Latitude #61: "Milei será julgado pelo êxito ou não no combate à inflação", diz Rubens Ricupero

O Antagonista

Em entrevista ao podcast Latitude, exclusivo para assinantes da revista Crusoé, o diplomata Rubens Ricupero analisou o início do governo de Javier Milei, na Argentina. Ele afirmou que Milei moderou o discurso, em relação às eleições de 2023, mas vê dificuldades para a aprovação do projeto de lei 'ómnibus', o pacotão de reformas que precisa passar pelo Congresso.  Se for assinante de Crusoé, assista à integra dessa entrevista em: https://crusoe.com.br/diario/latitude61-a-diplomacia-pt-puro-sangue/ -- Acompanhe O Antagonista no canal do WhatsApp.  Boletins diários, conteúdos exclusivos em vídeo... e muito mais.  Link do canal:   https://whatsapp.com/channel/0029Va2SurQHLHQbI5yJN344  Apoie o jornalismo independente, torne-se um assinante do combo O Antagonista | Crusoé e fique por dentro dos principais acontecimentos da política e economia nacional:   https://hubs.li/Q02b4j8C0  Não fique desatualizado, receba as principais notícias do dia em primeira mão se inscreva na nossa newsletter diária:  https://bit.ly/newsletter-oa  Ouça O Antagonista | Crusoé quando quiser nos principais aplicativos de podcast.  Leia mais em www.oantagonista.com.br  |  www.crusoe.com.br

Transcript

00:00Agora, embaixador, mudando um pouco de assunto,

00:03porque eu estou super curioso,

00:04eu queria saber a opinião do senhor

00:05sobre o presidente da Argentina, o Javier Meley.

00:09O que você acha dele?

00:12Ele, nessas primeiras semanas, tem surpreendido.

00:17De certa maneira, ele foi mais moderado que na campanha,

00:23não em tudo, mas, como você há de lembrar,

00:25na campanha, ele gostava de ostentar a Serra Elétrica,

00:35de que ia destruir tudo e que ia dolarizar a economia,

00:41acabar com o Banco Central.

00:43No final, quando ele tomou posse,

00:47ele adotou uma linha, de certa forma, mais moderada.

00:52O ministro da Economia é o mesmo que era do governo Macri,

00:58o Caputo, que é um homem muito conhecido,

01:02economista respeitado.

01:05Ele tem tomado medidas, como ele diz, libertárias.

01:10Esses decretos que contêm muita coisa,

01:15muita coisa provavelmente correta

01:18e outras coisas talvez excessivas.

01:21É verdade que o sistema legislativo argentino

01:24obriga o Congresso a aceitar ou rejeitar em bloco.

01:30Não pode escolher.

01:31Então, não sei como eles vão fazer

01:34para separar o joio do trigo.

01:37Agora, o destino dele vai ser jogado

01:45na questão do êxito ou não do combate à inflação,

01:52porque a inflação acabou sendo acelerada

01:55por certas medidas que ele tomou,

01:58sobretudo duas,

01:58a desvalorização, a maxidesvalorização

02:02e, em seguida,

02:04o abandono de todo o controle de preços.

02:09Então, a inflação subiu a mais de 200%

02:12e ele agora não pode esperar indefinidamente.

02:19Eu creio que a grande incógnita é saber

02:24quanto tempo vai demorar

02:26para que a economia argentina

02:28comece a dar sinais de recuperação

02:31em matéria de queda drástica

02:34da taxa inflacionária,

02:37porque, do contrário, como você sabe,

02:39essas medidas que ele adotou

02:41afetam muita gente.

02:43Há muita gente que vai perder,

02:46aposentados, assalariados,

02:49governos das províncias.

02:53E acredito que muitas dessas pessoas

02:55aceitam uma certa dose,

02:58uma certa cota de sacrifício,

03:01mas não se isso durar de uma maneira indefinida.

03:05Eu creio que ainda é cedo para dizer,

03:08para fazer um prognóstico.

03:10Agora, ele tem uma retórica

03:14que é, de fato, muito incendiária.

03:19Agora, mesmo em Davos,

03:21quando ele esteve lá,

03:23ele foi o mais libertário,

03:26mais do que todos os que estavam lá,

03:29mesmo, por exemplo,

03:31ele condena até o estado de bem-estar social.

03:35Você sabe que isso são pessoas de extrema-direita

03:38que costumam criticar as leis em favor

03:42dos mais desfavorecidos,

03:45dizendo que elas, no fundo,

03:48ajudam os preguiçosos,

03:50os que não querem trabalhar.

03:52Ele acaba adotando posições

03:55que são aquelas de 150 anos atrás.

03:59Agora, em relação ao Brasil,

04:02e mesmo em relação à política internacional,

04:04o que é que se pode dizer?

04:07Em primeiro lugar,

04:09o Lula, para essa política que o Lula executa,

04:14ele perdeu um interlocutor importante,

04:17porque a Argentina, evidentemente,

04:19não vai se alinhar mais

04:21nessa orientação.

04:24Isso ficou patente

04:27quando ele recusou entrar

04:30no grupo dos BRICS.

04:31Ele não quis entrar no grupo dos BRICS.

04:35Além disso,

04:36pelas declarações

04:37feitas pela ministra

04:40das Relações Exteriores,

04:43já ficou claro

04:44que a linha que a Argentina vai seguir

04:46é a mesma que foi seguida

04:48pelo governo Menem.

04:50É de um alinhamento

04:51muito próximo

04:52aos Estados Unidos.

04:54e ao Ocidente.

04:56Portanto,

04:57Jair se diferencia também

04:59da linha do Lula.

05:01Mas, ao mesmo tempo,

05:03ele sabe

05:04que ele depende

05:05de países como a China

05:07e depende também do Brasil.

05:09E ele tem feito gestos

05:11de apaziguamento

05:13em relação ao Brasil.

05:15Vocês se lembram

05:15que ele mandou

05:16a ministra,

05:18a chanceler,

05:20antes até de tomar posse,

05:22ele mandou a Brasília

05:23com um convite

05:24ao presidente Lula.

05:26O presidente não foi,

05:28mas foi convidado.

05:30Formalmente,

05:31o gesto foi feito.

05:33E, em relação à China,

05:35que ele tinha criticado muito

05:36durante a campanha,

05:38ele acabou

05:39tendo uma atitude

05:41de, na verdade,

05:43pedir aos chineses

05:44que prorrogassem

05:47aquele acordo financeiro

05:48stand-by.

05:49Porque ele depende

05:50muito da China

05:51financeiramente,

05:52até mais que o Brasil.

05:54Embora o Brasil

05:55tenha uma dependência

05:56comercial gigantesca

05:58da China,

05:59cada vez maior.

06:0070% da soja

06:02que o Brasil exporta

06:04e uma porcentagem

06:06muito alta também

06:07do petróleo bruto

06:09e do minério de ferro

06:11vão para a China.

06:12Então,

06:13nós estamos

06:13muito dependentes

06:15da China.

06:15Agora,

06:16por outro lado,

06:17é o que nos ajuda

06:18no balanço de pagamentos.

06:21Então,

06:21eu acho que o Milley

06:22vai adotar nessa matéria

06:24uma atitude

06:25mais pragmática.

06:27Não tanto

06:28de acordo

06:29com o que seria

06:31a preferência dele,

06:33mas a situação

06:34em que ele se encontra.

06:38Uma organização...

06:40Desculpa,

06:40eu tinha...

06:41Teve um delay aqui.

06:43Uma organização

06:45internacional

06:46da qual o Milley

06:47tem muito interesse

06:48em entrar

06:48e a chanceler dele,

06:50a Diana Mondino,

06:51falou que a Argentina

06:52vai ingressar

06:53é na OCDE.

06:55E nós sabemos

06:55que o Brasil

06:56já teve convite

06:57para a OCDE,

06:59mas aí veio

06:59o governo Lula,

07:00Lula não se interessa

07:01muito pela OCDE,

07:03debocha dela.

07:04Então,

07:05na sua opinião,

07:07a gente ainda tem chance

07:08de...

07:09O Brasil ainda tem chance

07:10de entrar na OCDE?

07:11Olha,

07:13eu não sou

07:14daqueles que acham

07:16que o ingresso

07:18na OCDE

07:19tenha um efeito

07:21qualquer

07:22tão miraculoso

07:23como se diz,

07:24sabe?

07:25Porque a OCDE

07:26é uma instituição

07:28de países

07:29de capitalismo avançado.

07:31E os países

07:33que fazem parte

07:34da OCDE

07:35normalmente

07:36têm a mesma visão

07:39em relação

07:40à regulamentação

07:42da economia.

07:43Isso não quer dizer

07:44que eles

07:45não mantenham

07:47uma certa

07:48liberdade de ação.

07:51Sobretudo,

07:51hoje em dia,

07:53em que

07:53mesmo os Estados Unidos

07:55voltaram

07:57a adotar

07:57políticas industriais.

08:00Você sabe

08:00que, em geral,

08:01a OCDE

08:01condena

08:02as políticas

08:03industriais

08:04da mesma forma

08:06que o Fundo Monetário,

08:08o Banco Mundial,

08:09a ortodoxia econômica

08:11não olha

08:12com simpatia

08:14as políticas

08:15industriais

08:16ou as políticas

08:17de liberalização

08:19comercial

08:20de tipo

08:21puramente gradual.

08:23Eles são favoráveis

08:25a uma abertura

08:26muito mais

08:27intensa.

08:27eu creio

08:30que o Brasil

08:31ainda

08:31não tem

08:32estruturas

08:33de

08:34funcionamento

08:37da economia

08:37suficientes

08:38para poder

08:40aceitar

08:41todas

08:42essas regras

08:43da OCDE.

08:44E a Argentina

08:46menos ainda.

08:48O processo

08:49de adesão

08:49à OCDE

08:50normalmente

08:51demora

08:51muitos anos.

08:53O Brasil

08:53estava mais

08:54adiantado.

08:55agora

08:56acho que

08:57houve

08:57entrou um pouco

08:59em compasso

08:59de espera.

09:01Que eu saiba

09:02não é propriamente

09:03que o Brasil

09:03tenha se

09:04desinteressado.

09:06Mas

09:07no momento

09:08atual

09:08mesmo sem

09:09ser membro

09:10pleno

09:10da OCDE

09:11o Brasil

09:12participa

09:13de boa parte

09:14dos comitês.

09:15A OCDE

09:16tem mais de

09:1740 comitês

09:18comitês

09:18do aço

09:19comitês

09:20comitês

09:21daquilo.

09:21O Brasil

09:22acho que faz

09:22parte

09:23de mais

09:23de 30.

09:24então

09:25ele já

09:26tem

09:26uma certa

09:27participação

09:28e não é

09:29uma participação

09:30completa.

09:32Na época

09:33do governo

09:34Bolsonaro

09:35em que o Brasil

09:36tinha o desejo

09:37de aderir

09:38mais rapidamente

09:40curiosamente

09:42um dos países

09:43que não nos

09:43apoiaram

09:44foi os Estados Unidos.

09:47E

09:47me contou

09:49na época

09:50o nosso

09:51embaixador

09:51lá

09:52o saudoso

09:53embaixador

09:54Sérgio Amaral

09:55hoje já

09:55falecido

09:56que ele

09:57havia

09:58perguntado

09:58aos americanos

09:59por que

10:00que eles

10:01lutavam

10:01em nos

10:02apoiar

10:02e eles

10:03disseram

10:03a ele

10:04não porque

10:04nós não

10:05vemos

10:05dentro

10:05do Brasil

10:06um consenso

10:07um consenso

10:08suficientemente

10:09forte

10:10para justificar

10:11o ingresso

10:12na OCDE.

10:13Eu acho

10:14que essa

10:14opinião

10:14é correta

10:15era naquela

10:16época

10:16e é

10:17correta

10:17hoje.

10:18No Brasil

10:19há um setor

10:20que é muito

10:21favorável

10:21ao ingresso

10:22na OCDE.

10:23Em geral

10:24é o setor

10:24financeiro,

10:26o setor

10:26do Banco Central,

10:28as pessoas

10:29que abraçam

10:30práticas

10:33de mercado

10:35mais liberais,

10:38mas há outras

10:39tendências

10:40no Brasil

10:41que não são

10:42necessariamente

10:43ideológicas,

10:46mas que desejam

10:47manter

10:48um mínimo

10:49de liberdade

10:50de políticas.

10:53Por exemplo,

10:54para essas

10:55políticas

10:55verdes,

10:57adotar

10:57estímulos,

10:59adoção

10:59de fontes

11:01de energia

11:02limpas

11:04e renováveis.

11:06Então,

11:06eu acho

11:07que nessa

11:07matéria

11:08é preciso

11:10ter uma

11:10mentalidade

11:11aberta

11:12e negociar

11:13com a OCDE

11:14sem aceitar

11:16a imposição

11:17de regras

11:17que talvez

11:19não sejam

11:20ainda adequadas

11:21para o figurino

11:22brasileiro.

11:23Contra a Argentina,

11:25mesmo que eles

11:26queiram,

11:27que o Xavier

11:27me lê e queiram,

11:29vai demorar

11:30muito,

11:30porque para

11:31poder entrar

11:32na OCDE

11:33é preciso

11:34se adiantar

11:35muito

11:35nisso

11:36que ele

11:36quer fazer,

11:38que é

11:38a refundação

11:40da economia

11:41argentina.

11:42Ele está

11:42ainda no começo,

11:44então eu acredito

11:45que isso é uma obra

11:46que vai demorar

11:47no mínimo

11:48alguns anos,

11:50se tudo

11:51der certo.

11:57O que é

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