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Transcrição
00:00Um chip de cristal em 5D pode, num futuro distante, salvar a humanidade da extinção.
00:09Essa manchete pombou em nosso site e a gente repercute esse e outros assuntos agora, na coluna Olhar do Amanhã.
00:30Para isso, vamos receber doutor Álvaro Machado Dias aqui nos estúdios do Olhar Digital para bater um papo com a gente sobre esse e outros assuntos da semana também.
00:43Olá, boa noite, doutor Álvaro Machado Dias. Bem-vindo.
00:48Obrigado. Boa noite, Marisa.
00:50Doutor Álvaro, vamos começar falando sobre essa notícia, não é?
00:54Cientistas da Universidade de Southampton, no Reino Unido, complementaram, aliás, completaram a transferência do genoma humano em um cristal de memória 5D.
01:07A ideia aqui é, daqui a algum tempo, ter essas informações preservadas em caso de extinção humana.
01:14A pergunta é como que funciona essa tecnologia. E mais, há algo de revolucionário nisso, doutor Álvaro?
01:21Pois é, né? Que raios é 5D? A gente entende 3D e até 4D, porque a gente fala assim, ah, tá, eu tenho uma estrutura tridimensional e o tempo.
01:37É até bonito, né? Tem uma coisa poética nisso. Mas 5D, eu vou dizer para você que esse 5D é bem menos complexo do que parece.
01:48O que acontece é o seguinte, esse é um repositório, uma estruturazinha física, que é baseada em quartzo, que é o material, perdão, mineral, mais resistente conhecido.
02:06E esse quartzo, ele é fatiado, por assim dizer. Não é exatamente isso, tem um processo de deposição específico.
02:12Para a gente é como se ele fosse fatiado. E o que acontece é que a leitura dessa informação, que no caso é do genoma humano, ela é feita com luz.
02:25E olha que interessante, a maneira como esse cristal é manipulado, é construído, faz com que a frequência de onda dessa luz, ou seja, que tipo de luz e a intensidade da luz determinem aquilo que é lido no cristal.
02:48Então, de onde vem esse negócio de 5D? Uma estrutura tridimensional e dois parâmetros de leitura, que estão na própria luz.
03:03Então é a soma desses parâmetros, que são a frequência de onda e a intensidade da luz.
03:08Você põe mais intensidade, é como se você visse uma cor diferente.
03:11Ele tem uma ilusãozinha ótica, portanto.
03:15E assim vai. Também você muda, por exemplo, de 550 nanômetros, é muito próximo do infravermelho, é um vermelhinho assim.
03:24Você sobe um pouco essa frequência e aí você vai chegando em sentido ao azul, que é em termos de 990 nanômetros, se eu não me engano.
03:33Essa mudança faz com que a informação revelada seja diferente.
03:37Qual é a vantagem disso daí?
03:39Se na modulação da luz eu revelo informação diferente, eu posso botar muito mais informação e depois usar justamente a luz para fazer essa leitura.
03:51Então o negócio é que é algo muito pequenininho.
03:56E como, afinal de contas, o genoma humano entra nisso?
04:00O que é que acontece? Alguém foi lá, pegou células, botou lá dentro?
04:04Não, não funciona assim.
04:05A lógica é que a leitura do genoma humano vai gerar uma espécie de receitinha.
04:14O que é engraçado a gente pensar, como que pode existir uma receita, igual uma receita de bolo, de mim mesmo, de você.
04:22Pois é, quando as vacinas de RNA foram desenvolvidas durante a pandemia, muita gente se perguntou isso e a gente aqui no Olhar Digital explicou.
04:33É assim mesmo.
04:35Então, essa informação do genoma específico, de pessoas específicas, está armazenada nesse cristal bem pequenininho,
04:44que por ser do material mais resistente conhecido, ele acaba durando muito.
04:49Supostamente bilhões de anos, porque é resistente à temperatura, à fricção, a impactos, etc.
04:56Essa que é a ideia.
05:01Curiosíssimo e muito interessante.
05:03Não, doutora Alvaro?
05:04Agora, até esse tema nos leva a uma outra questão e nos induz a falar sobre biocomputação.
05:12Vamos lá.
05:13Quando pensamos em computadores, pessoal, nós pensamos em algo totalmente artificial, não é?
05:18Mas já existe um campo da ciência que é voltado para, digamos, misturar computação e biologia,
05:26se é que dá para explicar mais ou menos assim.
05:29Então, doutor Alvaro, explica para a gente em detalhes o que significa essa, digamos, mistura.
05:35Pois é, né?
05:37Se a gente parar para ver, o que o genoma faz é servir de receita, portanto,
05:45trazer instruções para a construção de um organismo.
05:51O que significa que o processo de construção, o desenvolvimento de um organismo,
05:59tem algo meio computacional mesmo.
06:01porque aquilo vai sendo lido, é como se aquele programinha fosse sendo lido,
06:07e aí as proteínas vão sendo sintetizadas e a estrutura do organismo vai surgindo.
06:14Interessante a gente olhar lá no nível mais fundamental como a natureza, por assim dizer,
06:19ela usa princípios programáticos.
06:22Pois bem, existe uma outra esfera em que isso está acontecendo,
06:27e ela envolve organelas.
06:30O que é isso?
06:31Imagina que eu fui e peguei um pouco de tecido cerebral,
06:36então aqui eu peguei neurônios,
06:39eu peguei também astrócitos,
06:41que são células que originalmente a gente achava que serviam só para sustentação,
06:46e hoje a gente sabe que elas têm um papel muito importante na própria computação biológica.
06:51Então eu peguei um pouquinho disso aí e coloquei num pratinho,
06:54que é chamado pratinho de Petri, e ali eu fiz uma cultura,
06:59que quer dizer, eu mantive condições ideais para que esses neurônios e essa estrutura toda que está em torno dele com os astrócitos,
07:10e na verdade tinha uma outra coisinha que chamou ligodentrócitos, se mantivesse vivo.
07:14Beleza.
07:15Aí, olha só que interessante.
07:18Como a gente faz com a inteligência artificial?
07:21Ela tem uma recompensa, não é assim?
07:23O algoritmo é treinado para ir numa direção.
07:27Como funciona no cérebro humano?
07:29Um dos neurotransmissores mais importantes para a recompensa é a dopamina.
07:33Então imagina que ao invés de eu treinar um algoritmo que é elétrico,
07:39igual a gente faz com IAS, com qualquer uma, tanto do tipo chat GPT quanto aquelas antigas,
07:45eu vou liberar um pouquinho de dopamina toda vez que o algoritmo fizer a coisa que eu quero,
07:51sendo que o algoritmo é exatamente o processamento que está acontecendo dentro desses neurônios de verdade.
07:58Ou seja, no final das contas, eu tenho uma estrutura que é totalmente de laboratório,
08:04com coisa viva, com dopamina,
08:08só que o que eu estou fazendo ali é modelar processamento computacional típico de um algoritmo de linguagem,
08:14ou de um algoritmo decisório, enfim, de uma IA qualquer.
08:18Parece muito maluco, mas tem uma explicação, tem uma razão de ser.
08:23A razão de ser é que o nosso cérebro, que é muito mais poderoso que qualquer IA jamais surgido até hoje,
08:31talvez um dia a gente seja superado, mas essa é a realidade em contexto,
08:36ele usa a energia de uma lâmpada.
08:39Olha que interessante.
08:41Enquanto quando a gente vê um desses grandes LLMs,
08:45grandes modelos de linguagem do tipo CLODE, chat EPT, deep sick,
08:49a energia consumida é monstruosa,
08:54que dá para iluminar cidades inteiras.
08:58Então existe uma diferença muito grande na capacidade de fazer bom uso da energia,
09:05o que do ponto de vista da engenharia elétrica é chamada de eficiência.
09:09É nesse sentido de eficiência, não é eficiência geral, é essa eficiência.
09:14E por que essa eficiência é importante?
09:15Não é só por uma questão de custo.
09:17É porque se eu consigo ter muito mais eficiência,
09:21eu consigo empacotar estruturas muito maiores.
09:23Então a tese do pessoal que está buscando desenvolver processadores biológicos
09:31é que se der certo de verdade,
09:35eles podem ser muito mais poderosos do que esses sintéticos,
09:40esses feitos na placa de silício.
09:43O paralelo aqui é com a computação quântica.
09:47Ela está engatinhando, o negócio não dá muito certo.
09:49Mas se der certo, e vai dar certo,
09:53do ponto de vista de capacidade computacional,
09:55a gente está falando de algo muito maior.
09:57Era justamente isso que eu ia perguntar.
09:59O propósito desses organóides,
10:02dessas pesquisas todas, desses organóides.
10:04Agora, falando que existe algo orgânico junto a uma computação,
10:10existe algum risco ou alguma possibilidade
10:14desses organóides desenvolverem alguma espécie de consciência,
10:19ainda que muito rudimentar, doutor Álvaro?
10:22Olha, essa é uma discussão,
10:24consciência eu não diria que é a grande questão,
10:26mas senescência, sentir alguma coisa.
10:29De fato, quando a gente põe uma estrutura viva,
10:32se ela vai ganhando complexidade,
10:35e ela está ali, por exemplo, eu tenho ali alguma coisa
10:39que vai além só de neurônios conectados,
10:43eu tenho uma estrutura que tem um sistema nervoso inteiro,
10:47eu posso argumentar que é possível implementar,
10:52por assim dizer, um correlato da dor.
10:55E aí, efetivamente, uma coisa como essa pode sentir dor.
10:59Agora, a dor, ela vem naturalmente,
11:02é só eu criar isso que vai existir dor e consciência?
11:08Não, de forma alguma.
11:09Porque, por exemplo, no caso da dor,
11:12existem transmissores muito específicos,
11:15existem receptores específicos,
11:17chamados nocio-receptores.
11:19Então, você tem uma maneira de funcionar muito própria
11:22no sistema nervoso para a produção de dor.
11:24E a mesma coisa para a consciência e tudo mais.
11:27Agora, é impossível imaginar um futuro
11:30em que essas culturas laboratoriais de tecidos biológicos
11:36gerem organismos inteiros,
11:39uma coisa que é meio chamada de quimera,
11:41uma coisa meio esquisita,
11:44meio à la Frankenstein.
11:47Não, não é impossível pensar isso.
11:49Há plausibilidade, sim.
11:51Muito maior do que a do chat de EPT
11:53adquirir consciência, por exemplo.
11:54Porque aqui a gente está falando
11:55de um negócio que já está vivo.
11:56É curioso.
11:59Agora, doutor Álvaro,
12:01você acredita que a gente vá ver
12:03esses computadores biológicos integrados
12:06ao dia a dia nosso,
12:08do nosso cotidiano, ainda nesse século?
12:11Ou não é uma coisa restrita ainda
12:12ao campo da ciência?
12:15Não, acredito totalmente.
12:17E não acho que o horizonte é secular, não.
12:21Me parece, para mim está bem claro,
12:23que uma linha específica chamada
12:26computação neuromórfica,
12:28que usa neurônios de verdade,
12:30tanto para fazer o processamento,
12:33quanto para modelar correlatos sintéticos,
12:37ou seja, eu quero usar o neurônio
12:38pelo menos até o momento que eu consiga
12:40desenvolver alguma coisa em paralelo
12:42que não seja neuronal, que seja sintética,
12:44mas que envolva uma lógica de transmissão
12:46com neurotransmissores.
12:47Poxa, isso daí tem, assim,
12:51eu acho que tem uma janela para explodir
12:53de menos de 10 anos, tá?
12:55Eu não acho, inclusive,
12:58que essa área está menos desenvolvida
13:01do que a computação quântica.
13:03Eu acho que ela está mais desenvolvida.
13:05E o computador quântico,
13:06a gente espera que no começo da década que vem
13:08esteja trazendo, assim,
13:10grandes transformações societárias.
13:13Isso daqui, a respeito de serem pesquisas
13:16mais antigas, estarem mais bem desenvolvidas,
13:18eu acho que não vai produzir
13:22um impacto do tamanho da computação quântica,
13:25mas vai sim trazer diferença,
13:27vai mudar a maneira como a gente
13:29entende o processamento de informação
13:31e isso não toma nem uma década,
13:34de forma alguma.
13:36Bom, vamos acompanhar.
13:38Agora, doutor Alvaro,
13:38antes de encerrar o nosso quadro,
13:40eu queria aproveitar a sua presença
13:42para tocar num assunto que nós abrimos
13:44o boletim de hoje,
13:45falando sobre a votação
13:46da responsabilidade das redes sociais.
13:50Nós falamos até na abertura do programa
13:53que eles encerraram, sim, a votação,
13:55mas que tem alguns pontos a serem levados
13:57em consideração.
13:59Qual a sua opinião?
14:00Como você imagina o resultado
14:02dessa votação, desse julgamento
14:04da responsabilização das redes sociais, doutor Alvaro?
14:07Semana passada a gente esteve aqui
14:09discutindo isso em bastante profundidade
14:11e eu fiz a minha aposta.
14:13Eu falei, o artigo 19 vai ser considerado
14:17inconstitucional, do marco civil da internet.
14:21E dito e feito, já há maioria formada
14:24em sentido à inconstitucionalidade do artigo
14:28e o que segue agora é a discussão
14:31sobre os detalhes e sobre como vai ser
14:35esse novo arranjo.
14:36Eu acredito, eu continuo acreditando
14:39naquilo que a gente conversou semana passada.
14:42Eu acho que a posição do Barroso
14:43vai acabar sendo a posição dominante.
14:46Ela é uma posição que diz
14:47as redes sociais são responsáveis
14:52pelos conteúdos dos usuários
14:56quando esses conteúdos...
14:59E ela precisa tirar do ar,
15:00mesmo sem mandato judicial.
15:02Quando esses conteúdos são fake news,
15:05quando eles estão impulsionados,
15:08mas há uma ressalva em relação
15:11aos chamados crimes contra a honra.
15:12Ou seja, uma pessoa está falando mal da outra,
15:14aí não.
15:15Aí a discussão é muito mais subjetiva,
15:19ou vamos dizer assim,
15:20muito mais incerta, na verdade.
15:22E nesses casos,
15:23acredito que será necessário
15:25o mandato judicial
15:26para derrubar o conteúdo.
15:28Tirando isso,
15:29aquele clássico em que você tem
15:31o Drauzio Varela vendendo medicamentos,
15:34que são falsos,
15:36ou um padre pedindo dinheiro
15:40para uma causa que, no fundo,
15:42ele não apoia, etc.
15:43Esses conteúdos serão considerados
15:48como responsabilidade das redes também.
15:52O que necessariamente não significa
15:54que o autor vai ser isento.
15:57Vale lembrar que o estelionato
15:59é crime independentemente desse debate.
16:02Mas é bem provável,
16:05eu diria assim,
16:06está quase certo
16:06que esse vai ser o encaminhamento.
16:09O que eu falei semana passada
16:11e para mim permanece
16:12é que isso tem um aspecto muito positivo
16:15do ponto de vista de combate
16:17às fake news,
16:18mas também se a gente pensar
16:20que as redes sociais
16:21são de empresas
16:22totalmente racionalistas,
16:26isso pode tornar também
16:27a fluidez do uso das redes
16:30mais baixa,
16:32porque, afinal de contas,
16:32qualquer coisa que você colocar ali
16:34pode acabar presa
16:36na heurística do filtro
16:38que, em última análise,
16:40agora vai subir bastante
16:41o seu critério de entrada
16:42para evitar
16:43que a empresa seja processada.
16:46Pois é,
16:47vamos aguardar
16:48essa finalização,
16:49esse consenso
16:50que deve, sim,
16:52acontecer nos próximos dias.
16:53Dr. Álvaro,
16:54mais uma vez,
16:55muitíssimo obrigada.
16:56Uma excelente participação
16:57com um tema interessantíssimo.
17:00Bom, semana que vem
17:01voltamos com o Olhar do Amanhã.
17:03Muito obrigada
17:04e uma excelente semana.
17:06Eu que agradeço
17:07e até lá.
17:08Até.
17:08Um beijo.
17:10Beijo.
17:11É isso aí, pessoal.
17:12Mais um Olhar do Amanhã
17:13com o Dr. Álvaro Machado Dias,
17:16que é neurocientista,
17:17futurista e colunista
17:18do Olhar Digital News.
17:21Semana que vem,
17:22quarta-feira,
17:23estaremos de volta
17:24com o Dr. Álvaro
17:25em mais um Quadro Olhar
17:26do Amanhã
17:27para vocês.
17:28Obrigado.

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