surpreendido.
00:33:58Ele achava
00:33:59que estava tudo muito bem
00:34:00com ele e o Hitler
00:34:02dividindo a Polônia
00:34:03entre eles.
00:34:03Lourivaldo,
00:34:06teve algum momento
00:34:07em que alguma matéria sua,
00:34:09uma cobertura sua,
00:34:10teve um impacto,
00:34:12mudou bastante a opinião
00:34:13das pessoas aqui no Brasil
00:34:15ou de governante?
00:34:17De internacional,
00:34:20não que eu saiba.
00:34:23Talvez tenha tido.
00:34:24É que acho que os presidentes
00:34:26não se interessam muito
00:34:28por internacional.
00:34:29O Brasil é um país
00:34:31continental
00:34:32que não tem poder econômico
00:34:36e nem militar
00:34:37e, portanto,
00:34:38não tem projeção geopolítica.
00:34:41Então,
00:34:41os governos brasileiros
00:34:43se alternaram
00:34:44entre ou serem
00:34:45indiferentes
00:34:47aos problemas internacionais
00:34:49ou alimentarem fantasias
00:34:51sobre o seu poder,
00:34:53que é o caso
00:34:53do nosso presidente atual.
00:34:54E a cadeira permanente
00:34:56no Conselho de Segurança,
00:34:57ajudar a fazer acordos
00:35:00como aqui no Irã.
00:35:01É,
00:35:02a ingenuidade
00:35:03torna a pessoa feliz,
00:35:05porque ela pode imaginar
00:35:07o poder que ela não tem.
00:35:09Aliás,
00:35:10a onipotência
00:35:11é uma das coisas
00:35:12que levam ao medo também.
00:35:14Você entender
00:35:15que você é pequeno,
00:35:18que o seu lugar,
00:35:18que você não é tão importante,
00:35:20tudo isso dá coragem,
00:35:22porque diminui a sensação
00:35:24de perda possível.
00:35:25Poxa,
00:35:26se eu morrer,
00:35:27é algo...
00:35:28Não,
00:35:29eu vou morrer.
00:35:30Né?
00:35:30Assim,
00:35:31questão de tempo
00:35:32e de propósito.
00:35:34Aliás,
00:35:34o propósito
00:35:35é outro passo
00:35:35que eu proponho,
00:35:37fazer as coisas
00:35:37com propósito,
00:35:38sinceridade de propósito,
00:35:40para ter coragem.
00:35:43E agora,
00:35:45o Brasil
00:35:47quer...
00:35:49Não,
00:35:49é contra as sanções,
00:35:50contra a Rússia,
00:35:51está comprando
00:35:52fertilizantes da Rússia,
00:35:54e esses dólares,
00:35:55eles são usados
00:35:56para a Rússia comprar
00:35:57drones do Irã
00:35:59e mísseis da Coreia do Norte
00:36:01para matar civis
00:36:02ucranianos,
00:36:03que é o que os russos
00:36:04estão se dedicando.
00:36:06Portanto,
00:36:06nós estamos
00:36:07financiando,
00:36:09nossos reais
00:36:11viram dólares
00:36:11que viram sangue
00:36:13ucraniano.
00:36:14e esse cinismo,
00:36:18não são os interesses,
00:36:19o comércio.
00:36:21Não,
00:36:21quando tem guerra,
00:36:23os valores humanos
00:36:24falam mais alto.
00:36:25Tanto que a Europa
00:36:26e os Estados Unidos
00:36:27estão pagando
00:36:28com inflação
00:36:29de alimentos
00:36:30e de energia.
00:36:30O Biden
00:36:31pode não se reeleger.
00:36:33A Europa tinha muito
00:36:34a perder
00:36:35cortando
00:36:35as laços comerciais
00:36:37com a Rússia.
00:36:38Estão com inflação...
00:36:39É uma decisão moral ali.
00:36:40Moral.
00:36:40Faz 40 anos
00:36:41que a Europa
00:36:42e os Estados Unidos
00:36:42não tinham inflação
00:36:43de 9%.
00:36:44E isso,
00:36:46numa democracia,
00:36:47é complicado.
00:36:51Dá para ver
00:36:52muito claramente
00:36:53aqui que
00:36:53tem o seu trabalho
00:36:54que é a cobertura
00:36:55de guerras,
00:36:56mas você precisa
00:36:57estudar religião,
00:36:59psicologia...
00:37:00Filosofia, né?
00:37:02Então,
00:37:02e você falando
00:37:03em filosofia,
00:37:04você fez os créditos
00:37:05para um mestrado
00:37:06em filosofia,
00:37:07mas não se formou.
00:37:09Você usa a filosofia
00:37:11no seu trabalho
00:37:12quando você está
00:37:12cobrindo uma guerra?
00:37:14Sim.
00:37:14E depois eu fiz
00:37:15um mestrado
00:37:16em jornalismo
00:37:17em que eu apliquei
00:37:18um conceito
00:37:19que eu aprendi
00:37:20com o Immanuel Kant,
00:37:22que é,
00:37:23e com outros filósofos também,
00:37:26a ideia
00:37:26de um fim regulador
00:37:29da razão.
00:37:30Uma ideia
00:37:30que serve
00:37:31para regular
00:37:32a razão.
00:37:34Então,
00:37:35eu apliquei
00:37:36essa ideia
00:37:36para o conceito
00:37:37de isenção
00:37:38no jornalismo,
00:37:39como algo
00:37:40que você nunca
00:37:41vai alcançar,
00:37:43mas que é
00:37:43um fim regulador
00:37:44da razão.
00:37:46Se você
00:37:46desiste
00:37:47da isenção,
00:37:49você se torna
00:37:49cínico.
00:37:50Se você
00:37:51acha que
00:37:52alcançou
00:37:53a isenção,
00:37:54você se torna
00:37:54ingênuo.
00:37:56Então,
00:37:56o repórter,
00:37:57ele vive
00:37:57numa condição,
00:37:58e, aliás,
00:37:59acho que o ser humano
00:38:00também.
00:38:01É parte
00:38:02da condição
00:38:02humana
00:38:03buscar algo
00:38:04inalcançável
00:38:05como um norte,
00:38:08um destino.
00:38:10E aí,
00:38:11você não chega
00:38:11lá nunca,
00:38:12mas você faz
00:38:13o percurso.
00:38:14Você tem
00:38:14que buscar.
00:38:15É importante
00:38:16ter o norte
00:38:17para te direcionar
00:38:18ainda que você
00:38:18não vai chegar
00:38:19lá nunca.
00:38:20E é importante
00:38:20saber que não
00:38:21vai chegar.
00:38:23Então,
00:38:24essa é uma
00:38:24das coisas
00:38:25que eu aprendi
00:38:25na filosofia,
00:38:26que eu transpus
00:38:27para o jornalismo,
00:38:28que é um grande
00:38:29debate,
00:38:30a isenção.
00:38:32Eu não acho
00:38:32que a gente
00:38:33pode ser objetivo,
00:38:34porque somos
00:38:35pessoas subjetivas.
00:38:37Eu acho
00:38:37que a gente
00:38:37pode ser
00:38:38imparcial
00:38:38porque a gente
00:38:40vive parcialmente
00:38:42as coisas.
00:38:43A nossa capacidade
00:38:45de compreensão
00:38:46é limitada.
00:38:47Eu sei disso.
00:38:49Mas,
00:38:49todos os dias,
00:38:50a gente tem
00:38:50a oportunidade
00:38:51de acrescentar
00:38:52outras coisas,
00:38:53de corrigir os erros,
00:38:55de matizar,
00:38:56de nuançar,
00:38:58de...
00:38:59Sabe aquilo
00:39:00que eu disse ontem?
00:39:01Bem,
00:39:02tem esse outro aspecto
00:39:03que eu estava errado,
00:39:04dependendo do caso.
00:39:06É,
00:39:06não ter compromisso
00:39:07com o erro também,
00:39:08né?
00:39:09Aí a gente vai evoluindo,
00:39:11embora essa evolução
00:39:12a gente nunca...
00:39:13A gente acha também
00:39:14que a gente evolui,
00:39:15né?
00:39:15Também não faz isso.
00:39:17A gente não pode
00:39:18deixar a nossa personalidade,
00:39:19as nossas crenças
00:39:21na gaveta
00:39:21como se elas fossem
00:39:22uma coisa
00:39:22completamente separada.
00:39:24Mas você pode
00:39:25mirar
00:39:26no ouvir o outro,
00:39:29no respeito
00:39:30a outras crenças,
00:39:31no interesse em ouvir
00:39:32o que pessoas
00:39:33com quem você
00:39:33não concorda
00:39:34têm a dizer,
00:39:35né?
00:39:35É,
00:39:35e o jornalista
00:39:36é tão disposto
00:39:37a uma realidade
00:39:38que é tão complexa
00:39:40que, de fato,
00:39:40as crenças...
00:39:41Eu, por exemplo,
00:39:42tenho bem poucas,
00:39:43assim,
00:39:44porque acabei
00:39:45que a dúvida
00:39:46é que é o meu
00:39:47principal...
00:39:49É...
00:39:49A minha principal...
00:39:51O meu principal
00:39:51estado mental,
00:39:52é o da dúvida,
00:39:53né?
00:39:54Assim,
00:39:54e no jornalismo
00:39:55a gente aprende
00:39:56uma coisa também,
00:39:57bem no início,
00:39:58que é, assim,
00:40:00se perguntar
00:40:00se eu tenho ou não
00:40:02a informação.
00:40:03Eu tenho a informação
00:40:04ou não, né?
00:40:05Essa é uma pergunta
00:40:06que vocês se fazem
00:40:07e eu me faço também.
00:40:09E essa é uma pergunta
00:40:10muito saudável
00:40:11hoje em dia
00:40:11para pessoas
00:40:12que recebem coisas
00:40:13no WhatsApp
00:40:14e eu mesmo recebo
00:40:17de parênteses, né?
00:40:18É, todos nós.
00:40:19Lorival,
00:40:19isso aqui é...
00:40:20É verdade?
00:40:21É verdade?
00:40:22Em cinco segundos
00:40:23eu consigo provar
00:40:25que não, né?
00:40:26Basta, já,
00:40:27felizmente,
00:40:27essas maravilhosas
00:40:29plataformas
00:40:29de checagem, né?
00:40:31Então, é...
00:40:33Mas a gente é treinado
00:40:34para se perguntar
00:40:35se eu tenho a informação
00:40:36ou não, né?
00:40:37Eu já posso publicar
00:40:38ou não, né?
00:40:39Isso é muito bacana.
00:40:40Dá para bancar ou não, né?
00:40:42Eu tenho muito orgulho
00:40:43desse treinamento
00:40:44que a gente tem.
00:40:46Legal.
00:40:46É legal.
00:40:48Lorival,
00:40:48bom, você também
00:40:49foi várias vezes
00:40:50lá para o Afeganistão
00:40:52e entrevistou os talibãs
00:40:56e tudo mais.
00:40:58Desde a primeira vez
00:41:00que você foi,
00:41:00você viu o talibã
00:41:02mudando de alguma maneira?
00:41:04É, eu fui quando o talibã
00:41:05em 2001
00:41:07teve os atentados
00:41:08de 11 de setembro.
00:41:09Eu entrevistei o talibã
00:41:10antes de começar.
00:41:11Poucos dias
00:41:12antes de começar
00:41:13o bombardeio americano, né?
00:41:15E eles estavam ali
00:41:18muito convictos, né?
00:41:21Culturalmente
00:41:21e religiosamente
00:41:22porque eles tinham
00:41:23que proteger
00:41:23o Osama Bin Laden
00:41:24porque era o hóspede deles.
00:41:27Aliás, havia um conflito
00:41:28entre eles
00:41:28durante a entrevista
00:41:30e um deles
00:41:31que tinha ficado preso
00:41:32na prisão
00:41:33da Aliança do Norte
00:41:34três anos
00:41:35achava aquela entrevista
00:41:36uma palhaçada
00:41:37porque eu estava fazendo
00:41:38questionamentos
00:41:39de democracia,
00:41:40de religião
00:41:40e que eu devia
00:41:41ser preso
00:41:42eu mesmo, né?
00:41:45E um outro líder civil
00:41:46falava, não,
00:41:46nós estamos dizendo
00:41:47para ele
00:41:47que nós não podemos
00:41:50entregar o Osama Bin Laden
00:41:51porque ele é nosso hóspede,
00:41:53então nós temos
00:41:53que tratá-lo bem
00:41:54porque ele é nosso hóspede, né?
00:41:57Aí,
00:41:57isso em 2001, né?
00:42:01Aí eu voltei
00:42:02em 2004
00:42:03os talibãs
00:42:04tinham desaparecido, né?
00:42:06Assim,
00:42:07tinham
00:42:08se infiltrado
00:42:10na população.
00:42:11Aliás,
00:42:11eles eram da população,
00:42:12eles eram afegãos, né?
00:42:14E o meu guia
00:42:16que era
00:42:16afegão, né?
00:42:18Que foi
00:42:19quem me ajudou
00:42:20na entrevista
00:42:21de 2001,
00:42:22estava comigo em 2004
00:42:23e a gente viajou
00:42:23pelo Afeganistão
00:42:24todo
00:42:26e ele falava,
00:42:26ó,
00:42:27aquele ali é o Talebã,
00:42:28aquele ali é o Talebã e tal, né?
00:42:30Aí,
00:42:30em 2009,
00:42:31eu já cobri
00:42:32o reagrupamento
00:42:33do Talebã.
00:42:34Aí,
00:42:34ele já era
00:42:35uma força militar, né?
00:42:37Fazendo uma guerra
00:42:38de um levante armado, né?
00:42:42De insurreição.
00:42:45E aí,
00:42:45agora eu voltei
00:42:46em 2021
00:42:47para cobrir
00:42:48a volta do Talebã.
00:42:50E eles
00:42:51não mudaram nada.
00:42:52A próxima geração
00:42:54do Talebã,
00:42:55mas com
00:42:56uma enorme
00:42:57repulsa
00:42:58por mulheres,
00:42:59né?
00:42:59Um desprezo,
00:43:00uma repulsa
00:43:01por mulheres
00:43:02e
00:43:03por
00:43:05pessoas
00:43:06que usam drogas
00:43:08ou que se declaram
00:43:09homossexuais,
00:43:10embora eles
00:43:11pratiquem
00:43:13o prazer
00:43:14entre eles,
00:43:15mas eles não
00:43:15entendem isso
00:43:16como homossexualidade.
00:43:19E
00:43:19também
00:43:20absolutamente
00:43:22analfabetos,
00:43:24inclusive
00:43:25na minha
00:43:25entrada
00:43:25em 2021
00:43:26estava um guia
00:43:27me esperando
00:43:28do outro lado
00:43:29da fronteira,
00:43:29entrei pelo
00:43:30Paquistão
00:43:30e o
00:43:33cara,
00:43:33o Talebã
00:43:34que nos recebeu
00:43:35perguntou
00:43:37para o meu guia
00:43:38que dia é hoje,
00:43:39né?
00:43:40Porque ele tinha que
00:43:41declarar ali
00:43:43no documento e tal.
00:43:44E aí,
00:43:45inclusive,
00:43:45o meu guia
00:43:46perguntou
00:43:46no calendário
00:43:47muçulmano,
00:43:48no calendário
00:43:48ocidental
00:43:50afegão,
00:43:54né?
00:43:54E eles vivem
00:43:57assim,
00:43:57um pouco
00:43:57fora da
00:43:58realidade.
00:44:00O que eles
00:44:01entendem do
00:44:01Islã
00:44:02não tem nada
00:44:02a ver com
00:44:03Islã,
00:44:03ou tem pouco
00:44:04a ver com
00:44:05Islã.
00:44:05Tem alguns
00:44:06sinais do que
00:44:07é o Islã,
00:44:08mas eles são
00:44:08muito ignorantes
00:44:09do Islã.
00:44:10Eles não
00:44:10leram o
00:44:11Alcorão
00:44:11porque eles
00:44:11são analfabetos,
00:44:13eles não
00:44:13leem
00:44:13coisas.
00:44:14E eles
00:44:15recitam
00:44:15versos
00:44:17que eles
00:44:17aprenderam
00:44:18em árabe,
00:44:19nas madraças
00:44:20das escolas
00:44:20religiosas,
00:44:21cujo significado
00:44:22eles não
00:44:22entendem.
00:44:24E eles
00:44:25não gostam
00:44:25também das
00:44:26pessoas que
00:44:26têm conhecimento,
00:44:27né?
00:44:28Eu lembro
00:44:28que uma vez
00:44:29se entrevistou
00:44:29um sujeito
00:44:30que estava
00:44:31comandando
00:44:33o aeroporto
00:44:33ali de Cabu
00:44:34e era um
00:44:35cara que não
00:44:35tinha nenhuma
00:44:36experiência.
00:44:36É,
00:44:37não,
00:44:37não falava
00:44:37inglês,
00:44:38não tinha
00:44:38nenhuma
00:44:39experiência
00:44:40com aviação
00:44:41e era o
00:44:41diretor-geral
00:44:42do aeroporto
00:44:43de Cabu.
00:44:43É,
00:44:44né?
00:44:45E
00:44:45porque o mérito
00:44:47está na lealdade
00:44:49ao Talebã,
00:44:50né?
00:44:51Da mesma forma
00:44:52como o comandante
00:44:53das Forças Armadas
00:44:54Russas,
00:44:54o Gerasimov,
00:44:55é bem ruim
00:44:56tecnicamente,
00:44:58mas é leal
00:44:59ao Putin,
00:44:59esse é o critério,
00:45:00né?
00:45:01Por isso,
00:45:01toda essa dificuldade
00:45:03da Rússia,
00:45:04não só por causa
00:45:04do Gerasimov,
00:45:05mas todo o comando
00:45:06militar russo
00:45:07na Ucrânia
00:45:08é muito incompetente,
00:45:10porque está lá
00:45:11por lealdade
00:45:11ao Putin,
00:45:12não por competência
00:45:13profissional.
00:45:14É um critério
00:45:14meio autodestrutivo,
00:45:16né?
00:45:16É,
00:45:16vai para o Irã,
00:45:17é a mesma realidade,
00:45:19Coreia do Norte,
00:45:19a mesma realidade,
00:45:21Venezuela,
00:45:21a mesma realidade,
00:45:22Cuba,
00:45:23a mesma realidade,
00:45:24e Afeganistão,
00:45:24assim,
00:45:25todas as ditaduras
00:45:26são assim.
00:45:27Na China também,
00:45:28agora,
00:45:28com o Xi Jinping,
00:45:29a meritocracia
00:45:30está perdendo força
00:45:32na China,
00:45:32né?
00:45:32Bom,
00:45:35Lorival,
00:45:36você,
00:45:36no livro,
00:45:37fala um pouquinho
00:45:38do seu relógio,
00:45:39não sei se é esse relógio
00:45:40que você está aí,
00:45:41que é tipo o relógio
00:45:43do DIC3,
00:45:44né?
00:45:44É,
00:45:44é um relógio militar,
00:45:47né?
00:45:47Que ele é muito importante
00:45:49para mim,
00:45:50porque ele,
00:45:51bom,
00:45:51ele é uma bússola,
00:45:53né?
00:45:53E é também,
00:45:55mede a altitude,
00:45:57mede o vento
00:45:59e a temperatura.
00:46:01E esses dados
00:46:02eu uso muito
00:46:02nas minhas coberturas
00:46:04e esse é um refúgio
00:46:05que eu tenho emocional
00:46:07para também,
00:46:08talvez,
00:46:09me ajuda
00:46:09a não sentir medo,
00:46:11porque eu fico
00:46:12medindo distâncias
00:46:15de onde estão vindo
00:46:16os tanques,
00:46:16os aviões,
00:46:17os caminhões,
00:46:19enfim,
00:46:19os soldados
00:46:20e qual a temperatura,
00:46:24a que altura
00:46:25nós estamos,
00:46:25como está o vento
00:46:26e eu coloco isso
00:46:27nas minhas matérias.
00:46:29e com isso
00:46:30eu acho que
00:46:31depois investigando
00:46:33como eu funciono,
00:46:34eu acredito que
00:46:34essa obsessão
00:46:36pelos números
00:46:36me ajuda,
00:46:37porque eu não sabia
00:46:38nada disso,
00:46:39me contaram depois,
00:46:40né?
00:46:41Que a gente,
00:46:42o cérebro tem dois lados,
00:46:43né?
00:46:44Tem um lado mais
00:46:45sensorial e emocional
00:46:47e um lado mais intelectual.
00:46:49E o lado da matemática
00:46:51é o lado intelectual.
00:46:53E quando você está com medo,
00:46:55se você começa a contar,
00:46:56a memorizar,
00:46:57a acionar o seu cérebro
00:46:59intelectual,
00:46:59o seu medo diminui.
00:47:00Eu não sabia.
00:47:01Eu sou um empírico,
00:47:02né?
00:47:02Um simples repórter, né?
00:47:04Mas psiquiatras,
00:47:06psicanalistas,
00:47:08fonaudiólogos,
00:47:10médicos,
00:47:11me ajudaram a entender
00:47:13essas coisas.
00:47:14O relógio literalmente
00:47:15te ajuda a se situar
00:47:16no mundo, né?
00:47:17É, igual ao programa de vocês.
00:47:20Você usa quem no Brasil?
00:47:22Não, não.
00:47:23Eu normalmente,
00:47:25agora eu uso
00:47:25um outro tipo de relógio,
00:47:28assim,
00:47:28que também é útil
00:47:29para essas coisas,
00:47:30mas eu trouxe
00:47:31para eu saber
00:47:32que a gente ia
00:47:32conversar sobre isso hoje.
00:47:35Mas eu uso
00:47:35um relógio eletrônico
00:47:36que tem muitos
00:47:37desses dados também,
00:47:39mas tem bem menos
00:47:40autonomia.
00:47:41Esse aqui,
00:47:41ele funciona
00:47:41pela energia solar,
00:47:43né?
00:47:43Então,
00:47:44eu não preciso
00:47:44me preocupar
00:47:45com bateria,
00:47:46com temperaturas,
00:47:48coisa ótima.
00:47:49Lourival,
00:47:50uma outra questão
00:47:51que eu estou lembrando,
00:47:53do que eu aprendi
00:47:55no jornalismo,
00:47:56aí,
00:47:56quando a gente está
00:47:56em viagem,
00:47:57isso foi ensinado,
00:47:58tá?
00:47:59Que você tem que
00:48:00fugir dos outros
00:48:01jornalistas, né?
00:48:04Uma,
00:48:05porque a gente tem medo
00:48:05de entregar,
00:48:07né?
00:48:09Aquela pista
00:48:09que você tem,
00:48:10né?
00:48:10Senão,
00:48:11de repente,
00:48:11vai ter...
00:48:12E,
00:48:13enfim,
00:48:14e outra também
00:48:14para ajudar os outros,
00:48:16é uma coisa
00:48:16meio individualista,
00:48:17mais competitiva,
00:48:18né?
00:48:20E você,
00:48:21quando está viajando,
00:48:23você,
00:48:24às vezes,
00:48:25como é que você vê
00:48:26essa relação
00:48:26com os outros jornalistas?
00:48:27Se você evita também
00:48:28ou você precisa deles,
00:48:30como é que você...
00:48:30Eu não fico
00:48:31com outros brasileiros.
00:48:33Se houver outros brasileiros,
00:48:34eu não fico com eles.
00:48:35Agora,
00:48:36outros colegas,
00:48:37é vital.
00:48:38É questão
00:48:39de sobrevivência,
00:48:40realmente.
00:48:41Mas,
00:48:41então,
00:48:41eu tenho amigos
00:48:42americanos,
00:48:45europeus,
00:48:46franceses,
00:48:47irlandeses,
00:48:49ingleses...
00:48:50Tudo a gente
00:48:50que você conheceu
00:48:51nas coberturas.
00:48:53E locais também,
00:48:54né?
00:48:56De todos esses países,
00:48:57eu tenho amigos locais.
00:48:59Todos.
00:48:59Ucrânia,
00:49:00Rússia,
00:49:01Afeganistão.
00:49:02E amigos mesmo,
00:49:03assim.
00:49:03amigos.
00:49:04Com quem você conversa
00:49:05frequentemente,
00:49:07mesmo longe.
00:49:08Um deles acabou
00:49:08de migrar para São Paulo.
00:49:10É o Igor Krilov,
00:49:12que é russo.
00:49:13E está aqui,
00:49:15vou encontrar com ele
00:49:16daqui uns dias.
00:49:16Somos, assim,
00:49:18irmãos,
00:49:18não amigos.
00:49:19Então,
00:49:20qualquer coisa
00:49:21que ele precisar
00:49:22ou eu precisar,
00:49:24precisar ficar na casa deles,
00:49:26precisar do carro deles,
00:49:27precisar de dinheiro,
00:49:29qualquer coisa,
00:49:30para sempre.
00:49:31porque em poucos dias de guerra
00:49:34você vira irmão das pessoas,
00:49:36instantaneamente.
00:49:39Instantaneamente,
00:49:39espontaneamente
00:49:40e para sempre.
00:49:42Mas já aconteceu
00:49:43de você se decepcionar
00:49:44com algum outro jornalista?
00:49:47Sem citar nomes.
00:49:50Decepcionar?
00:49:50Não.
00:49:51Não?
00:49:52Jornalistas?
00:49:53Não.
00:49:54Não me lembro.
00:49:54Tá,
00:49:55todo mundo se ajuda ali.
00:49:56É.
00:49:58Acho que sim.
00:49:59Talvez eu tenha decepcionado.
00:50:01alguém.
00:50:03Nunca ninguém me decepcionou.
00:50:05Acaba virando uma rede necessária
00:50:07de colegas de profissão
00:50:08de variadas procedências.
00:50:10Sim.
00:50:10A guerra é muito transformadora.
00:50:13Isso é algo que os brasileiros
00:50:14têm o privilégio de não saberem.
00:50:17Mas, assim,
00:50:19na guerra os valores mudam
00:50:20completamente
00:50:21ou você volta
00:50:23para os seus valores originais.
00:50:25então,
00:50:26a dignidade,
00:50:29o amor,
00:50:31a liberdade,
00:50:32essas coisas
00:50:33ficam no topo da agenda,
00:50:34acima até mesmo
00:50:35da vida.
00:50:37Ontem,
00:50:37eu estou estudando
00:50:38o taoísmo.
00:50:39Vocês perguntaram
00:50:39sobre religião.
00:50:42Depois de passar
00:50:42pelo hinduísmo,
00:50:43o budismo,
00:50:44o shintoísmo,
00:50:46eu relembrei o taoísmo
00:50:48que eu descobri
00:50:49quando eu tinha 17,
00:50:5018 anos de idade.
00:50:52Outro dia,
00:50:52eu tive um estalo.
00:50:53É o taoísmo.
00:50:54Fui ver se era mesmo.
00:50:55Estou lendo dois livros
00:50:56ao mesmo tempo,
00:50:56ouvindo e lendo.
00:50:58E, num livro
00:51:00de comentários
00:51:00do taoísmo,
00:51:02o doutor Wayne Dyer
00:51:05cita uma escritora
00:51:07que diz assim,
00:51:09a segurança
00:51:10é uma superstição.
00:51:13Ela não existe
00:51:13na natureza.
00:51:15É interessante.
00:51:16Eu falei,
00:51:16tem duas informações
00:51:18essenciais aí, né?
00:51:20De fato,
00:51:20a segurança
00:51:21não existe
00:51:23na natureza
00:51:24e o que não existe
00:51:25na natureza
00:51:26é superstição, né?
00:51:29São coisas
00:51:30que nós imaginamos, né?
00:51:34Ótimo.
00:51:34Não sei por que
00:51:34que eu falei isso,
00:51:35mas...
00:51:36Isso faz bastante sentido.
00:51:40Uma outra coisa
00:51:41que você fala
00:51:41é que a gente
00:51:43não tem a segurança,
00:51:44mas no livro
00:51:46também fala
00:51:46dessa força paralisante
00:51:48do medo.
00:51:49pensando aqui
00:51:51na aplicação
00:51:52das coisas
00:51:52que você vivencia
00:51:53lá aqui
00:51:54na nossa vida.
00:51:55Mas o medo
00:51:57é um dos motivos
00:51:58que as pessoas
00:51:59não mudam, né?
00:52:01É.
00:52:01Então, tipo,
00:52:03fica no mesmo relacionamento.
00:52:04Não muda
00:52:05uma situação ruim, né?
00:52:06Porque é o medo
00:52:07de sair
00:52:08de uma situação ruim,
00:52:09mas estável,
00:52:10para outra
00:52:11que elas não sabem
00:52:12o que vai ser.
00:52:12Ele pode dar medo
00:52:14de mudar
00:52:15e pode também
00:52:17fazer a pessoa mudar
00:52:18e não persistir, né?
00:52:21Então,
00:52:22o que eu proponho
00:52:23é você ter claro
00:52:25os seus objetivos,
00:52:26claro,
00:52:26os seus objetivos
00:52:27que não são fixos.
00:52:29O objetivo
00:52:30é uma negociação
00:52:31entre o desejo
00:52:32e a realidade.
00:52:33E os dois estão mudando
00:52:34o tempo todo.
00:52:34Você muda
00:52:35e a realidade muda.
00:52:36Então,
00:52:36nessa verificação cotidiana,
00:52:39qual é o meu objetivo?
00:52:40Isso eu descobri
00:52:43muito na Geórgia.
00:52:44A guerra da Geórgia
00:52:45me ensinou
00:52:45muitas coisas.
00:52:47O senhor Putin
00:52:48invadiu a Geórgia
00:52:49em 2008, né?
00:52:51E ali eu
00:52:52passei por várias situações,
00:52:55assim,
00:52:55por exemplo,
00:52:55quando eu
00:52:56entrei
00:53:00na área
00:53:01de conflito
00:53:02da Geórgia, né?
00:53:03Passei pelo
00:53:04checkpoint rússia
00:53:05e entrei
00:53:05na direção
00:53:06antes que invale
00:53:07na Ossetia do Sul, né?
00:53:09E aí,
00:53:09um major russo
00:53:11organizou
00:53:11uma carona
00:53:12pra mim
00:53:13com um casal,
00:53:15ele russo
00:53:16e ela
00:53:16ele georgiano
00:53:21e ela
00:53:23Ossetia, né?
00:53:24Ou seja,
00:53:24era um casal híbrido.
00:53:25Estava indo
00:53:26para Ossetia do Norte
00:53:27para se refugiar
00:53:28na Rússia.
00:53:30E aí,
00:53:31eu entrei
00:53:32nesse carro
00:53:32e tinha passado
00:53:34antes um Lada
00:53:35com quatro
00:53:36milicianos
00:53:38Ossetios, né?
00:53:39E tinham
00:53:41me visto
00:53:42e tal
00:53:42no checkpoint.
00:53:43Quando a gente
00:53:44virou
00:53:45a primeira
00:53:45curva
00:53:47que a gente
00:53:48não estava
00:53:48mais visível
00:53:49do checkpoint
00:53:50os milicianos
00:53:52estavam
00:53:52me esperando
00:53:54nos esperando.
00:53:56Aí tomaram
00:53:57o carro,
00:53:57tomaram tudo
00:53:58que o casal tinha
00:53:59que era mudança
00:53:59de casal
00:54:00pouca coisa
00:54:01mas computador
00:54:02roupas e tal
00:54:02e o casal
00:54:05ficou
00:54:05na beira
00:54:06da estrada
00:54:06e eles
00:54:07me mandaram
00:54:07entrar
00:54:07no Lada
00:54:08e eu
00:54:10entrei
00:54:11e aí
00:54:12o
00:54:13que ficou
00:54:14do
00:54:15banco
00:54:16do lado
00:54:17porque os
00:54:17dois que estavam
00:54:17atrás
00:54:18foram embora
00:54:19com o ópio
00:54:19do casal
00:54:20e aí
00:54:21o que estava
00:54:21no banco
00:54:22passageiro
00:54:23apontou
00:54:24um fuzil
00:54:24para mim
00:54:25e gritou
00:54:25coisas
00:54:26em russo
00:54:27pensando
00:54:28que eu
00:54:28entendia
00:54:29que é a língua
00:54:30franca
00:54:30da região
00:54:31mas eu
00:54:32não entendia
00:54:32aí eu fui
00:54:33abrir a porta
00:54:35do lado
00:54:36o lado
00:54:36estava andando
00:54:37
00:54:37e
00:54:38a maçaneta
00:54:40inclusive
00:54:41saiu na minha mão
00:54:41e eu pulei
00:54:42na estrada
00:54:43e eles foram
00:54:44embora
00:54:45e
00:54:46
00:54:49depois disso
00:54:50aconteceram
00:54:51muitas coisas
00:54:52a noite
00:54:52aí eu consegui
00:54:54o major
00:54:55ficou furioso
00:54:56com aquilo
00:54:58e aí
00:54:58os próximos
00:54:59O7 que vieram
00:55:00ele mandou
00:55:01deitar
00:55:01no chão
00:55:01porque eram
00:55:02os russos
00:55:02que mandavam
00:55:03nos O7
00:55:03eles eram
00:55:04aliados
00:55:04e aí
00:55:06o major
00:55:06arranjou
00:55:07uma nova
00:55:07carona
00:55:08para mim
00:55:08com militares
00:55:10russos
00:55:11mas
00:55:12quando
00:55:13isso aconteceu
00:55:14eu tive
00:55:15que decidir
00:55:16bom
00:55:16será que
00:55:17eu devo
00:55:18continuar
00:55:18com o meu
00:55:19plano de ir
00:55:19para Tskin Valley
00:55:20ou será
00:55:21que o que
00:55:22aconteceu
00:55:22aqui
00:55:22mostra
00:55:23que a situação
00:55:24está muito
00:55:25perigosa
00:55:26eu posso
00:55:27ter já
00:55:28chegado ao
00:55:29limite
00:55:29da minha
00:55:30segurança
00:55:31aí eu
00:55:32perguntei
00:55:32mas o que
00:55:33que eu
00:55:33tenho
00:55:33até agora
00:55:34o que
00:55:35que eu
00:55:35apurei
00:55:36
00:55:36nada
00:55:37
00:55:38assim
00:55:38só tenho
00:55:39uma aventura
00:55:40minha
00:55:40eu não tenho
00:55:41eu não sei o que
00:55:42está acontecendo
00:55:42na O7 do Sul
00:55:43tô na margem
00:55:45da O7 do Sul
00:55:46então
00:55:48se eu cheguei
00:55:49até aqui
00:55:49e eu
00:55:50desisto
00:55:51tudo que eu
00:55:53vivi
00:55:53porque antes
00:55:53disso também
00:55:54um soldado
00:55:55russo
00:55:55tinha mirado
00:55:56um fuzil
00:55:57em mim
00:55:57quando eu
00:55:57cheguei
00:55:58num carro
00:55:58georgiano
00:55:59e aí
00:56:01eu desci
00:56:01falei pro motorista
00:56:03e o dono
00:56:03do carro
00:56:04da Macharé
00:56:05embora
00:56:06que eu seguia
00:56:06a pé
00:56:07e o soldado
00:56:07que era
00:56:08do Daguestão
00:56:09ficou apontando
00:56:10o fuzil
00:56:10pra mim
00:56:11e eu caminhando
00:56:12na direção dele
00:56:13com passaporte
00:56:14brasileiro
00:56:14e credencial
00:56:15brasileiro
00:56:16correspondente
00:56:18eu tinha estado
00:56:18na Rússia
00:56:19mas naquele ano
00:56:20eleição
00:56:20numa das eleições
00:56:21do Putin
00:56:22Medvedev
00:56:232008
00:56:24e aí
00:56:25era a segunda vez
00:56:27que alguém
00:56:28apontava um fuzil
00:56:29pra mim
00:56:30e aí eu falei
00:56:32não, mas
00:56:33tudo que eu vivi
00:56:34até agora
00:56:35o fato de eu estar aqui
00:56:37de eu poder nunca mais
00:56:38ver meus filhos
00:56:39que é sempre o que vem
00:56:40na cabeça
00:56:40perde o significado
00:56:43se torna uma aventura
00:56:44e eu odeio
00:56:46a ideia de aventura
00:56:47a ideia narcísica
00:56:49do heroísmo
00:56:50e aí eu falei
00:56:52não, então
00:56:53eu tenho que ir
00:56:53pra Tisquim Vale
00:56:54por tudo que eu vivi
00:56:56então é isso
00:56:57o objetivo claro
00:56:58o foco no objetivo
00:56:59claro
00:57:00ele te coloca
00:57:02dentro da razão
00:57:04a razão
00:57:05que tem que decidir
00:57:07e aí naquele mesmo dia
00:57:08eu
00:57:09aí eu fui pra Tisquim Vale
00:57:11fiz minha cobertura
00:57:13e aí eu precisava voltar
00:57:14e consegui uma carona
00:57:16com os ossétios
00:57:17assim
00:57:18que queriam abastecer
00:57:20num posto
00:57:21que estava de graça
00:57:22
00:57:22que eles tinham
00:57:22arrombado o tanque
00:57:24e tal
00:57:24estavam saqueando
00:57:25as coisas dos georgianos
00:57:27e aí eu era o álibi
00:57:29pra eles passarem
00:57:30nos checkpoints
00:57:30russos
00:57:32e aí quando eu cheguei
00:57:33no meu checkpoint original
00:57:35ele não existia mais
00:57:37ele tinha sido
00:57:39trazido pra cá
00:57:40oito quilômetros
00:57:41e Gore
00:57:42que é a cidade
00:57:43que eu tinha coberto
00:57:45o bombardeio
00:57:46na véspera
00:57:47estava
00:57:48toda coberta
00:57:49de fumaça
00:57:50assim
00:57:50
00:57:51eles já tinham tomado
00:57:52e estavam saqueando
00:57:53o Gore
00:57:54inclusive aquele
00:57:55os dois carros
00:57:56que eu peguei carona
00:57:57uma BMW
00:57:57e um
00:57:59e um Mercedes
00:57:59eram
00:58:00
00:58:00butins
00:58:01
00:58:02e aí
00:58:03o
00:58:04quando eu cheguei
00:58:07o
00:58:08o chefe do checkpoint
00:58:09falou
00:58:10não
00:58:10você não vai passar
00:58:11é
00:58:12eu falei
00:58:13mas tem um carro
00:58:14esperando
00:58:14aí ele falou
00:58:15como era o carro
00:58:16eu falei
00:58:17é um jipe branco
00:58:18não
00:58:18a gente bombardeou
00:58:19aí eu falei
00:58:21não
00:58:21não é o meu jipe
00:58:22porque eu falei
00:58:23com eles pelo telefone
00:58:24e tal
00:58:24
00:58:26aí enquanto
00:58:27a gente estava
00:58:27nessa discussão
00:58:28passaram
00:58:29de novo
00:58:30veio um carro
00:58:30com dois
00:58:32milicianos
00:58:33assétios
00:58:33uma perua
00:58:35lada também
00:58:37e eles me viram
00:58:39e o passageiro
00:58:40desci
00:58:40veio correndo
00:58:41na minha direção
00:58:42apontando o fuzil
00:58:43e chegou
00:58:43e colocou
00:58:45assim o fuzil
00:58:45na minha goela
00:58:46assim a boca
00:58:47do fuzil
00:58:47na minha goela
00:58:48gritando coisas
00:58:49que eu não entendia
00:58:50e eu fiquei
00:58:52paralisado
00:58:53e aí
00:58:57o
00:58:57o cabo
00:58:58gritou
00:58:59coisas pra ele
00:59:00que incluindo
00:59:01correspondam
00:59:02brasile
00:59:02e aí o
00:59:03o cabo
00:59:04aí o cara
00:59:04tirou
00:59:05o fuzil
00:59:06e foi pro carro
00:59:07e eles foram embora
00:59:08e aí o cabo
00:59:09falou
00:59:09relax
00:59:10they thought
00:59:10you were georgian
00:59:11e aí eu entendi
00:59:12que eu tinha
00:59:13cara de georgiana
00:59:14eu não sabia
00:59:15disso
00:59:15e aí
00:59:17com relação
00:59:18ao instinto
00:59:19quer dizer
00:59:19o meu instinto
00:59:21de fugir
00:59:23na primeira vez
00:59:24me salvou
00:59:25porque
00:59:27se você pensar
00:59:28bem
00:59:29se eles
00:59:30disparassem
00:59:31o fuzil
00:59:31o carro
00:59:32ia ficar
00:59:32imprestável
00:59:33e minhas
00:59:34vísceras
00:59:34iam se espalhar
00:59:35pelo carro
00:59:36ia fazer um buraco
00:59:37no lado
00:59:37o major
00:59:39ia ouvir
00:59:40e iria atrás
00:59:41e nesse segundo
00:59:43caso
00:59:44se eu virasse
00:59:44a escorrendo
00:59:45o instinto
00:59:46de caçador
00:59:46faria ele
00:59:47disparar
00:59:47independentemente
00:59:49do que o cabo
00:59:49estava gritando
00:59:50em russo
00:59:51ele ia disparar
00:59:52porque é o instinto
00:59:53e eu não pensei
00:59:55em nada disso
00:59:56foi só o meu instinto
00:59:57então
00:59:58nas situações
00:59:59de emergência
01:00:00em que você
01:00:02está quase sendo
01:00:03atropelado
01:00:04ou assaltado
01:00:05ou sequestrado
01:00:06ou o teto
01:00:08está caindo
01:00:09um terremoto
01:00:10o seu instinto
01:00:12pode te ajudar
01:00:12muito
01:00:13porque existe
01:00:15um motivo
01:00:17real para o medo
01:00:18uma ameaça real
01:00:19mas isso é muito
01:00:20raro
01:00:21de acontecer
01:00:21no nosso dia a dia
01:00:22e até na guerra
01:00:24não é tão comum
01:00:25se fosse o tempo
01:00:25todo assim
01:00:26não tinha como
01:00:27cobrir a guerra
01:00:27você viveria
01:00:28assustado
01:00:30então
01:00:31o que eu digo
01:00:32é o seguinte
01:00:32que o instinto
01:00:34nós temos
01:00:35essa ferramenta
01:00:36fantástica
01:00:37que é o instinto
01:00:38para as ameaças reais
01:00:39todo o resto
01:00:40é imaginado
01:00:41então
01:00:43se é imaginado
01:00:44esse medo
01:00:46ele é construído
01:00:48internamente
01:00:49daí a coisa
01:00:51do avião
01:00:51quando eu estou
01:00:52indo para a guerra
01:00:53da noite
01:00:54então
01:00:55a gente tem que
01:00:56retomar o contato
01:00:57com a realidade
01:00:58com o mundo real
01:00:59então esses são
01:01:00os estímulos
01:01:02os incentivos
01:01:03que eu encontro
01:01:03o trabalho
01:01:04o mundo real
01:01:05o interesse
01:01:06pelo mundo real
01:01:07e também
01:01:08pelos seres humanos
01:01:09a empatia
01:01:10a compaixão
01:01:11e tal
01:01:11gostei da história
01:01:13que você contou
01:01:13porque também
01:01:14você perseverou
01:01:16porque você queria
01:01:17ter a notícia
01:01:17
01:01:18e
01:01:19o objetivo
01:01:21fixado
01:01:21e não virar
01:01:23a notícia
01:01:23e não essa coisa
01:01:25que você falou
01:01:26narcisídeo
01:01:26porque tem muitos
01:01:27jornalistas que é assim
01:01:27que é falar dele
01:01:29que ela vai para a guerra
01:01:30e só fala dele
01:01:31nossa
01:01:32não
01:01:32eu acho isso
01:01:33horrível
01:01:34porque
01:01:35é uma grande traição
01:01:37são muitas traições
01:01:39que você comete
01:01:39
01:01:40com os seus filhos
01:01:42se você tiver
01:01:42ou as pessoas
01:01:43que te amam
01:01:44
01:01:45seus irmãos
01:01:46seus pais
01:01:47enfim
01:01:47sua mulher
01:01:49seu marido
01:01:50seja quem for
01:01:51e com quem está lá
01:01:53na guerra
01:01:54também
01:01:54porque
01:01:55você
01:01:57foi
01:01:58porque você quis
01:02:00e você
01:02:01está
01:02:01cheio de dólares
01:02:02no bolso
01:02:03
01:02:04está com todas
01:02:05as condições
01:02:06e você pode
01:02:07procurar sair
01:02:09quando você quiser
01:02:10e você sempre
01:02:11voltará
01:02:11para casa
01:02:12lá é a casa
01:02:13deles
01:02:14então
01:02:15quando você começa
01:02:16a ouvir
01:02:17as histórias
01:02:17das pessoas
01:02:18é impossível
01:02:20você se lembrar
01:02:20de você
01:02:21é realmente
01:02:22impossível
01:02:22porque
01:02:23são histórias
01:02:26tão fortes
01:02:27tão genuínas
01:02:29são dilemas
01:02:30tão
01:02:31dos pais
01:02:32ficar
01:02:32ou ir embora
01:02:34
01:02:35se você fica
01:02:36você está sob bombardeio
01:02:37se você vai embora
01:02:39você pode ser
01:02:40bombardeado
01:02:40na estrada
01:02:41e você vai virar
01:02:42refugiado
01:02:43você vai morar
01:02:44na rua
01:02:44em alguma outra cidade
01:02:46ou em algum outro país
01:02:47sem nenhuma fonte
01:02:48de renda
01:02:49sem comida
01:02:50sem
01:02:50e não é você
01:02:52são seus filhos
01:02:53ou seus pais
01:02:54muitas vezes
01:02:55então diante
01:02:56dessa
01:02:58desse drama
01:02:59esse é o
01:03:01grande barato
01:03:03da cobertura
01:03:03você esquece de você
01:03:05ah eu tenho
01:03:06ah
01:03:06nossos dramas
01:03:07se tornam
01:03:08absolutamente
01:03:09ridículos
01:03:10é
01:03:10lorival
01:03:12super obrigado
01:03:13obrigadíssimo
01:03:14foi muito legal
01:03:15eu que agradeço
01:03:16o interesse de vocês
01:03:17foi uma aula
01:03:18que não só de jornalismo
01:03:19mas de filosofia
01:03:21religião
01:03:22
01:03:22muito bacana
01:03:24bom
01:03:25esse foi
01:03:25o lorival
01:03:26santana
01:03:27jornalista
01:03:28correspondente
01:03:29de guerra
01:03:30palestrante
01:03:31autor de vários livros
01:03:33inclusive
01:03:33esse daqui
01:03:34que eu indico
01:03:34muito sobre o medo
01:03:35lorival
01:03:36muito obrigado
01:03:37muito obrigado
01:03:38Rogério
01:03:38muito obrigado
01:03:39obrigado Duda
01:03:40esse foi
01:03:41então o décimo segundo
01:03:42podcast Latitude
01:03:43todo sábado
01:03:44às seis da noite
01:03:46todo sábado
01:03:46a gente vai conversar
01:03:47sobre fatos do mundo
01:03:49e também sobre
01:03:50a diplomacia brasileira
01:03:52repetindo o nosso
01:03:52apelo de sempre
01:03:53não esqueçam de compartilhar
01:03:55clicar no sininho
01:03:56para receber as atualizações
01:03:57espalhar a palavra
01:03:59do Latitude
01:04:00fazer o Google
01:04:01ver que o nosso programa
01:04:02é interessante
01:04:02traz convidados
01:04:03bacanas
01:04:04enfim
01:04:04curtam
01:04:06compartilhem
01:04:07assistam
01:04:08esperando que vocês gostem
01:04:09a Latitude é feita
01:04:09para vocês
01:04:10é isso aí
01:04:11tchau
01:04:11muito obrigado
01:04:12tchau
01:04:12boa noite
01:04:37tchau

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