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  • 16/05/2025
No segundo episódio do #BoraBrilharCast, Luanda Vieira recebe Deh Bastos e Marcela Tiboni para falarem sobre os desafios e conquistas de ser mãe e manter uma carreira profissional, num bate-papo sobre Maternidade e Trabalho . 💜

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Transcrição
00:00Oi pessoal, eu sou Luanda Vieira, jornalista, e esse é o Bora Brilhar Cash, o videocast da
00:07Endemol Shine Brasil. A mãe lava, passa, cozinha, dirige, trabalha, ajuda os filhos a estudar,
00:15brinca com eles, estuda, pesquisa, vai ao mercado, passeia, leva os filhos ao médico e luta pelos
00:23seus direitos e os direitos dos seus filhos. Para falar sobre maternidade e mercado de trabalho,
00:29hoje a gente vai receber Marcela Tibone, palestrante, LGBT+, escritora e Dé Bastos,
00:35diretora criativa e palestrante.
00:37Dé, Marcela, é um prazer ter vocês aqui comigo hoje. Sempre quando eu falo de diversidade e
00:54diversão, eu digo que o mundo ideal é que eu não precise mais falar sobre isso e eu acho que
01:00quando a gente fala de maternidade é a mesma coisa. Quando a gente chegar num momento que a
01:05gente não precisa mais falar dos desafios, é porque a gente chegou lá, mas enquanto precisamos,
01:10continuaremos falando, né? Então eu queria que vocês começassem me falando justamente quais
01:16foram os primeiros desafios que vocês detectaram ali no início da maternidade, aquela coisa que
01:21não se aponta que vai acontecer e vocês descobrem sozinhas.
01:25Você é mãe de dois, por você ser a primeira.
01:28Primeiro, eu acho muito difícil as pessoas conseguirem te preparar, eu e minha esposa somos
01:35mães de gêmeos e eu lembro que as pessoas falam assim, dorme muito antes porque você não vai
01:41conseguir. Eu lembro que a minha esposa falava assim, mas isso não é um banco de horas, não adianta
01:45dormir muito antes porque depois eu não vou descontar, né? Falar, eu quero três horinhas
01:49de semana que eu já acumulei. Então acho que isso foi gerando uma expectativa, mas eu acho que
01:55quando de fato aconteceu, ninguém nos preparou, por exemplo, para dois porpérios. Eu amamentei
02:00também mesmo sem engravidar e as médicas, toda a nossa equipe tinha uma disputa de algumas falam
02:06não vai ter porpério, outros falam vai ter porpério, outros falam você já está no porpério porque eu
02:10já estava ordenhando e tirando leite antes deles nascerem. E aí uma cena que eu acho que finaliza
02:16de fato, a gente chegou com as crianças da maternidade, aí eu fui tomar um banho e colocá-las
02:22para dormir, aí a gente chegou na cama, eles estavam, a Mel estava deitadinha assim, enrolou um
02:26para o alto e o outro enroladinho também assim embaixo, só que aí eles tinham um espasminho,
02:33então de cima batia um pouquinho a cabeça na parede e ia chutando a cabecinha do de baixo e aí eu olhei
02:38para ela e falei, a gente vai dormir assim? E aí a gente começou a rir e falou, cara, a gente está há nove meses, a gente pensou
02:43a gente riu, riu, riu, riu, de repente a gente se olhou e começou a chorar, chorar, chorar, sentava no chão, chorava
02:48junto, aí a gente falou, nossa esse é o porpério, vai durar quanto? Meu Deus! Então acho que foi esse momento que
02:55acho que não tem muito como se preparar, todo mundo fala no segundo melhora, no nosso caso o primeiro
02:59já veio acoplado no segundo, então também a gente foi descobrindo tudo ali meio nessa lama, sabe?
03:05Eu acredito que quando a gente fala de maternidade, não sou mãe, mas acho que é uma experiência muito
03:13individual, né? Para cada uma, não tem como, vai acontecer isso, vai acontecer aquilo, porque o
03:19porpério existe, mas cada uma sente de uma forma, né? Como foi para você? Muito tranquilo, é frustrante
03:28para quem ouve, mas foi muito tranquilo, eu tive um porpério extremamente tranquilo, eu sempre quando
03:34as pessoas me perguntam sobre isso, eu falo do antes, eu acho que quando eu estava grávida, eu passei muito mal
03:38grávida, e um pouco antes de engravidar, a minha preocupação com a carreira era muito maior, foi assim,
03:44tanto que quando eu engravidei mesmo, eu falei assim, agora já era, agora vamos embora, vamos ser Amélia,
03:51vamos ser mãe de Ivan, aquela que faz, né? Que leva as crianças para a escola, tá tudo bem, relaxei, falei,
03:56é isso mesmo, vamos ser bela recatada do lar, que é o que a vida deu, porque até então a minha carreira, eu já
04:02tinha uma carreira de muitos anos, mas ela ainda não tinha os reconhecimentos que aconteceram todos depois que o José nasceu,
04:08então quando eu estava grávida, a minha maior questão era justamente a de trabalho, eu estava preparada para realmente
04:18parar de trabalhar, deixar de trabalhar, ou pelo menos deixar de planejar e almejar a carreira que eu queria,
04:24e aí eu falei, que beleza, agora eu vou ser mãe, tanto que eu consegui ficar dois anos com o José, e aí depois de dois anos
04:30quando o José já estava ali, tudo aconteceu, minha carreira deu uma guinada gigantesca, então as coisas já começaram a acontecer,
04:37tipo, de formas que eu não tinha sonhado nem antes, nem planejado antes de ter o José, então acho que a carreira foi a maior surpresa
04:43e foi do lugar da onde eu tive mais questões de equilíbrio.
04:46Sim, e é muito interessante te ouvir falar, porque é doido como a gente se preocupa com a carreira, né?
04:53Nossa, vou ser mãe, o que vai acontecer com a minha carreira, enfim, e é muito injusto que a gente tenha que ter esse tipo de preocupação, né?
05:02Como que foi para vocês conciliar, de fato, maternidade e carreira?
05:08Cara, para a gente, primeiro que no país a gente tem um problema gigantesco, que é a licença maternidade na dupla maternidade,
05:17então não existe dupla licença maternidade no país, no ano passado o STF fez uma votação que foi um marco super importante para nós,
05:26porque foi a primeira vez que o STF falou abertamente sobre o assunto, só que num resultado catastrófico,
05:32porque ele finalmente pautou como um projeto de lei equivalendo a licença maternidade não gestante à paternidade,
05:39então uma mulher não gestante, uma mãe, tem direito a cinco dias hoje de licença.
05:44Mas mesmo no seu caso amamentando?
05:47Tanto faz, eu sou uma mãe não gestante, aí você pode entrar com outras questões que é muito complexo,
05:52porque você acaba criando até uma disparidade de mães, então a lactante vale mais do que a não lactante,
05:59só que são escolhas, corpos que respondem ou que não respondem a isso, desejos,
06:05então na nossa época, porque parecem temporadas muito lá atrás, porque eu estou falando de 2018 quando eles nasceram,
06:13a gente já sabia que não ia ter licença, as duas autônomas, então a gente meio que se organizou para conseguir,
06:20e acho que a escolha da dupla amamentação também vem por isso, de falar,
06:24bom, eu consigo ficar com as duas crianças em casa amamentando enquanto a Mel consegue fazer reunião,
06:29consegue trabalhar e o inverso também, a gente conseguiu eles com três semanas de vida,
06:34a gente já estava entrando em reunião, cada uma com o seu neslingue, e aí deixa com uma, deixa com outra,
06:40mas eu acho que também outras situações, porque chegou depois de um ano, a Mel teve uma super crise,
06:46falou, não quero mais trabalhar com o que eu trabalho, e aí ela mudou de carreira e foi super bonito,
06:51eu fiquei com os dois, de repente eu me vi totalmente possibilitada de trabalhar,
06:56de falar, cara, agora estou com duas crianças, minha esposa mudando de carreira,
06:59e ao longo de toda a gestação as pessoas falavam, mas quem que vai cumprir esse papel do pai?
07:05Ela falava, ninguém, não, não, não, não estou falando do pai, claro, pessoas desconstruídas,
07:09mas eu quero saber quem que vai fazer o papel da porta para fora?
07:12Ela falava, qual é esse papel?
07:13Não, quem que vai trabalhar, sustentar, porque alguém tem que fazer o papel da porta para dentro,
07:17alguém vai cuidar, amamentar, vai acolher, e alguém tem que, porque tem muito essa binariedade,
07:23essa divisão de papéis, né, e mesmo numa relação afetiva, parece que há uma expectativa social ainda dessa,
07:30e para nós não, era assim, bom, as duas estão amamentando, a gente está fazendo exatamente a mesma situação,
07:35acho que o que diferia é que uma viveu o parto e a outra não.
07:39Então tinha uma distinção mesmo de corpo e de recuperação, de resto eram os mesmos papéis,
07:43mas quando a Mel mudou a carreira, começou a trabalhar, eu de repente fiquei com duas crianças e falei,
07:48cara, aquele meu trabalho lá de 18 anos não cabe mais, e aí eu falei, bom, e agora?
07:53E aí foi essa guinada que acho que foi acontecendo de virar influenciadora, escritora de dupla maternidade,
07:58palestrante, falar sobre letramento, mas que era algo que eu não preparei, não organizei,
08:03não imaginei e nem pensei, achei que era isso, as crianças diziam,
08:05mas eu ia retomar minha carreira e estava tudo bem, e de repente uma nova carreira apareceu,
08:09sem que eu tivesse talvez até preparada para isso, mas foi esse momento de engolir,
08:15mas acho que também tudo acontecendo e a gente repensando e como a sociedade nos cobrando esse lugar,
08:21de quem está cumprindo o quê, quem está fazendo o quê, e a gente também nesse lugar de repensar esses papéis.
08:27Um momento fofoca, a gente tem um filho juntas, né?
08:30Fofoca, limão, tesão, é o Maternidade no Pural, o livro que a gente tem com a autoria.
08:36Ai, total!
08:37Você viu? A gente nunca tinha se visto, né? Porque foi meio pandemia.
08:41Presencialmente não, mas a gente fez falas juntos.
08:43Não, presencialmente, mas acho que foi meio pandemia aquele momento, né?
08:46A gente escreveu um livro muito massa, chama Maternidade no Pural, são seis mães,
08:52com seis maternidades diferentes, então cada uma escrevendo sobre a sua perspectiva e é muito massa,
08:58e a gente tem esse filho em comum.
09:00Tem, nasceu.
09:01Bom, foi um parto.
09:02Meu segundo filho.
09:03Foi um parto, literalmente.
09:05Mas foi um parto, é muito difícil escrever.
09:07É porque eu não sou escritora e eu sempre corrijo isso nos releases,
09:10eu sou co-autora, escritora é, a Marcela é escritora profissional,
09:13mas a gente fez um livro que era o Maternidade no Pural,
09:16são seis histórias de maternidades, como as maternidades podem ser diferentes,
09:20então maternidade de produção, maternidade de duas mulheres, maternidade preta,
09:24então foi bem interessante, e foi perto da pandemia ali, né?
09:29Então era um momento onde a gente, as maternidades estavam muito afloradas também na gente,
09:33porque a gente também se descobriu uma pessoa diferente sendo mãe naquele período,
09:39e principalmente com relação ao trabalho.
09:41Eu acho que essa coisa do trabalho em casa, do trabalho remoto,
09:44eu acho que mudou muito a perspectiva que a gente tinha com relação ao trabalho,
09:48ao mesmo tempo que deu para a sociedade uma visão maior sobre o que é esse trabalho do cuidado.
09:54Eu acho que muitos homens acabaram ficando em casa,
09:57e acabaram, para relacionamentos heteronormativos,
10:00acabaram percebendo o quanto de trabalho você tem nessa demanda de casa.
10:05Então eu acho que a gente vive tempos difíceis, de desesperança,
10:09mas eu acho que de alguma forma, falando relacionado ao trabalho e à maternidade,
10:14isso deu em alguns lares, não tanto quanto a gente gostaria,
10:17uma perspectiva diferente de trabalho,
10:19de como que a gente divide melhor essa parceria da economia do cuidado, né?
10:23Porque era muito mais comum a mulher ter dupla, tripla jornada, né?
10:27Então eu, no meu caso, foi isso.
10:29A minha carreira acabou deslanchando muito mais quando meu filho nasce,
10:33e o que acontece é que eu decidi criar o meu filho em comunidade.
10:38Então eu tenho uma família muito grande, que é uma rede de apoio maravilhosa,
10:43um marido muito participativo dessa educação,
10:46então eu não tive problemas com essa questão da carreira,
10:49porque tenho praticamente sete adultos em torno de uma criança.
10:53Não posso imaginar como é a maternidade solo,
10:56como é que você faz isso sem uma rede de apoio,
10:59porque realmente, infelizmente, as mulheres precisam escolher
11:01entre ter uma carreira e ter um filho,
11:04porque conciliar as duas coisas na sociedade que a gente tem é praticamente impossível.
11:08Sim, completamente.
11:09Agora, é interessante você ter tido essa rede de apoio,
11:13conseguido exercer aí a sua profissão tranquilamente, né?
11:18Sim.
11:19Mas eu fico pensando, quando a gente vai para o mercado de trabalho de fato,
11:23vocês sentiram alguma diferença no tratamento,
11:26porque você é mãe em relação a uma outra mulher que não é mãe, por exemplo?
11:31Para mim, a minha sensação é isso.
11:33Eu sou mãe 24 horas com essa nova temporada,
11:37porque quando eu estou sem os meus filhos, por exemplo,
11:39aqui eu estou falando sobre eles.
11:40Então, eles falam muito assim, estão com seis anos, falam,
11:43mamãe minha, eu trabalho muito.
11:44Não, mãe, se ela não trabalha, ela só escreve livro,
11:47ela lê muito e fica contando sobre a nossa história no celular.
11:50Porque é isso, né?
11:51Eu estou ali, cara, contando a história deles,
11:53e registrando e falando sobre isso,
11:55mas lá na primeira temporada,
11:57quando eu estava num lugar onde ser mãe era um adendo,
12:01não era o foco, porque hoje ser mãe é o que constrói a minha nova carreira,
12:05mas lá naquele começo, não.
12:07Eu lembro uma vez que eu estava numa unidade de Sesc,
12:09coordenando um projeto, era um dia inteirinho de entrevistas,
12:12e eu lactante, amamentando, as crianças tinham cinco meses.
12:15Então, meu peito muito cheio, gêmeos.
12:17Eu falei, cara, vou chegar na unidade nove da manhã,
12:20se eu for embora sete da noite,
12:21eu vou precisar, em algum momento, tirar o leite com a maquininha.
12:24E aí, todas as pessoas que estavam à minha volta, nenhuma era mãe.
12:28E aí, eu falei, bom, tem aqui um lugar, aqui dentro e tal,
12:31que é uma sala, é meio a cozinha dos funcionários.
12:34E a cozinha dos funcionários é meio junto com o banheiro.
12:37Então, você pode entrar em algum banheiro.
12:38Ela só abriu para mim e saiu.
12:40E eu, sem crachá para entrar, sem crachá para sair.
12:43Falei, bom, vou no banheiro.
12:44Aí, sentei na privada, falei, nossa, eu vou tirar o leite aqui.
12:47Aí, a maquininha não entrava na tomada do banheiro.
12:50Falei, puta, sai. Tentei em outro.
12:52Falei, não, vou ter que ir para a cozinha.
12:53E aí, cheguei na cozinha cheia,
12:55tinha uma tomada, duas tomadas carregando o celular.
12:58Daí, eu cheguei para um rapaz e falei, tudo bem?
13:00Eu precisava?
13:01Ele falou, não, estou carregando aqui,
13:02porque eu vou precisar fazer uma prova online.
13:04Depois, preciso do celular. Não dá.
13:05Aí, eu vim para o outro.
13:06Ele falou, não, não, meu celular está sem bateria,
13:07não tem como carregar.
13:08Eu falei, não, eu precisava tirar o leite.
13:10Não, não, não tem como.
13:11Eu falei, caraca.
13:12Aí, achei uma cadeira.
13:13Liguei em uma outra tomada, meio atrás, assim, da geladeira.
13:17E aí, fui tentar sentar na cadeira,
13:20que tinha umas coisas.
13:21Fui tirar, a menina falou,
13:22você está tirando as coisas da cadeira?
13:23Eu falei, não, porque eu vou precisar tirar.
13:24Você trabalha no Sesc?
13:26Aí, eu falei, não, eu trabalho para o Sesc.
13:28Você nem devia estar aqui, então.
13:29Então, acho que você tem que estar fora.
13:30E aí, assim, glória.
13:32Chegou um cara, que era meio chefe,
13:34falou, você está tentando ordenhar?
13:36Pode parar tudo, sei o quê.
13:37Você pode tirar o celular que está carregando aí.
13:39A menina está ordenhando.
13:40Tira as coisas daqui.
13:41A cadeira vai ali.
13:42E aí, ótimo.
13:43Ele resolveu a minha vida,
13:44só que era todo mundo meio olhando para mim, assim.
13:46Eu, tipo, naquele momento,
13:47tirando o peito para fora, para tirar o leite.
13:49Foi tudo tão constrangedor,
13:51que eu lembro que eu deixei o leite na geladeira.
13:53E aí, à sexta-noite, fui embora do Sesc.
13:55Nem peguei o leite.
13:56Porque foi uma coisa, você fala assim,
13:57cara, foi tudo tão desagradável, assim.
14:00E todas as pessoas que estavam articulando comigo,
14:02nenhuma tinha filho.
14:03Nem do Sesc, nem internamente.
14:05O único cara que depois veio falar,
14:06que foi o que resolveu tudo, ele falou,
14:08não sei como é que é, eu tenho três filhos.
14:10Aí você fala, nossa,
14:11é um pouco dessa sociedade que também acolhe
14:14os seus pares, os seus iguais.
14:16Independente muito dessa relação de gênero.
14:19Mas era a figura ali, parental,
14:21que conseguiu entender o meu sufoco naquele momento.
14:24Dentro de um lugar ultradesconstruído,
14:26onde todo mundo parece muito mais humanizado.
14:29E ainda teve essa relação.
14:30Depois, quando hoje eu sou mãe e falo sobre mãe,
14:33meus filhos são muito bem-vindos,
14:35porque eu nem pergunto se eles são bem-vindos.
14:36Eu simplesmente, quando preciso, eu trago.
14:38E tá tudo bem, porque as pessoas já sabem da existência deles.
14:40Mas lá naquele começo,
14:42essa existência era incômoda em vários lugares.
14:45Existem muitos estudos que falam sobre o preconceito
14:47que as mulheres se submetem ao ambiente de trabalho
14:51justamente por ser mãe.
14:53Então, é porque as demandas do mercado corporativo,
14:56elas são demandas de performance, de resultado.
14:59Elas são opostas a isso.
15:01Então, imagina, você vai não ir a uma reunião
15:03com um cliente importante, porque seu filho...
15:05Porque tem reunião da escola.
15:07O lugar que eu sinto a maior dificuldade
15:10de conciliar é a coisa da escola.
15:12Então, várias vezes, em trocas de faixa do Karatê,
15:16eu não estava lá.
15:17Então, eu estava numa reunião,
15:18e aí tem sete adultos atrás dele,
15:20pra ele não sentir falta de ninguém,
15:21mas eu não estou lá.
15:22Porque é um dos 500 eventos que a escola faz,
15:25e eu não vou estar.
15:26Então, assim, esse é o momento hoje em dia
15:28onde eu mais tenho que articular,
15:29e eu sinto um bocadinho de ausência minha.
15:32Mas você vê que o ambiente é tipo,
15:34ah, é só mais uma festa.
15:35Seu filho vai ter quantas festas,
15:37né, de escola.
15:38Então, isso é uma dificuldade.
15:39Eu queria falar com vocês justamente
15:41sobre essa culpa.
15:43Como é que vocês lidam com a culpa na maternidade?
15:46Porque acredito que seja inevitável,
15:49de um lado ou de outro,
15:51seja no trabalho, seja em casa,
15:54uma ausência, enfim.
15:55Como que vocês lidam com isso?
15:57A gente tem um acordo na minha relação com a Mel,
16:00que a louça é minha, a culpa é dela.
16:03Então, a gente resolveu muito bem.
16:05Mas brincadeiras à parte,
16:06eu acho que quando a gente também
16:08construiu um pouco a nossa estrutura,
16:11eu nunca imaginei eu sendo a mãe
16:14que fica em casa cuidando do lar.
16:16Eu sempre imaginei a mulher que está fora,
16:18trabalhando, porque essa era a minha realidade.
16:20A Mel ficava muito mais em casa.
16:22E aí, quando ela muda de carreira,
16:24a coisa virou de um jeito
16:25que, de repente, eu estava em casa.
16:27E aí, falando,
16:28cara, eu estou aqui em tempo integral
16:30cuidando disso aqui.
16:31Como é que é essa relação?
16:33Quando que eu vou sair?
16:34Como é que...
16:35Então, eu fui também tentando entender um pouco
16:38como é que era essa nova situação
16:40de estar em casa.
16:41E aí, fui assumindo muito mais.
16:43Até essa...
16:44É legal essa relação da escola,
16:46porque eu vou construindo nessa minha nova,
16:48acho que, profissão,
16:50essas novas demandas.
16:52Então, a escola ocupou um lugar gigantesco.
16:54O meu quarto livro agora é sobre escola.
16:56Então, eu torno também esse problema
16:58meu novo assunto de pesquisa
17:00e minha nova propriedade para falar
17:02sobre escola e famílias LGBT.
17:04Porque é um jeito de você, talvez, lidar
17:07com essa culpa da falta, da ausência.
17:09Você fala, não, então,
17:10isso aqui vai ser o meu novo objetivo.
17:12Mas eu lidei com uma culpa inversa,
17:14que era assim,
17:15putz, eu não trabalho.
17:16Putz, eu não estou trabalhando,
17:17porque minha carreira está lá.
17:18Acontecendo.
17:19Eu era a pessoa que fazia bate e volta
17:21para o interior, viajava o Brasil inteiro.
17:23E, de repente, eu estou em casa.
17:24Isso não é trabalhar, isso não é...
17:26Então, eu me sentia culpada
17:27como uma figura que não está produzindo.
17:29E, por outro lado,
17:30todo mundo no Instagram falando assim,
17:32cara, você tornou a minha maternidade possível.
17:35Nosso, seus livros...
17:36Meu, eu ouvi uma palestra sua,
17:37eu ouvi uma fala...
17:38E eu falando assim, gente,
17:39isso aí nem é trabalho.
17:40Isso aqui eu faço.
17:41Então, eu fui também com muita terapia
17:43entendendo para entender essa minha relação
17:45de culpa de não trabalhar.
17:46Entender que isso é um trabalho.
17:47O meu esposo o tempo inteiro fala,
17:48cara, esse trabalho é o tempo inteiro.
17:50Eu estou lá na Lespe,
17:51falando com o deputado estadual,
17:52fazendo reunião com o vereador,
17:54para conseguir mudar a documentação
17:55no poupatempo.
17:56Isso é um trabalho,
17:57só que é diferente daquilo que eu entendi antes.
18:00Dentro do mercado,
18:01e financeiro e remunerado,
18:03a ideia de trabalho vem com uma remuneração.
18:06Hoje, o meu trabalho vem com reconhecimento.
18:08E aí, é um outro peso
18:10do que pode ser entregue
18:12como uma ação de trabalho.
18:14Sim, é tudo muito novo, na verdade.
18:17E eu te ouvindo,
18:18eu pensando em mim,
18:19que não tem nada a ver com maternidade,
18:21mas pensando o quanto eu me cobro também
18:23de não estou fazendo nada,
18:25mas no fim estou produzindo muito
18:27e é um outro lugar de produção.
18:29Mas e você, Dé,
18:30a questão da culpa,
18:31como que você lida?
18:32Você tem culpas?
18:33Como que ameniza isso?
18:35Gente, eu sou uma péssima mãe,
18:36porque eu também não tenho culpa.
18:38Meu porpério foi tranquilo.
18:39Tchau, gente.
18:40Era isso mesmo.
18:41Valeu.
18:42O meu porpério foi tranquilo
18:43porque eu acredito,
18:44mas isso é uma construção de alguns anos,
18:46eu acredito que a culpa
18:47faz parte de uma necessidade
18:49que a sociedade colocou na gente
18:50da gente ser perfeita em tudo.
18:52Então, você tem que ser boa mãe,
18:53você tem que ser boa amante,
18:54você tem que ser gostosa,
18:55você tem que ser inteligente,
18:56você tem que se divertir,
18:57você tem que fazer tudo ao mesmo tempo
18:58e dar conta de tudo.
18:59Como eu tenho plena certeza
19:00de que eu faço tudo meia boca,
19:02às vezes algum repórter pergunta,
19:03como é que você faz tudo?
19:04Como é que você dá conta?
19:05Eu falo, faço tudo cagado,
19:06faço tudo do jeito que não faz.
19:08Cara, mas quando eu digo isso,
19:10não é que eu faço mal feito,
19:11mas não faça com aquela pressão
19:13de fazer tudo perfeito.
19:15Não vai sair tudo perfeito.
19:17E eu acho que a culpa vem desse lugar,
19:18de tentar suprir esse lugar de perfeição.
19:20Eu sou a mãe que dá, sabe?
19:22Eu sou a mãe possível para o meu filho.
19:24Desde que ele nasceu,
19:25a gente sempre teve um papo reto,
19:26fala, Carol,
19:27isso aqui é o que dá para eu fazer
19:28e pode ter certeza
19:29que eu estou fazendo o melhor que eu posso.
19:31Mas eu não tenho pretensão grande
19:33de ser uma mãe que dá conta de tudo,
19:35que faz tudo.
19:36Então, várias vezes,
19:37outras pessoas fazem coisas por ele
19:39que não são como eu faria,
19:41não são perfeitos.
19:42E mesmo assim, ele vai.
19:43Tem dias que ele vai para a escola
19:44todo descabelado.
19:45Em qualquer outra situação,
19:46eu falarei, meu Deus.
19:47Ele vai falar, tudo bem,
19:48não fui eu que mandei,
19:49foi o outro,
19:50mas vai descabelado.
19:51É um exemplo muito simples,
19:52mas disso,
19:53acho que a culpa vem desse lugar
19:54de que a gente precisa ser perfeito em tudo.
19:56A gente precisa ser impecável,
19:57precisa entregar tudo com muita perfeição.
20:00E eu faço um exercício diário
20:02de não achar que eu tenho que fazer tudo com perfeição.
20:05Então, isso alivia muito a minha culpa
20:07com relação ao José.
20:08E um papo muito...
20:09Eu vejo o José como uma pessoa,
20:11como um indivíduo
20:12que não é parte de mim.
20:13Ele nasceu de mim,
20:15mas ele não é um pedaço meu.
20:17Então, a gente tem trocas muito tete-a-tete,
20:20muito...
20:21Falar, meu filho,
20:22agora você vai ficar frustrado
20:23porque vai acontecer isso, isso e isso,
20:25não vai ser do jeito que você quer
20:26e aí lide com isso.
20:27E aí, agora eu falo,
20:28filho, eu estou frustrada.
20:29Eu queria fazer isso desse jeito,
20:31então, a gente tem um papo muito aberto.
20:33E aí, com isso,
20:34eu tento trabalhar a culpa.
20:36Eu não sou das mães mais culpadas, não.
20:38Não, eu acho muito interessante
20:40você trazer essa perspectiva
20:42porque acho que para todas as mulheres
20:44existe esse peso da perfeição
20:47quando a gente fala de mulheres negras.
20:49E você tocou num ponto
20:51sobre o cabelo, assim,
20:53que foi um exemplo hipotético,
20:55mas foi descabelado, mas foi.
20:58Só que isso,
20:59quando a gente fala de pessoas negras,
21:01não é exatamente foi descabelado,
21:03mas foi, né?
21:04Então, eu queria que você falasse um pouco
21:06sobre como é criar um filho negro
21:09nessa sociedade que a gente tem
21:11que é extremamente racista, enfim.
21:13Eita!
21:14Mas ela está falando sobre escola, né?
21:16A José estuda num colégio particular,
21:18num colégio internacional,
21:20que ele é provavelmente,
21:21deve ter, no máximo,
21:23três, duas ou três crianças negras.
21:25Então, ele ir descabelado
21:27também não é só ele descabelado
21:29porque, provavelmente,
21:30o cabelo dele sempre será o foco.
21:32Então, eu, com Criando Crianças Pretas,
21:35aprendi que muitas das nossas mães
21:38contaram para a gente
21:39que a gente tinha que ser duas,
21:40três vezes melhor
21:41porque era a forma delas de dizer
21:42que a gente tinha que lidar com o racismo.
21:44Se a gente não fosse melhor do que eles,
21:46a gente não ia competir de igualdade
21:48com essa galera.
21:49Então, e a pele russa,
21:51não sei você,
21:52mas a minha mãe nunca me deixou ir para aquela.
21:54Sabe aquela pele russa?
21:55Não.
21:56Quando você é negro,
21:57que você está com a pele,
21:58não passou creme,
21:59se você risca, assim,
22:00ele fica branco.
22:01E a minha mãe fazia esse teste
22:02antes de ir para a escola.
22:03Pegava o braço da gente e riscava
22:05para ver se você...
22:06Não podia ir russa para a escola,
22:07tinha que ir hidratado.
22:08Então, eu ia besuntado,
22:09com o cabelo desenvarecendo,
22:11esticado,
22:12porque você tinha que estar impecável, né?
22:14Para te darem menos chance de fazer...
22:16de você sofrer racismo com aquilo.
22:18Então, isso é uma preocupação constante
22:20na minha relação com o José,
22:22de não fazer ele virar esse...
22:24essa expectativa de perfeição.
22:27Então, eu ainda tenho cuidado,
22:29ainda tenho muito medo.
22:30Eu vou para a escola e digo para a escola,
22:31olha, vocês vão ter que aprender
22:33a lidar com o menino negro,
22:34é diferente, não sei o que, sabe?
22:36Faça esse papel com a escola,
22:37mas não deixe na pressão dele
22:39de ser duas vezes melhor,
22:40nem impecavelmente...
22:42Porque não é...
22:43A camisa do outro amigo está toda suja,
22:44toda cagada,
22:45ninguém falou nada.
22:46Mas eu fico sempre muito presa.
22:48Então, assim, é um exercício constante.
22:50Não, eu fico até emocionada,
22:51porque é isso,
22:52eu também fui criada nesse lugar
22:53da perfeição e tudo mais.
22:55E é muito importante
22:57que as crianças que estão vindo agora
22:59tenham uma outra narrativa de vida, né?
23:02Que seja mais leve.
23:03Porque é isso,
23:04inevitavelmente elas vão encontrar
23:07obstáculos no caminho, assim, né?
23:09Não tem como,
23:10mas que isso não seja uma questão,
23:12sua aparência seja uma coisa a menos, né?
23:15Que você fique...
23:16O que eu tento fazer com o José
23:17é deixar isso mais com os outros
23:19do que com ele.
23:20Então, eu vou na escola
23:21e na escola eu falo,
23:22não, admito que falem do cabelo dele.
23:24Para os pais eu falo,
23:25vocês vão ter que aprender que isso...
23:26E para ele, não.
23:27Para ele eu falo,
23:28vai de qualquer jeito.
23:29Então, eu tento deixar mais leve para ele.
23:31Sim, lindo.
23:32Mas é difícil, eu fico...
23:33Não, imagino.
23:34É.
23:35Aí eu creio no cotovelo.
23:36Mas faz toda a diferença, de fato.
23:38Faz toda a diferença.
23:39Agora, eu acho que deve ser muito importante
23:41conversar com outras mães, né?
23:44Para entender, assim,
23:46para onde você está indo,
23:47onde eu estou indo, enfim.
23:49Mas tem como conversar sem se comparar?
23:52Olha, é difícil.
23:54Porque acho que junto com a culpa
23:56vem a tal da comparação, né?
23:57A grama do outro é sempre mais verde
23:59porque você está vendo de cima.
24:01Então, a coisa da comparação
24:03entre as maternidades,
24:04ela é muito comum.
24:06Eu tenho uma amiga que é enfermeira já,
24:08que ela tinha três filhos
24:10quando eu tinha só o José
24:11e ela falava assim para mim,
24:12venha do futuro para te dizer.
24:14E era um alívio muito grande no lugar do...
24:16Eu lembro de me apavorar muito com as febres.
24:19A febre era um negócio que parecia
24:20que o mundo ia acabar.
24:21E ela falou, gata,
24:22venha do futuro para te dizer
24:23que será uma por mês.
24:26E que é diferente a febre de uma criança,
24:28de um adulto,
24:29são dois corpos diferentes e tal.
24:31Então, esse tipo de coisa
24:33de quem já passou pelo lugar
24:35me dava um alívio até hoje,
24:36muito grande.
24:37O José tem seis anos também,
24:38vai fazer sete.
24:39Então, me dá um alívio muito grande
24:41de saber as histórias
24:42do caminho que eu vou percorrer.
24:44Mas para mim, de novo,
24:45entrar naquele lugar,
24:46quando é comparativo,
24:47só não pode ser comparativo
24:48de uma competição,
24:49de você tentar ser essa mãe perfeita,
24:52essa mãe melhor.
24:53Eu vejo muito isso
24:54no universo corporativo,
24:55que é quem equilibra melhor
24:57a carreira com a maternidade,
24:59quem dá o relato
25:00de que está conseguindo equilibrar.
25:02Eu acho isso de uma maluquice
25:03tão grande.
25:04Primeiro que eu tenho pavor
25:05de equilíbrio,
25:06porque para alguma coisa
25:07estar equilibrada,
25:08as duas outras pontas
25:09têm que estar em uma tensão.
25:10Então, não vivo no equilíbrio,
25:11vivo num completo surto.
25:12Às vezes, uma está lá embaixo,
25:14a gangorra está lá embaixo,
25:15às vezes ela está lá em cima.
25:17Mas é isso,
25:18você tentar manter essa pressão
25:19para manter o equilíbrio
25:21é uma coisa que eu vejo
25:22as mulheres fazendo
25:23no mercado de trabalho,
25:24de tentar manter tudo organizado
25:26o tempo todo.
25:27Eu tento...
25:28É isso,
25:29eu deixo fluídas as coisas,
25:30deixo as coisas indo
25:31e tento entender
25:32que a minha única comparação
25:33é comigo mesma.
25:34Sim.
25:35Pô, esse é um assunto
25:36da nossa história, né?
25:37Porque já somos duas mães.
25:38Então, a gente já tem
25:40a comparação direta
25:41desde o dia 1,
25:43quando eles nasceram,
25:45na sala de parto,
25:47foi cada um para um colo,
25:48para um peito,
25:49eu consegui amamentar
25:50porque eu já estava
25:51tirando leite há meses.
25:52A Mel ainda não tinha
25:53descido o leite,
25:54não tinha um colostrum.
25:55O peito dela estava gigante,
25:56o mamilo gigante,
25:57as crianças conseguiam abocanhar.
25:58Então, já tinha essa coisa de
26:00você está conseguindo amamentar,
26:01eu não estou conseguindo.
26:02Aí, uma época,
26:03a Yolanda desmamou
26:04do peito da Mel,
26:05já com 5, 6 meses
26:06e continuou mamando no meu.
26:07Então, ficava...
26:08Aí a Mel foi trabalhar fora
26:09e eu fiquei dentro de casa.
26:11Então, tinha esse lugar...
26:12A gente está o tempo inteiro,
26:13isso é um assunto
26:14que a gente pensa
26:15antes deles nascerem
26:17e outra que a gente pensa
26:19é a comparação entre eles, né?
26:20Eles são gêmeos.
26:21E aí, a gente fica nesse
26:22de falar,
26:23putz, mas ele já está andando,
26:24ela ainda será que tem...
26:25Não, mas ela já, não sei o que...
26:27E aí, tem uma comparação
26:28de gênero lá também, né?
26:29Ele é menino, ela é menina.
26:30Então, acho que esse é um assunto
26:32que vai...
26:33Até a pediatra,
26:34quando a gente tinha uns 7 meses
26:35a pediatra falou,
26:36olha, é muito importante
26:37que a gente faça
26:38a consulta separado.
26:39Eles são gêmeos, são irmãos,
26:40mas nem tudo é só sobre eles,
26:42só sobre ela,
26:43só sobre os dois.
26:44Então, vou pedir
26:45para a galera da secretaria
26:46ficar com um
26:47enquanto a gente atende o outro.
26:48Ficou 40 minutos com a Yolanda
26:49enquanto a gente atende o Bernardo.
26:50E depois, trocou.
26:51E ela falou, cara,
26:52meninas, daqui pra frente,
26:53é muito importante individualidade.
26:55Às vezes, o passeio só com um,
26:57às vezes, o estar só com o outro,
26:59de conseguir,
27:00porque senão, fica o tempo inteiro
27:01essa comparação de,
27:02olha, sua irmã está super quieta
27:03e você está não sei o que.
27:04Olha, o seu irmão já conseguiu
27:05um negócio em rodinha na bicicleta,
27:07e você tem que correr atrás.
27:08Então, a gente conseguiu entender,
27:10mas porque esse é o assunto,
27:12talvez, de antes eles nascerem,
27:14era os critérios de comparação.
27:16Sim, completamente.
27:17Agora, para finalizar,
27:18para finalizar essa conversa,
27:20eu queria saber se vocês tinham algum ideal
27:24sobre ser mãe,
27:26que vocês foram desconstruindo
27:28ao longo da maternidade?
27:30Cara, eu sempre gosto de falar sobre isso,
27:34que a minha luta até hoje
27:36é ser chamada de mãe, né?
27:38Então, eu não me sinto nem capaz ainda
27:40de ter desconstruído qualquer coisa,
27:41porque o meu maior medo lá,
27:43desde quando eles nasceram,
27:44que a diretora do hospital,
27:46São Luiz, disse,
27:47não, você não vai amamentar essas crianças,
27:50porque eles já têm uma mãe.
27:51E aí, eu tive que entrar com toda a equipe médica
27:54para lutar para isso.
27:55Quando ele foi fazer,
27:56o rapaz que entrou para fazer a DNV
27:58e perguntou, quem é mãe e quem é o pai?
28:00Porque só tem em campo pai e mãe.
28:01Eu entrei como pai.
28:02Quando eu fui fazer a certidão de nascimento,
28:04que está lá como filiação,
28:05mas no sistema eu sou pai.
28:07Dentro do RG eu sou pai.
28:08A Receita Federal eu não sou mãe.
28:10Então, são tantas as lutas
28:12que para mim ainda não é nem desconstruir
28:14o que eu achei.
28:15Eu já achava lá que ia ser uma luta intensa
28:17para ser mãe.
28:18O que eu vejo é que a minha família
28:20valida a minha maternidade
28:22desde o segundo que a Mel disse estou grávida.
28:25Mas que para todo o resto,
28:27burocrático e sistêmico,
28:28ainda é um exercício de ser mãe.
28:30Talvez a gente comece lá,
28:31quando você falou, né?
28:32Talvez algum dia eu não precise
28:33falar sobre a diversidade.
28:35Talvez algum dia eu não precise
28:36afirmar para o mundo que eu sou mãe.
28:38Aí, talvez eu volte aqui para você
28:40e falar sobre a desconstrução.
28:41Sim.
28:42Espero que logo.
28:43Vamos ver.
28:45Espero que logo.
28:46Está acontecendo.
28:47Sim.
28:48Cara, o meu contrário,
28:50nós mulheres negras somos mãe do mundo, né?
28:53A gente materna o mundo.
28:55Então, tem a mãe até nas religiões,
28:58tem a mãe que você conhece,
29:00uma senhora muito próxima de você
29:02que cozinhava.
29:03Então, assim,
29:04eu acho que desconstruir esse estereótipo,
29:06maternar, para mim,
29:08sempre foi intencional.
29:10Então, a escolha de criar o José
29:12coletivamente com a minha família,
29:14com os meus pais, com a minha irmã,
29:16eu sempre fiz um esforço muito grande
29:18para não ter aquela criança que,
29:20ai, ele só dorme com a mãe.
29:22Ai, ele só come com a mãe.
29:23Ai, ele só...
29:24Muito pelo contrário.
29:25Então, semana retrasada,
29:27o José foi viajar com a minha irmã
29:29e ela me mandou um vídeo, José,
29:30no meio do mar.
29:31De que mar?
29:32Eu não faço a mínima ideia.
29:33Ele estava nadando com o meu cunhado
29:35no meio do mar
29:36e o meu marido ficou meio tenso assim.
29:39Eu falei, cara, deixa aí.
29:41Então, eu faço um exercício constante
29:43de não querer mostrar para ele
29:45que eu sou, sabe,
29:47a mãe do mundo.
29:49Eu não sou a mãe do mundo.
29:50Eu não sou escudo do mundo.
29:52Então, o meu exercício é o contrário.
29:55É de não tentar fazer este papel
29:57de quem aguenta tudo.
29:58Então, para o José,
29:59eu mostro todas as minhas vulnerabilidades,
30:01mostro todos os meus defeitos
30:03para ele entender que eu sou uma mulher
30:04como outra qualquer,
30:06para ele não prospectar em mim
30:08essa imagem,
30:09para que ele não veja
30:10nas outras mulheres negras
30:11que ele se relaciona
30:13esse mesmo lugar dessa mãe
30:15que eu sinto muitas vezes
30:16o mundo olhando para mim.
30:17Na carreira, principalmente.
30:19Muitas das vezes,
30:20o meu modo de gestão é julgado
30:22porque não é um modo de gerir
30:25como uma mãe.
30:26Eu não sou mãe de ninguém.
30:27Eu não sou parte da família de ninguém.
30:29Eu não sou responsável por ninguém.
30:31E é muito engraçado
30:32como muitas das vezes na carreira
30:33as pessoas me cobram.
30:34A gente teve essa conversa.
30:35A gente gravou o Corre Delas
30:36e falou exatamente sobre isso.
30:38Então, as pessoas acham muito estranho
30:40o meu jeito de gerir
30:41que não é maternal.
30:43Então, eu faço intencionalmente
30:44esse esforço de não parecer
30:46essa mãezona para ele
30:48para que ele não projete isso
30:49em nenhuma outra mulher negra.
30:52Ele faz isso com o pai dele,
30:53que é branco.
30:54Ah, eu deixo tranquilo.
30:55Seu pai resolve.
30:56Aí, esses dias,
30:57ele estava montando um negócio
30:58e ele falou assim,
30:59a mamãe gosta de descansar.
31:00Eu falei, isso!
31:01A mamãe ama descansar.
31:02Vai lá com o teu pai.
31:03Ah, ele que lute.
31:04Perfeito.
31:05Meninas, foi um prazer
31:06ouvir vocês.
31:07Obrigada pela disponibilidade
31:09em compartilhar
31:10uma vida tão íntima.
31:12Porque falar sobre maternidade
31:14é falar sobre intimidade.
31:15Obrigada.
31:16Imagina, obrigada a você.
31:17Obrigada a você.
31:18Obrigada a você.
31:19Obrigada a você, mana.
31:20Dois, né?
31:21Três?
31:22Agora a gente não tem filme.
31:23Ah, eu tinha esquecido.
31:24Desculpa.
31:33Antes do futuro promissor
31:35das nossas crianças,
31:36é preciso pensar
31:37quais são as condições
31:39dessas mães
31:40para criar seus filhos
31:41da melhor forma possível.
31:43Que a conversa de hoje
31:44te ajude a enfrentar
31:45os desafios da maternidade
31:47ou se aliar em prol do assunto.

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