Entrevista exclusiva ao Jornal da Manhã, o professor de direito internacional da PUC, Cláudio Finkelstein, debate os possíveis impactos diplomáticos entre Brasil e Estados Unidos após a operação da Polícia Federal contra Jair Bolsonaro (PL-RJ).
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00:00A operação contra o ex-presidente Jair Bolsonaro, que resultou nas medidas cautelares impostas pelo Supremo Tribunal Federal,
00:06pode impactar a relação já bastante conturbada entre o Brasil e o governo americano de Donald Trump.
00:12Para falar um pouco sobre essa camada, nós recebemos agora o professor de Direito Internacional e Econômico da USP,
00:19Cláudio Finkelstein, ou Finkelstein, professor. Só me atualize para a gente não cometer nenhum erro por aqui.
00:26É Finkelstein, é da PUC, não da USP.
00:28Opa, perdão. Professor da PUC, Cláudio Finkelstein.
00:32Professor, eu gostaria que o senhor trouxesse a sua análise sobre essa situação que mistura decisões judiciais aqui no Brasil
00:40com questões políticas e que interferem em relações econômicas e que podem prejudicar muitos dos negócios brasileiros
00:48a partir da decisão de um presidente norte-americano.
00:53Que saída que o senhor vê ou que desfecho o senhor vê para essa história?
00:57Bom dia.
00:58Bom dia. Bom dia a você e a todos os nossos ouvintes.
01:03É uma situação estranha, é algo novo, é algo que em todos os meus anos de estudo da matéria eu nunca encontrei.
01:13Essa ingerência de política com a esfera jurídica é algo completamente, realmente novo no cenário internacional.
01:24O que os países que estão lidando melhor fazem é negociar, é sentar, infelizmente mostrar uma humildade que o nosso governo não tem mostrado,
01:38é aceitar esse bullying.
01:40Porque se você pensar que a China, que sofreu as maiores sanções, já sentou e já negociou com os Estados Unidos,
01:50a Inglaterra já negociou com os Estados Unidos, nosso vizinho Argentina está prestes a firmar um acordo excepcional com os Estados Unidos,
01:59é reconhecer a superioridade norte-americana, que é impensável não reconhecer, até porque nós representamos uma parcela mínima das importações norte-americanas,
02:15enquanto os Estados Unidos saem entre os nossos três maiores importadores e exportadores,
02:20para poder sentar e achar um meio de caminho aceitável.
02:26Algo que venha a trazer essas alíquotas a números menores, que sejam menos lesivos ao cenário interno brasileiro.
02:37Professor, muito bom dia para o senhor também, obrigada pela gentileza da entrevista.
02:42Você vê que talvez Brasil e Estados Unidos estariam aí à beira de um rompimento?
02:48A gente pode até citar o fato do governo americano ter proibido agora a entrada de Alexandre de Moraes,
02:56de outros ministros do STF, como o senhor classificaria também essa medida?
03:04Abusiva.
03:05Essa medida indubitavelmente é abusiva, ela foge a todas as regras de diplomacia que nós conhecíamos.
03:11Ela foge a liturgia que essas relações entre Estados criavam, mas ela está se tornando cada vez mais frequente.
03:21O Brasil, que era um país desconhecido pelos Estados Unidos, hoje entra no foco dessas relações.
03:32Me parece que não é o Brasil em si, eu não consigo enxergar essa importância tamanha à nossa política.
03:42Me parece que aí já há uma mistura de toda a ingerência do Brasil, ou pelo menos a narrativa da ingerência
03:49em supostamente liderar as nações BRICS, em desviar o foco da América Latina, dos Estados Unidos, para a China.
04:00Então, talvez essa seja a proeminência que o Brasil está alcançando, até porque o nosso presidente é o que mais vocifera
04:12e o Brasil está alcançando.
04:14E o Brasil está alcançando essas intenções que, numa visão do direito econômico, elas são irreais.
04:19O mundo não conseguiria migrar hoje do dólar como padrão de compra para a moeda chinesa,
04:27ou para a moeda russa, ou mesmo uma moeda comum de todos esses países que integram os BRICS.
04:34Então, dentro dessa política de bullying que foi instaurada pelos Estados Unidos na gestão Trump,
04:42a força, obviamente, ela se impõe, a razão é aquela que é determinada não pelos Estados Unidos,
04:50mas pelo governo Trump, que instaurou essa nova forma de negociar.
04:56E ela é inevitável. Nós temos que nos adequar a essa realidade.
05:02É impensável acreditar que o Brasil possa enfrentar, de peito aberto, uma disputa dessa natureza com os Estados Unidos.
05:13Porque essa disputa não será legal. Ela não será nas regras da Organização Mundial do Comércio.
05:19A Organização Mundial do Comércio, que já estava esvaziada, ou seja, o foro multilateral,
05:25o lugar que se discutia questões comerciais internacionais,
05:30muito antes da gestão norte-americana, da primeira administração Trump e a administração Biden,
05:39nada fez para remediar essa situação.
05:43O que acontece agora é um rompimento com o que tradicionalmente era feito na diplomacia comercial internacional.
05:51Nós estamos vivendo uma era completamente nova, essa era do bullying nas relações diplomáticas entre Estados.
06:00Professor, só me ocorreu uma dúvida aqui.
06:02Quando o senhor fala em negociação, eu gostaria de entender bem qual é o seu ponto de vista sobre negociar
06:08e se isso teria a ver também com as questões políticas que aparecem no meio dessa celeuma.
06:12Porque o ex-presidente Jair Bolsonaro coloca como uma solução para essa taxação o projeto de anistia,
06:20o que interferiria em decisões do judiciário brasileiro, no qual os Estados Unidos não podem apitar, obviamente.
06:27Essa negociação, no seu caso, tem a ver com questões políticas também?
06:32Ou isso é apenas uma cortina de fumaça para o que realmente importa?
06:36O que seria a maneira como o presidente da República, o presidente Lula, tem falado sobre alteração de moeda
06:43ou a maneira como ele tenta liderar essas conversas no grupo do BRICS?
06:48O que é essa negociação e o que entra, de fato, nessa história e com possibilidade de se chegar a um meio de caminho?
06:55Eu não consigo ver essa ingerência no nosso judiciário.
07:01Mesmo se o Estado resolvesse interceder em favor, junto ao judiciário,
07:08desta relação jurídica, desses julgamentos que estão em curso,
07:15eu não sei se eles teriam sucesso.
07:16Aliás, me parece que não.
07:18Mas eu também não sei, eu não entendo isso como primordial para os Estados Unidos.
07:24A questão dele é econômica.
07:27Eu tenho certeza que se o Brasil se afastasse dessas discussões...
07:36E eu não estou nem dizendo de continuar comerciando com a China.
07:40É inevitável que o Brasil continue comerciando com a China e seja um dos maiores parceiros comerciais.
07:46Mas o foco me parece ser a mudança da moeda.
07:52A moeda norte-americana, o dólar, que, diga-se de passagem, é um tratado.
07:58O Brasil faz parte de um tratado firmado pós-segunda guerra mundial,
08:02em que se estabelece o dólar norte-americano como padrão de trocas.
08:07Não é viável pensar que algo dessa magnitude possa acontecer.
08:13O Mercosul criou um mecanismo de uso de moedas locais para comércio.
08:17Nós estamos falando aqui de transfronteiriços.
08:20E eu não vou dizer que fracassou, mas que ele não traz nenhum resultado palpável.
08:26Não traz.
08:27O comércio em moeda chinesa é minúsculo perto ao comércio global feito em moeda norte-americana.
08:36Me parece que se tratar desta pauta específica do critério de uso de moeda de troca no comércio internacional,
08:50se o Brasil recuar da sua posição, nós seríamos condições de negociar.
08:57E essa negociação seria diplomática, seria comparecer ao Departamento de Estado norte-americano
09:04e demonstrar uma humildade que não é característica desse nosso governo.
09:12Nós estamos falando de dois governos com dois governantes atípicos, para não dizer outra coisa.
09:22Professor, nossos comentaristas também participam dessa entrevista.
09:27Pergunta agora de José Maria Trindade.
09:30Perfeito, professor, muito bom dia.
09:32Professor, um jornalista amigo meu, Luiz Carlos Azedo, ele compara Donald Trump a Luiz XIV.
09:38Aquela frase, né, letar sem oar, ou seja, o Estado sou eu.
09:42Mas eu entendo que ele está mais para o Jânio, né, aquela história, filo porquequilo.
09:48Esse presidente da República, ele faz as coisas e não fiz porque eu fiz.
09:52Mas um outro líder partidário me disse o seguinte, olha, os americanos são muito ligados a leis.
10:00Eu diria que os Estados Unidos têm um produto forte, que é o advogado.
10:05O senhor falou aí na impossibilidade de organizações internacionais decidirem legalmente sobre esse assunto.
10:13Mas um presidente norte-americano legalmente tem mesmo esse poder, isso me surpreendeu.
10:18Eu entendo que não.
10:20Sobre a legislação norte-americana.
10:24É assim mesmo?
10:25O presidente pode fazer as coisas porque ele quis e não porque a lei manda?
10:30A participação com o professor Cláudio Finkelstein, da PUC, caiu.
10:40Então a gente agradece aqui a participação do professor, caso não consigamos retomar a comunicação com ele.
10:45E a gente pode trazer também a sua dúvida, viu, Zé Maria Trindade, com próximos entrevistados para tratar do tema que ainda teremos nessa edição aqui do Jornal da Manhã.