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00:00Olá amigos, estamos dando início a mais um Ponto de Vista.
00:12Hoje, mais uma vez, abrimos espaço para o clima das festas juninas.
00:16E quem está aqui com a gente é a cantora Ira Caldeira, a mineira mais pernambucana da nossa música.
00:24Ira, seja muito bem-vinda, é um prazer, uma honra ter você aqui com a gente hoje.
00:29Muito obrigada por esse convite, para mim também é de extrema importância, é um momento muito especial a gente poder vir para contar o que está acontecendo,
00:37falar da vida da gente para você e para todos aí que estão nos vendo. Muito obrigada.
00:41Eu quero aproveitar essa entrevista para destrinchar tudo, saber como começou a sua carreira.
00:47Então, como foi que a música tomou conta de Ira Caldeira ainda lá em Minas Gerais?
00:52É engraçado, porque você já começou assim, a música tomou conta.
00:57Eu sempre falo que a música mudou a história da minha vida.
01:01Eu casei muito nova, eu comecei a namorar com 15 anos, casei com 17, com 18 já era mãe.
01:07Então, eu sequer, Fernando, tive tempo para compreender as minhas aptidões.
01:11O que é que eu vou fazer? O que é que eu vou estudar?
01:13Eu não tive tempo para nada disso.
01:16Então, assim, eu nunca tinha cantado na escola, eu nunca tinha cantado no circo, eu não tinha cantado na igreja, em canto nenhum.
01:21Apesar de vir de uma família muito musical, meu pai, minha mãe, minha irmã mais velha, todo mundo gostava de cantar, de tocar,
01:27viviam sempre ali, cantando e ouvindo músicas, e eu nada.
01:33E aí, chegam a certa hora já com o filho, com tudo, que eu começo a cantarolar as coisas dentro de casa,
01:39e aí eu escuto, tem uma voz bonita, você canta bem, não sei o que.
01:42Eu fui acreditando naquilo e dando espaço para isso, e assim aconteceu.
01:49De repente, eu comecei a me mostrar um pouco mais, sempre nas festas de família, comecei a tocar violão,
01:57cantando para os filhos na hora de dormir, mas aí abro um espaço ali, uma festa,
02:00depois um convite para cantar numa banda, depois um restaurante, um barzinho,
02:06e aí as coisas foram tomando conta, até que eu resolvo ser cantora, eu vou me profissionalizar.
02:11É, eu soube que você, num determinado momento aí da sua vida, você decidiu rodar o Brasil,
02:16percorrer esse Brasilzão de norte a, pelo menos o norte e o nordeste, digamos, né?
02:22E, num determinado momento, você, nessa mistura de viver novos ares, novos ritmos,
02:28você se encantou por Pernambuco e acabou ficando por aqui.
02:31Como é que foi essa escolha?
02:33Eu até, nesse período, eu nunca tinha saído de casa, de Minas, da minha cidade,
02:39nunca tinha conhecido uma praia, nada.
02:41Então, eu tive a oportunidade, por exemplo, de viajar, tinha parente no Pará.
02:46Então, eu fui para lá, mas eu fui já com o intuito de conhecer a música, por exemplo,
02:49eu sou louca por carimbó, nos shows sempre tem carimbó, fruto dessa andança minha no Maranhão, no Pará.
02:56No Pará.
02:57É.
02:57E aí passei pelo Maranhão também, o Boa e aquela coisa toda.
03:01Então, assim, eu tive a oportunidade de, por exemplo, quando eu fui no Pará,
03:04eu consegui cantar em alguns lugares.
03:06Quando eu fui no Maranhão também, eu cantei em alguns lugares, nessas passagens.
03:09E assim foi.
03:10Voltei para Minas e não tinha vindo para cá ainda.
03:15Então, o objetivo também era fazer uma dança só por aqui e voltar para Minas para gravar o disco lá,
03:21que eu ia, estava já procurando repertório.
03:23Esse aqui foi Recife, foi Caruaru, foi qual cidade exatamente?
03:27Foi Caruaru, que nessa época eu tinha uma irmã que morava lá.
03:30Ela era casada com o Pernambucano e tinha um restaurante lá.
03:35Então, quando ela me chamou para conhecer Caruaru, eu já fiquei pensando,
03:38puxa, vai ser uma ótima oportunidade para eu, que eu adorava as músicas daqui.
03:42Tinha um disco de Fagner, que ele tinha duas músicas de Maciel Melo.
03:45Então, assim, que eu era apaixonada, aquele caboclo sonhador, no tempo de meninos, aquele disco.
03:51E eram as músicas assim.
03:52Aí eu ficava perguntando quem era, quem era Maciel Melo, Fagner, que era sucesso nacional.
03:58Mas eu sempre fui muito curiosa, então eu lia o nome de todos os compositores.
04:02Todo disco que eu ouvia, eu queria saber quem fez a canção.
04:05E aí, quando eu cheguei aqui, lá em Caruaru, que eu vi Maciel Melo, eu disse,
04:11Maciel Melo, esse nome eu conheço, era do compositor.
04:15E aí fiz contato com Maciel, através de um amigo muito querido lá de Caruaru, Caxiado,
04:22que era aquele artista plástico que fez várias peças, aquelas coisas da Fazenda Nova,
04:29do Espetáculo da Paixão, o Cavalo, tudo.
04:31Caxiado, um grande artista.
04:34E Caxiado me levou para conhecer várias pessoas.
04:36Então, assim, eu consegui falar com Maciel por telefone,
04:39falei com a senhora Lineto, que me recebeu na casa dele, me deu fita cassete.
04:42Aí foi, juntando as coisas tudo, e ia voltar.
04:46Aí saí de Caruaru, trabalhei, cantei também em Caruaru, tive oportunidade.
04:51O recém-inaugurado Shopping Caruaru, eu tive oportunidade no mês de junho, de 98 isso.
04:59E julho, que foi a primeira vez que eu tinha vindo aqui,
05:02eu cantei lá, né?
05:04E aí fui...
05:05Você lembra ainda, assim, qual foi a música, aquela primeira música sua
05:09que chamou atenção no cenário musical para você?
05:12Lembro, lembro, sim.
05:13Quer dizer, o meu primeiro disco, ele chamou muita atenção porque eu...
05:18Por exemplo, assim, que para mim foi uma coisa que me deu muita sorte.
05:24Eu fui a primeira pessoa quem gravou.
05:26Se a veste não, amanhã pode acontecer tudo, inclusive nada.
05:32Se a veste não, a lagarta rasteja até o dia em que cria asas.
05:38Se a veste não, que a burrinha da felicidade nunca se atrasa.
05:44Se a veste não, amanhã ela para na porta da sua casa.
05:49A natureza das coisas de Acioli Neto.
05:52Então, nesse material que a Acioli me deu, tinha essa música que eu escolhi.
05:57E essa música hoje, ela não fez sucesso na minha voz.
06:00Ela foi fazer sucesso depois na voz de Santana, que gravou depois de mim.
06:03De Flávio José, que Santana, quando gravou, passou para a Flávia.
06:07Então, assim, vai fazendo, né?
06:08Um grava, outro vai.
06:09E hoje ela é a terceira música mais gravada de Acioli Neto.
06:12Mas a música que eu considero, que foi um divisor de águas, assim, na minha carreira,
06:18que quando eu cheguei no lugar para cantar e que eu ouvi as pessoas cantando também,
06:23ela está no disco que foi meu quarto disco.
06:27Que é?
06:282006, Entre o Calango Baião.
06:30Que eu fiz Mistura Brasil em 99.
06:35Em 2001, eu fiz Canto do Roxinol.
06:37O meu terceiro disco foi Ira Caldeira Canta Maciel Melo, que eu sempre fui, né?
06:42Acho que Maciel, um compositor maravilhoso, fiz um disco que gravei, só música de Maciel.
06:47E esse quarto, em 2006, Entre o Calango e o Baião.
06:50A primeira música chama-se Quero Ter Você.
06:52Os compositores Pequim e Mourão Filho, que eu nunca conheci.
06:56Mas era uma música que tinha sido muito tocada quando eu era adolescente.
07:02Então, eles cantavam lá na pracinha.
07:04Ela foi tema de uma novela, acho que em 1970, alguma coisa assim.
07:07Eu era menina e lembro dessa música.
07:09Gosto de você assim como você é, pode me amar assim como você quer.
07:17Quero ter você e não quero saber.
07:21Se assim não fosse, como poderia ser de outro jeito.
07:26Abraço teus defeitos, gosto dos teus olhos do jeito que olhas.
07:32Quero ter você.
07:33Certo.
07:34Agora, Ira, você tem muito ainda de Minas, né?
07:37Você é mineira, está radicada aqui em Pernambuco, né?
07:41Mas eu queria saber o que é que você faz questão de manter da sua mineirice, por exemplo.
07:47Eu acho que tudo, sabia?
07:48Desde os erros no jeito de falar.
07:51É um estado muito rico também, né? Culturalmente.
07:52De tudo, assim.
07:53É porque é uma coisa assim que é tão impregnada na essência da gente.
07:58Minas tem uma influência direta na minha música, no meu jeito de fazer forró.
08:02Eu trago a influência aí do calango, da folia de reis, dos congados, das manifestações culturais, religiosas de Minas.
08:13E ainda a coisa da comida, né?
08:16Eu sou aquela pessoa ainda que descasca o alho, soca no socador.
08:21Então, muita coisa a gente traz.
08:24E o português que a gente vai comendo as palavras, né?
08:27Uma coisa assim, vai falar um dendapia.
08:30Você fala trem?
08:31Fala trem.
08:33Essa semana, Fernando, a Mariana disse assim, nós estávamos em Caruaru, no Polo Cultural.
08:38Semana passada, alguns dias atrás, nessa temporada.
08:42Nós estávamos no Polo Cultural e eu não esqueci isso até hoje.
08:46Estava tendo um trem passeando dentro do shopping e ela pitava, pia, barulho.
08:52Aí ela estava mexendo assim na roupa dela, fazendo alguma coisa e reclamou.
08:56Nossa, esse trem está horrível.
08:58Aí eu disse, deixa eu arrumar para você.
09:01Eu achei que era uma coisa na roupa.
09:03Aí ela riu e disse assim, para mineiro tudo é trem, né?
09:06Mas eu estou falando do trem de verdade que está circulando lá fora.
09:10Aí eu ri.
09:11Mas então é isso.
09:12A escolha do forró, porque assim, você aí falou já do carimbó, né?
09:17Tem vários ritmos.
09:18O país é riquíssimo de ritmos, né?
09:20Como foi que a gente vê que você é uma cantora exímia de forró, está sempre nos
09:26seus discos, o forró predomina, né?
09:29Sim, sim.
09:29E como foi que surgiu essa escolha pelo forró entre tantos ritmos do país?
09:35Quando eu comecei a cantar em Minas, tem coisa que não se explica.
09:39Não sei.
09:40De fato, eu não sei, assim, pontuar exatamente.
09:45A percepção ampla.
09:46Mas eu conheci, evidentemente, né?
09:51Ali do meu lado, ali, tudo muito presente, o movimento que foi o movimento que mudou a
09:57história da música do Brasil, que é o Clube da Esquina.
09:59O movimento da música mineira, com Lou Borges, Fernando Branche, Milton Nascimento.
10:04Então, aquela turma toda ali.
10:06E de músicas riquíssimas, riquíssimas.
10:09Mas eu sempre gostei muito das folias de reis.
10:13Eu tenho uma influência muito direta das modas de viola, de Pena Branca, de Chavantinho.
10:19Não sei se vocês vão conhecer Tonico e Tinoco, Cascatinha, essas coisas todas.
10:25Então, eu gostava, por exemplo, quando eles cantavam...
10:27Oh, Deus salve o oratório, oh, Deus salve o oratório, onde Deus faz a morada.
10:34Ai, meu Deus.
10:36Que é uma coisa que é mais voltada para o folclore.
10:40E isso me cativava muito mais até do que a música mais clássica lá do Clube da Esquina,
10:48por questões rítmicas.
10:49Então, isso aí tinha um balanço.
10:52E isso, o forró, me seduzia mais por essas questões.
10:58E aí, quando eu ia, mesmo fazendo violão e voz nos bazinhos e tal, eu sempre cantava.
11:03Quando o Vivi cantou, corri pra ver você, atrás da serra o sol, tava pra se esconder, quando você partiu.
11:12E outra coisa, assim, que eu observava, que era muito natural também, a facilidade que eu tinha de cantar as coisas rápidas.
11:18E os trocadilhos e...
11:21O forró tem um lado muito romântico também, né?
11:23Assim, essa letra aí que você acabou de cantar mesmo, é uma coisa...
11:27É forró, é um ritmo animado, mas é uma música bem romântica também.
11:30Tem muito, assim, olha o Neto mesmo, é, né?
11:33Não sei, que aí dentro ainda mora um pedacinho de mim.
11:35Então, tem essa poesia, tem tudo.
11:38Mas aí, essa questão do forró, eu acho que é essa intimidade que eu tinha já com a música do folclore,
11:43que era muito ritmada, e acho que o forró é o que mais se aproximava dela.
11:47Você, esses anos todos em Pernambuco, você já é cidadã pernambucana, cidadã recifense, caroaruense, tabirense.
11:55Como é receber esse reconhecimento todo pra você?
11:58O que é que significa esses títulos de cidadã pra você?
12:02Significa muito.
12:04Porque, eu não sei, assim, se a pessoa...
12:06Pra mim, nunca passou nada disso em vão.
12:08Sempre teve uma representatividade, assim, imensa.
12:11É algo que eu trago, assim, com muito orgulho e com sentimento imenso de gratidão.
12:17Porque uma coisa é você deixar tudo pra trás e chegar num lugar e pensar assim,
12:21eu vou recomeçar aqui, eu vou plantar tudo aqui de novo.
12:23Tudo, vou começar tudo aqui.
12:25E aí, nesse momento, é como se você escolhesse algum lugar que fosse alguém,
12:31o território ali, pra que fosse sua mãe.
12:34E quando vem esses títulos, é esses lugares te reconhecendo como filha.
12:39Então, isso pra mim tem um peso, um significado muito importante.
12:43Muito bem.
12:44Ira, você é reconhecida hoje já como uma grande intérprete de forró,
12:48mas eu queria perguntar pra você, das mulheres intérpretes, né?
12:53Quais foram as que te inspiraram mais?
12:56Aquelas que você procurou meio que se espelhar, né?
12:59Na hora de...
13:00Quando você tava ali no começo da carreira,
13:03começando a cantar essas músicas, seja forró, seja qualquer outra.
13:07Teve alguma dessas cantoras mais conhecidas, mais antigas,
13:11que chamaram a sua atenção e serviram de espelho?
13:14Olha, eu gostava muito de ouvir Marinês cantando,
13:18por causa daquela rasgada, aquela coisa assim,
13:20do sentimento que ela sempre jogava ali nas canções.
13:22Então, quando eu...
13:23Era só o rádio que a gente escutava também, mas tocava, né?
13:26A gente ouvia as rádio lá que tocava muito isso.
13:28Então, quando o Marinês ia tocar, eu já ficava lá observando.
13:31A Melinha.
13:32A Melinha eu achava assim, acho ainda, né?
13:36De uma voz, de uma coisa diferente, assim, no canto.
13:40E o repertório dela sempre me agradou muito.
13:42Mas eu imitava descaradamente Elba Ramalho.
13:45Então, hoje, eu acho que ainda eu trago essa coisa,
13:49porque era a música que mais tocava.
13:52Então, se a gente ficava ouvindo rádio pra aprender uma música,
13:56a gente ia aprender que tocava mais.
13:57E Elba, na época, tava mais em evidência.
13:59Então, a música dela tocava de manhã, tocava de tarde de novo,
14:01a gente conseguia pegar letra e aprendia e tocava, e aí cantava aquilo.
14:05Então, assim, eu tinha, na época do baile,
14:07eu tinha um bloco todinho com, quase todo, com, acho que umas quatro canções de Elba.
14:13Aí tinha outras duas de Amelinha, mais uns três porró de Marinês.
14:16Mas, então, essas três mulheres, assim, elas tiveram influência muito marcante.
14:20Inspiraram mais você.
14:21Muito, muito.
14:22Muito bem.
14:23Vamos fazer um rápido intervalo.
14:25Você que tá acompanhando, fica aí.
14:27A gente volta já, já.
14:28Estamos de volta hoje, entrevistando aqui, no Ponto de Vista,
14:41a cantora Ira Caldeira, a mineira bem pernambucana da gente.
14:46Ira, nesse período junino, né, os cantores mais conhecidos estão sempre com a agenda lotada.
14:52Queria saber como é que vocês fazem pra aguentar essa maratona.
14:55Eu sei que tem cantor que canta em dois shows, numa noite só, às vezes até em três.
15:02A gente faz até três.
15:03Pois é.
15:03Como é que vocês conseguem, qual o segredo pra manter a voz?
15:07Olha, não adianta, vou te dizer mesmo, assim, se alguém perguntar isso pra mim, eu vou falar.
15:11Gente, não adianta, você não se prepara num mês.
15:13Não adianta achar que vai fazer uma temporada com 30 shows, com 40, com 20 e poucos,
15:17e que vai um mês anterior.
15:20Então, são cuidados contínuos.
15:22Então, tem que ter um cuidado com a fono, ter uma fono muito boa.
15:26É um cuidado quase que diário, né?
15:27É diário, é diário.
15:29É importante a atividade física.
15:31Atividade física, não.
15:32É diferente de atividade física ou exercício.
15:33Atividade física é você ir ali lavar o carro, não sei o que.
15:35Exercício físico é uma coisa com metodologia, que você vai fazer com disciplina,
15:41com todo dia, né, de preferência, o máximo possível.
15:45Mas, então, tem que ter esse cuidado com a alimentação, com a atividade, com os exercícios físicos, com a voz.
15:53Então, é um conjunto de coisas.
15:54E, assim, eu, por sorte, eu sou bem disciplinada.
15:57Mas, ainda assim, esse ano eu cometei um agafe, que passei a primeira semana de junho gripada,
16:03porque eu não tomei a vacina.
16:04Olha para você ver, né?
16:05A gente fica, às vezes, tão envolvido com a coisa e acaba.
16:07Ano passado eu tomei, esse ano eu não tomei.
16:09E aí me custou uma semana de gripe.
16:11Mas, ainda assim, graças a esse preparo que a gente tem,
16:14eu fiz todas as apresentações sem comprometer voz, sem nada.
16:18Muito bem.
16:18No ano passado, você completou 25 anos de carreira, não foi?
16:22Isso.
16:22Esse ano, estamos no 26º ano.
16:25Eu queria que você fizesse um balanço, assim, para a gente.
16:28Qual a avaliação que você faz dessa sua trajetória artística?
16:33Fernando, eu olho para mim, assim, eu fico tão orgulhosa de mim,
16:37porque eu fui uma pessoa, assim, sem um preparo adequado.
16:43Sabe, assim, eu não tive...
16:44Quando eu me casei, eu não tinha nem sequer terminado meus estudos.
16:48Eu vim fazer uma faculdade,
16:50que foi um presente que eu me dei quando eu fiz 50 anos.
16:53Eu fiz Educação Física.
16:54Aí fui para a faculdade, 4 anos,
16:56cursei nos 8 períodos, sem nenhuma reprovação, sem nada.
17:00Chegando, às vezes, de mala e falo...
17:02Porque eu queria esse presente, falar assim,
17:03eu fiz uma faculdade que eu não tinha tido oportunidade de fazer.
17:06Com 17 anos, eu me casei, tive que sair da aula.
17:08Depois eu voltei, completei aquele básico ali, mas não tinha feito.
17:11Então, assim, a questão, assim, da educação,
17:16das coisas que nos foi oferecida por ser de uma família,
17:21éramos 11 filhos.
17:23Então, imagina um casal para dar conta de 11 meninos.
17:27Então, a gente se virava muito sozinho.
17:29Negócio de fazer tarefa, a gente ensinar,
17:31ver que roupa que vai usar, nada.
17:34Eu lembro que uma vez eu tinha um caroço no pé
17:36e eu peguei um ônus, fui para o hospital,
17:38chegou lá e pediu o médico para operar.
17:39E eu tinha 11 anos de idade.
17:41E ele ficou assim, mas não, pode cortar, pode cortar.
17:43Ele cortou mesmo, deu pontos, deu 12 pontos.
17:46E eu cheguei em casa toda feliz, que eu falei com o papai,
17:48que ele jogava aquele negócio da loteria, que era 13 pontos.
17:51Eu falei, pai, quase que deu 13 pontos.
17:53Aí foram 12.
17:55Então, assim, eu comecei a me virar muito nova sozinha, sabe?
17:58Assim, fazendo as coisas que tinha que fazer,
18:01nos afazeres da casa também.
18:03Então, quando eu percebo daquela menina,
18:05quando eu olho para trás, que eu vejo aquela menina
18:06que foi criada para casar, ter filho, ser dona de casa.
18:10E que eu dou essa virada na minha carreira, sabe?
18:13E está completando 26 anos já agora.
18:14Estou fazendo 26 anos de carreira, que eu tenho 17 álbuns gravados,
18:18que eu já participei em mais de 60 discos de outros artistas,
18:21que eu tenho cidadania de tantas cidades, de outro estado,
18:26sem ter perdido a referência, as coisas que são importantes para mim em Minas.
18:30É assim, eu fico assim, eu tenho muito orgulho de mim.
18:33Eu acho que é bonita essa trajetória, me orgulha muito.
18:39E um sentimento de gratidão, assim, sabe?
18:43Pela coragem e pela música.
18:45Porque a música me deu coisas que eu nunca pensei que eu ia ter um dia.
18:48Inclusive, nessa carreira, você achou espaço até para as crianças, né?
18:51Tem um projeto seu voltado para as crianças.
18:53Fala um pouquinho sobre ele.
18:54Sim, eu não paro, não.
18:55Foi na pandemia, que aí é essa parada obrigatória, né?
18:59Porque a gente ficava naquela coisa.
19:01Estava fazendo o carnaval, porque sempre fiz carnaval também,
19:04estou fazendo aquela coisa do carnaval.
19:05Quando acabou o carnaval, eu precisava de focar na agenda de São João,
19:09no que eu ia lançar, na música, no álbum todo,
19:13sempre gravando, pesquisando muito para compor repertório, aquela coisa toda.
19:17E aí, de repente, a pandemia.
19:18A gente fica numa casa de praia sem ter nada para fazer.
19:22E aí, um dia, eu resolvo cantar uma cançãozinha lá.
19:25Dizem que verrugas são estrelas que a gente aponta, que a gente conta
19:31antes de dormir, dormir, dormir.
19:35Eu tenho contado, mas não tem nascido.
19:38Isso é história de nariz comprido.
19:41Deixe de mentir, mentir, mentir.
19:45Os sete anões pequeninos, sete corações de menino
19:51E a alma leve, leve, leve
19:53São folhas e flores ao vento
19:57O sorriso e o sentimento
20:00Da branca de neve, neve, neve
20:03É uma canção de Juraildos da Cruz, que chama-se Meninos.
20:07E é uma canção que já foi gravada muito lá pelo Sudeste.
20:10Aí ele olhou para mim e disse assim
20:11Você canta isso tão bonito?
20:14Aí eu disse
20:14Você é do meu projeto infantil.
20:15Aí ele olhou para mim e disse assim
20:16Uai, onde é que eu estava?
20:17Tem esse projeto infantil que eu não estou sabendo.
20:21Então, foi interessante que foi a primeira vez que eu externei isso.
20:24E era uma coisa que já estava dentro de mim há 20 anos.
20:27Foi justamente quando eu fui avó.
20:28Quando o meu neto nasceu, eu tive vontade de cantar essa música num disco.
20:34Mas eu não consegui na época.
20:35Eu já estava em segundo forró, o São João, aquela coisa toda, eu não fiz.
20:39Depois você gravou então um disco infantil.
20:41Aí eu pensei assim
20:42Pois é, um dia eu vou fazer um disco infantil.
20:43Aquilo ali ficou dentro de mim.
20:44Aí quando eu falo que é do meu projeto infantil.
20:46Aí nós começamos e gravei.
20:48São 12, tem nas plataformas digitais, tem um canal que chama-se Turma da Irazinha no YouTube.
20:54Tem 12 canções.
20:55Turma da?
20:56Turma da Irazinha.
20:57Turma da Irazinha, A Minha Criança Interior.
20:59Sim.
21:00Turma da Irazinha tem 12 canções.
21:02Tem 4 vídeos animados dessas canções que são lindos.
21:06Com ilustração de Rafael Barreto, que é um artista maravilhoso.
21:12Temos já...
21:13Está sendo impresso agora o segundo livro.
21:17Estamos no projeto já do jogo pedagógico.
21:19Então, assim, a Turma da Irazinha é um projeto que eu convido todo mundo para conhecer.
21:23Chega lá no canal do YouTube.
21:25Turma da Irazinha que vocês vão ver.
21:26Inclusive, temos um show essa semana.
21:28Deixa eu aproveitar e falar que vai ser dia 29, no sítio da Trindade, às 16h...
21:34Acho que às 5h da tarde, mais ou menos.
21:36Tá certo.
21:37Você já gravou, irá, 17 álbuns na sua carreira.
21:40Já me falaram que você é muito criteriosa na escolha do repertório que você quer gravar em cada álbum, né?
21:47Como é que você escolhe essas músicas?
21:50Varia muito o compositor, que você mistura compositores no mesmo álbum.
21:56Como é que você faz a escolha do repertório dos seus álbuns?
21:59Faça estúdio, hein, Fernando?
22:00Ó, para começar, eu sempre falo, né, eu gravo compositores maravilhosos.
22:05Chico Bizerra, Maciel Melo, Petrícia Mourinho, meu marido, Beguá, que é um grande compositor, vários.
22:09Mas eu sempre falo com eles, gente, o mais importante quando eu vou gravar, não é gravar o compositor tal,
22:16ou o compositor tal, ou a compositora tal, é gravar a música.
22:20Então eu preciso que aquela música me toque.
22:23Então eu acho que quase todo o disco meu, se não for 100%, tem um compositor lá que nunca tinha sido gravado por ninguém.
22:31Mas por quê?
22:31Porque a música dele me conquista, me cativa e assim foi.
22:35E você faz essa, é uma coisa proposital, assim, você escolhe alguém que você não gravou ainda?
22:40Não, não, porque eu também não permito essa coisa meio que filantrópica de fazer.
22:48Eu acho que a responsabilidade que a gente tem com o que lança tem que ser algo muito sério, né?
22:52É diferente, eu posso ir cantar com qualquer pessoa que me convidar,
22:56mas eu não posso trazer para o meu repertório algo que eu não confie 100%.
23:01Ou que se eu tivesse capacidade de fazer, era algo que eu faria, né?
23:05Certo, eu sei que você fez um trabalho em 2009 que você escolheu só compositoras, né?
23:12Só mulheres compositoras.
23:14Fala um pouquinho sobre essa experiência, como é que foi?
23:16Foi algo assim muito, muito especial, porque quando eu estava fazendo pesquisa para os álbuns anteriores,
23:23eu já tinha feito nesse período aí, eu acho que uns oito álbuns.
23:29A forma que a mulher chegava para me trazer canções era uma forma muito diferente do homem.
23:35O homem chegava, mesmo com o material, às vezes, inferior ao que a mulher tinha feito,
23:41ele dizia, olha, eu sou um compositor, eu sou um poeta tal, e essa música aqui, não sei o quê, não sei o quê.
23:46E aí, quando a mulher chegava, ela chegava, olha, Lira, se você podia ouvir isso aqui, eu fiz umas musiquinhas,
23:52eu gravei esse CDzinho aqui, sabe aquela coisa assim, que a pessoa já chegava...
23:57Muito humilde, né?
23:57É, num ambiente extremamente dominado pelo machismo, que a gente ainda vivencia isso hoje muito,
24:05apesar de muita coisa já ter mudado e vai mudar mais ainda, mas precisa que mude,
24:11mas então tinha essa dificuldade.
24:12E aí eu comecei.
24:14Nesse disco que eu falei com você, que teve a canção, que foi Divisor de Águas,
24:17quero ter você, eu gravei uma senhora que ela nunca tinha sido gravada.
24:23Ela assinou ainda nesse álbum, em 2006, como Selma Santos.
24:28Hoje ela é dona Selma do samba, é uma das sambistas mais gravadas aqui.
24:32Eu fui a primeira pessoa, até hoje ela fala que eu sou a madrinha dela.
24:35Então Selma, por exemplo, ela foi a única pessoa num disco cheio de compositores maravilhosos,
24:41mas ela foi a única que colocou duas canções.
24:44Eu gravei uma atuada dela e gravei um arrastapé.
24:46Se você quiser, pode me chamar que eu vou acender sua fogueira com a chama do meu amor.
24:55Se você quiser...
24:56Aí gravei isso dela, gravei uma atuada e essa música dela, inclusive, foi para o meu DVD.
25:02Mas isso aí é que me chamou a atenção.
25:03Como foi a receptividade desse álbum, só com músicas de compositoras?
25:09Eu consegui, foi a única vez que eu me inscrevi num projeto,
25:13e eu fui aprovada pelo Fundo de Cultura do estado de Pernambuco, Fundo Cultura.
25:17Então eu selecionei, o álbum chama-se Marias das Dores da Luz,
25:22Mulheres Compositoras do Nordeste.
25:24Eu reuni 15 mulheres de todo o Nordeste.
25:27Então tem Joésia Ramos de Aracaju, tem Dona Maria do Horto, do Ceará,
25:32que era uma lavadeira, tem professora, tem cantora, Socorro Lira, Flávia Wenceslau,
25:38então assim, Bia Marinho, Aide Camelo, Jussara Cury, são 17 compositoras.
25:44E tive a participação, escolhi uma mulher para cantar comigo, que seriam duas.
25:50Anastácia, Anastácia não, desculpa, Anastácia, eu gravei Anastácia,
25:54é marinês, mas que faleceu um pouquinho antes, não tive essa oportunidade,
25:58mas tive Dona Aurinha do Coco.
26:02Que gravou um coco comigo.
26:03Então é um projeto assim todo feito por mulheres, né?
26:07E foi aprovado pelo Fundo Cultura e para mim também, assim, de uma importância imensa.
26:13Você gravou com muitos compositores, Alceu, Petrúcia Murim, Luiz Gonzaga, né?
26:19Músicas de muitos, Zé Dantas, Jackson do Pandeiro.
26:23Como é que tem que ser, assim, eu imagino que cada compositor acrescenta muito a carreira de uma cantora, né?
26:28Como é essa interação, essa identificação entre a cantora e o compositor?
26:34Isso é uma coisa muito importante também.
26:36Você lembra que eu comentei há pouco agora, quando eu escolho ritmos diferentes?
26:40Então, se a gente for olhar, por exemplo, a obra de Gonzaga, ela tem um perfil, né?
26:44Então, se eu pegasse aquele ali de Gonzaga, eu teria...
26:49Se eu pego o Jacos do Pandeiro, já é uma outra coisa, é outro ritmo, é outra coca.
26:53E assim vai.
26:55Aqui hoje, por exemplo, Petrúcia Murim.
26:58Petrúcia Murim tem uma música mais urbana.
27:01Se você observar a música, a linguagem de Petrúcia é urbana.
27:04Aí você vai para Marcel Melo, é uma música mais sertão, mais rural, né?
27:07Fala mais de bicho, das fazendas, daquelas coisas todas e tal.
27:12E assim, eu acho que se eu pego uma linha só, ela me limita, né?
27:20Eu acho que eu tenho muito mais condições de aprender, de fazer algo diferente,
27:24quando eu passeio por essas pessoas todas.
27:28Porque aí eu vou trazendo a influência de cada um para a minha vida.
27:33Muito bem, Irá, nossa entrevista está acabando.
27:36Eu queria que você escolhesse uma música para a gente encerrar.
27:39Ah, então eu vou escolher Até Se Derreter,
27:42que é uma canção do meu marido, que chama-se Biguá.
27:44E é um forró que foi feito agora recentemente,
27:48foi lançado agora nas plataformas digitais,
27:50e eu vou cantar um pedacinho assim para vocês.
27:52Vamos lá.
27:52A gente é desejo de amor, é suor, é calor, sombra para se deitar.
27:57A gente é sossego, é folia, o que contagia por onde passar.
28:01A gente é chama, é vapor, o fogo sedutor, tudo pode queimar.
28:06É lenha, fogueira, alegria, é tanta energia, não pode acabar.
28:10A gente esquenta, vai até se derreter.
28:13Pode ferver, a gente bota para quebrar.
28:14Obrigado a você, a gente volta na semana que vem.
28:16Vamos terminar ainda ouvindo a Iraque.
28:18Deixa o corpo todo arrepiar.
28:20Me toca com carinho, bem devagarinho, deixa o corpo todo arrepiar.
28:24Ai, ai, ai, é amor.
28:27Ai, ai, ai, é paixão.
28:29Ai, ai, ai, faz um dengo, dispara no meu coração.
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