- 15/05/2025
Bem-vindo ao NetDrive Audiobook, o seu canal de histórias em áudio! Hoje, apresentamos "Um Pressentimento Funesto", um conto envolvente da Rainha do Crime, Agatha Christie.
🔍 Um simples pressentimento pode ser apenas um temor infundado… ou um aviso real do que está por vir? Neste mistério intrigante, a intuição e o destino se entrelaçam de maneira surpreendente, mantendo você preso até o último instante.
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Categoria
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AprendizadoTranscrição
00:00:00Seja muito bem-vindo ao NetDrive Audiobook.
00:00:03Hoje, seguimos com mais um capítulo de uma das autoras mais consagradas do mundo do mistério,
00:00:08Agatha Christie.
00:00:10Estamos dando continuidade à envolvente trama de um pressentimento funesto,
00:00:14e agora entramos no capítulo 9.
00:00:17Se você tem nos acompanhado até aqui,
00:00:19já sabe que essa história não é apenas sobre um simples pressentimento,
00:00:23mas sobre suspeitas,
00:00:25sentimentos difíceis de ignorar e perigos que se escondem por trás das aparências.
00:00:30A protagonista, marcada por uma inquietação persistente
00:00:34e uma sensação de que algo terrível está prestes a acontecer,
00:00:37tem enfrentado dúvidas, silêncios e sinais cada vez mais preocupantes.
00:00:42E quanto mais a história avança,
00:00:44mais sentimos que esse pressentimento pode ser real e mortal.
00:00:49No capítulo anterior,
00:00:50as tensões aumentaram e algumas peças começaram a se mover,
00:00:54mas o quebra-cabeça ainda está longe de ser montado.
00:00:57Agora, ao entrarmos no capítulo 9,
00:01:00a atmosfera se torna ainda mais carregada
00:01:03e o que parecia sutil começa a se tornar impossível de ignorar.
00:01:07Então, acomode-se,
00:01:09coloque seus fones de ouvido e prepare-se para continuar essa leitura envolvente.
00:01:14Agora, vamos juntos ao capítulo 9 de um pressentimento funesto de Agatha Christie.
00:01:20Boa escuta!
00:01:22Capítulo 9
00:01:23Uma manhã em Market Basin
00:01:25— Bom — disse Mr. Coplegg, saindo afobada do quarto —
00:01:29mais outro dia.
00:01:31É o que sempre digo quando acordo.
00:01:33Outro dia — pensou Tupence, provando o forte chá preto.
00:01:38— Quem sabe não estou bancando a idiota?
00:01:41— Pode ser.
00:01:42Tomara que Tommy estivesse aqui para conversar.
00:01:45A noite de ontem me deixou toda confusa.
00:01:48Antes de descer,
00:01:49Tupence registrou na agenda os vários fatos e nomes que conhecera na véspera.
00:01:54Achava-se cansada demais para tomar nota na hora de dormir.
00:01:58Histórias melodramáticas do passado,
00:02:00contendo talvez pitadas de verdade aqui e ali,
00:02:04mas na maioria disse-me disse que
00:02:06malevolência,
00:02:07mexerico,
00:02:08imaginação romântica.
00:02:10— De fato — refletiu —
00:02:12estou começando a saber da vida amorosa de uma quantidade de gente desde o século XVIII,
00:02:17creio eu.
00:02:18Mas de que adianta isso?
00:02:20E o que é que estou procurando?
00:02:22Já nem sei mais.
00:02:23O pior é que me envolvi no caso e não posso parar.
00:02:27Tremendamente desconfiada de que a primeira coisa que devia evitar era
00:02:31qualquer intimidade com Miss Bleeck,
00:02:33que, na sua opinião, encarnava a ameaça global de Sutton, chancelor,
00:02:37Tupence recusou todas as generosas ofertas de auxílio partindo rápido de
00:02:42carro para a Market Basin,
00:02:44apenas freando quando Miss Bleeck,
00:02:46aos gritos estridentes,
00:02:47abordou-a para explicar que tinha um compromisso urgente.
00:02:51A que horas pretendia voltar?
00:02:53Tupence mostrou-se vaga.
00:02:55Não queria almoçar com ela.
00:02:57O convite era muito gentil,
00:02:59porém receava-a que...
00:03:01— Para o chá?
00:03:02— Então.
00:03:03— Espero-a às quatro e meia.
00:03:04Parecia quase uma ordem real.
00:03:07Tupence sorriu,
00:03:08aqueceu,
00:03:09soltou a embreagem e partiu.
00:03:11Provavelmente,
00:03:12pensou,
00:03:13se obtivesse alguma informação interessante dos corretores de imóveis
00:03:17em Market Basin,
00:03:19Nellie Bleeck poderia fornecer-lhe pormenores muito úteis.
00:03:23Era o tipo da mulher que se orgulha em conhecer a vida íntima de todo o mundo.
00:03:27O problema é que estaria decidida a descobrir tudo a respeito de Tupence.
00:03:32Tomara que, à tarde,
00:03:33já suficientemente restabelecida,
00:03:36voltasse a ter ideias luminosas.
00:03:38— Lembre-se de Mr. Blake Insub,
00:03:40disse para si mesma,
00:03:42desviando o carro abruptamente para o lado
00:03:44e espremendo-se contra uma cerca para não ser esmagada por um enorme trator despreocupado.
00:03:50Chegando a Market Basin,
00:03:52estacionou na praça principal e foi a pé ao correio,
00:03:55entrando numa cabine telefônica que estava livre.
00:03:58A voz de Albert atendeu,
00:04:00com a resposta de Pratchett,
00:04:02um alô pronunciado com desconfiança.
00:04:05— Escute, Albert,
00:04:07chegarei amanhã.
00:04:08Há tempo de jantar.
00:04:09Em todo caso,
00:04:11talvez antes.
00:04:12Mr. Beresford também,
00:04:14a não ser que telefone.
00:04:16Compre alguma coisa.
00:04:18Galinha.
00:04:18Acho.
00:04:19Certo.
00:04:20Patroa.
00:04:21Onde é que a senhora?
00:04:23Tupence.
00:04:24Porém,
00:04:24já tinha desligado.
00:04:26A vida de Market Basin parecia concentrada em torno da importante praça principal.
00:04:32Tupence verificara no catálogo classificado
00:04:35antes de sair do correio
00:04:36que três das quatro imobiliárias locais ficavam situadas ali
00:04:40e a quarta em George Street.
00:04:42Rabiscou os nomes e pôs-se à procura dos endereços.
00:04:46Começou pela firma Loverbody Sleeker,
00:04:49que aparentava ser a mais imponente.
00:04:51Uma moça com manchas no rosto atendeu-a.
00:04:54Desejava informações sobre uma casa.
00:04:56O pedido não despertou o menor interesse na funcionária.
00:05:00Tupence poderia ter indagado a respeito de qualquer espécie rara de animal
00:05:05que a reação seria a mesma.
00:05:07— Olhe,
00:05:07eu não sei.
00:05:08Espere aí.
00:05:09Retrocou a moça,
00:05:11certificando-se se não havia nenhum colega por perto a quem pudesse passar Tupence.
00:05:16— Uma casa,
00:05:17insistiu Tupence.
00:05:19— Vocês são corretores de imóveis,
00:05:21não são?
00:05:22— Corretores e leiloeiros.
00:05:24— Caso esteja interessada,
00:05:25o leilão de cranberry corte será na quarta-feira.
00:05:29— O catálogo custa dois shillings.
00:05:31— Não estou interessada em leilões.
00:05:33— Quero perguntar a respeito de uma casa.
00:05:36— Mobiliada?
00:05:37— Não.
00:05:38— Sem móveis?
00:05:39— Para comprar,
00:05:40ou alugar.
00:05:41Mancha se animou um pouco.
00:05:44— Acho que seria melhor falar com Mr. Zicker.
00:05:47A solução não podia agradar mais Tupence.
00:05:50Viu-se logo sentada num pequeno escritório,
00:05:52diante de um rapaz interno de mescla xadrez marrom,
00:05:56que começou a apresentar um grande número de especificações de residências vantajosas,
00:06:01murmurando comentários para si mesmo.
00:06:03Mandeville Road, 8.
00:06:06— Ótima construção.
00:06:07— Três dormitórios.
00:06:09— Cozinha americana.
00:06:10— Ó!
00:06:11— Não.
00:06:11— Já foi tomada.
00:06:13Amabel Lodge, moradia pitoresca,
00:06:1616.000 m²,
00:06:18preço reduzido para a venda imediata.
00:06:20Tupence forçou-a a interromper-se.
00:06:23— Vi uma casa de que gostei muito.
00:06:25Em Sutton Chancelor,
00:06:27ou melhor,
00:06:28perto de lá,
00:06:29à beira de um canal.
00:06:30— Sutton Chancelor,
00:06:32— repetiu Mr. Zicker,
00:06:34dubitativo.
00:06:35— Acho que não temos nenhuma propriedade em nossos livros atualmente.
00:06:39— Como se chama?
00:06:40— Parece que não tem nada escrito.
00:06:43— Talvez Waterseed.
00:06:44— Rivermead,
00:06:46uma vez foi a casa da ponte.
00:06:48— Creio,
00:06:49explicou Tupence,
00:06:50que é dividida em duas.
00:06:52— Uma metade está alugada,
00:06:54mas o inquilino não soube me dizer nada sobre a outra,
00:06:57que fica de frente para o canal e que é a que me interessa.
00:07:01— Pelo jeito ninguém mora lá,
00:07:03Mr. Zicker declarou,
00:07:04num tom indiferente,
00:07:06que receava não poder ajudá-la,
00:07:08porém dignou-se a informar que provavelmente Blodgett e Burgess talvez se encontrassem em condições de fazê-lo.
00:07:15O tom de voz sugeria que se tratava de uma firma muito inferior.
00:07:19Tupence atravessou a praça e se deparou com um prédio que lembrava uma réplica quase exata de L'Auverbois de Zicker,
00:07:26o mesmo tipo de anúncios de vendas e próximos leilões nas vitrinas, um pouco encardidas.
00:07:31A porta de entrada tinha sido pintada recentemente de uma tonalidade de verde bastante biliosa,
00:07:37o que não se podia considerar propriamente como mérito.
00:07:41A maneira com que a receberam, tampouco, foi estimulante.
00:07:44Viu-se entregue à atenção de um tal Mr. Spreeck,
00:07:47homem idoso de disposição aparentemente desanimada.
00:07:51Repetiu mais uma vez seus requisitos.
00:07:54— Condições.
00:07:55Mr. Spreeck confessou que sabia da existência da moradia em questão,
00:07:59mas não deu esperanças nem.
00:08:01Pelo que Tupence pôde observar, revelou muito interesse.
00:08:05— Lamento, porém não se acha à venda.
00:08:08O proprietário não quer se desfazer dela.
00:08:10— Quem é o proprietário?
00:08:12— Realmente acho que não sei.
00:08:14Mudou de dono com bastante frequência.
00:08:16Uma ocasião falou-se que seria desapropriada.
00:08:19— Por que motivo uma administração local precisaria dela?
00:08:23— Francamente, mistres.
00:08:26Olhou de relance para o nome rabiscado às pressas na folha de mataborrão.
00:08:30Mr. Sberesford, se a senhora fosse capaz de me dar a resposta a essa pergunta,
00:08:36seria mais sensata que a maioria dos incautos hoje em dia.
00:08:39Os desígnios dos conselhos municipais e das sociedades de planejamentos
00:08:44estão sempre envoltos em mistérios.
00:08:46A parte dos fundos da casa sofreu algumas reformas indispensáveis
00:08:50e foi alugada a um preço extremamente barato a um.
00:08:53— Como é mesmo?
00:08:54— Ah, sim, a um casal, Mr. e Mistres.
00:08:58— Perry,
00:08:59quanto ao proprietário atual,
00:09:01o cavalheiro em questão vive no exterior e parece ter perdido todo o interesse pelo lugar.
00:09:07Creio que houve um problema qualquer em torno da herança de um menor
00:09:10e foi administrada por executores testamentários.
00:09:14Surgiram certas dificuldades legais.
00:09:16A lei tende a ser dispendiosa, Mr. Sberesford.
00:09:20Imagino que o dono ficaria muito contente se a casa desmoronasse
00:09:24e a única parte reformada foi habitada pelos Perrys.
00:09:27— Lógico que a terra, em si, pode sempre valorizar no futuro.
00:09:32O conserto de residências em escombros raramente traz lucro.
00:09:36Se estiver interessada numa propriedade desse tipo,
00:09:39tenho certeza de que podemos oferecer-lhe algo muito mais valioso.
00:09:44— Desculpe a pergunta, mas o que a atraiu especialmente naquela casa?
00:09:48— Gostei do aspecto.
00:09:50— Respondeu Tupense.
00:09:51— É muito bonita.
00:09:53— Vi a A pela primeira vez do trem.
00:09:55— Ah! Entendo.
00:09:57Mr. Sprigg dissimulou da melhor maneira possível uma expressão que diria
00:10:01— A insensatez das mulheres é incrível — e aconselhou suavemente.
00:10:06Se eu fosse a senhora, esqueceria o assunto por completo.
00:10:09Suponho que poderiam escrever ao proprietário,
00:10:12perguntando se não quer vendê-la,
00:10:14a menos que prefiram me dar o endereço dele ou deles.
00:10:18Já que insiste, entraremos em contato com os procuradores,
00:10:22mas não lhe posso prometer nada.
00:10:25— É incrível como a gente tem de recorrer a procuradores para tudo hoje em dia.
00:10:29Tupense procurou demonstrar ao mesmo tempo frivolidade e impaciência,
00:10:34e os advogados demoram tanto para resolver qualquer coisa.
00:10:37— Ah, é! A lei é pródiga em delongas.
00:10:40— Bancos.
00:10:41Mr. Sprigg pareceu um pouco surpreso.
00:10:44— Há muita gente com mania de dar um banco como endereço.
00:10:48— É irritante.
00:10:49— Também.
00:10:50— Sim, sim.
00:10:51— É como a senhora diz.
00:10:53Mas as pessoas são tão instáveis nos dias que correm,
00:10:56mudam-se com tanta frequência,
00:10:58morando no exterior e tudo mais.
00:11:00Abriu uma gaveta da escrivaninha.
00:11:03— Olhe, eu tenho uma propriedade aqui,
00:11:05Cruz Gates, a três quilômetros de Market Basin,
00:11:09em ótimas condições, lindo jardim.
00:11:12Tupense pôs-se em pé.
00:11:14— Não, obrigada.
00:11:15Despediu-se de Mr. Sprigg com firmeza e saiu na praça.
00:11:19Fez uma rápida visita à terceira firma,
00:11:22que parecia ocupar-se quase que exclusivamente de vendas de gato,
00:11:26granjas de galinha e chácaras,
00:11:28em geral em condições de abandono.
00:11:30Deixou, por último, Roberts e Wheeley,
00:11:33em George Street, uma empresa pequena,
00:11:35mas, pelo visto, dinâmica e solícita.
00:11:38Embora praticamente desinteressada e ignorante sobre tudo o que se referisse
00:11:42a Sutton, chancelor e ansiosa por vender residências em fase de construção
00:11:47por preços ridiculamente exorbitantes,
00:11:49a ilustração de um exemplo provocou um calafrio de horror em Tupense.
00:11:54O ávido rapaz,
00:11:55vendo a possível compradora disposta a partir,
00:11:58admitiu de má vontade a existência de um lugar chamado Sutton, chancelor.
00:12:03— A senhora disse Sutton, chancelor.
00:12:05É melhor tentar Bloodgett e Burgess,
00:12:08na praça.
00:12:09Eles administram uma propriedade por aqueles lados,
00:12:12mas tudo está em péssimas condições, em escombros.
00:12:15Há uma casa linda por lá,
00:12:17perto de uma ponte no canal.
00:12:19Eu enxerguei do trem.
00:12:21Por que ninguém quer morar nela?
00:12:23Oh!
00:12:24Conheço o lugar.
00:12:25Essa.
00:12:26Riverbank.
00:12:27Ninguém quer ficar ali,
00:12:29nem por nada.
00:12:30Tem fama de mal-assombrada.
00:12:32Fantasmas,
00:12:33quer dizer.
00:12:34É o que consta.
00:12:35Há uma porção de histórias em torno.
00:12:38Barulhos à noite.
00:12:39E gemidos.
00:12:40Na minha opinião,
00:12:42garanto que não passam de baratas.
00:12:44Oh!
00:12:45Meu Deus!
00:12:46Lamentou Tupense.
00:12:47Me parecia tão simpática e isolada.
00:12:50Isolada demais,
00:12:52na opinião da maioria.
00:12:53Enchentes no inverno.
00:12:55Pense só nisso.
00:12:56Vejo que há muita coisa em que pensar.
00:12:59Retrocou Tupense.
00:13:00Mordais.
00:13:01Saiu murmurando sozinha,
00:13:03dirigindo-se ao cordeiro e estandarte,
00:13:06onde tensionava-se reanimar com um bom almoço.
00:13:09Uma porção de coisas em que pensar.
00:13:11Inundações,
00:13:12insetos,
00:13:13fantasmas,
00:13:15correntes estrepitosas,
00:13:16proprietários e locadores ausentes,
00:13:19procuradores,
00:13:20bancos,
00:13:21uma casa que ninguém quer nem gosta,
00:13:23exceto eu,
00:13:24talvez.
00:13:25Ora, bolas,
00:13:26o que eu quero agora é comer.
00:13:28A comida no cordeiro e estandarte era ótima e farta.
00:13:32Pratos substanciosos para lavradores,
00:13:34em vez de falazes cardápios franceses para atrair turistas.
00:13:38Sopa grossa picante,
00:13:40pernil com molho de maçã,
00:13:42queijo silton,
00:13:43ou ameixas com creme,
00:13:45para quem preferisse,
00:13:46o que não era seu caso.
00:13:48Depois de andar um pouco a esmo,
00:13:50Tupence foi buscar o carro e regressou a Souton-Chancelor,
00:13:54incapaz de considerar a excursão frutífera.
00:13:57Quando dobrou a última curva e a igreja da aldeia ficou à vista,
00:14:01enxergou o pastor saindo do cemitério.
00:14:04Caminhava com um passo cansado.
00:14:06Parou o automóvel ao lado dele,
00:14:08ainda à procura do tal túmulo.
00:14:11Perguntou.
00:14:12O clérigo apoiava a mão aos rins.
00:14:14—Ah! Meu Deus! exclamou.
00:14:17Meus olhos não andam muito bons.
00:14:19Há tantas inscrições praticamente apagadas.
00:14:22As costas me doem.
00:14:24Também.
00:14:25A maioria das lápides fica deitada no chão.
00:14:28Francamente, às vezes,
00:14:30quando me curvo,
00:14:31tenho medo de não poder voltar à posição normal.
00:14:34Se eu fosse o senhor,
00:14:36desistia.
00:14:37Aconselhou.
00:14:38Se já procurou no registro da paróquia e tudo mais,
00:14:41fez o máximo possível.
00:14:43Eu sei,
00:14:44mas o pobre coitado parecia tão ansioso,
00:14:47tão empenhado.
00:14:48Tenho absoluta certeza de que é trabalho perdido.
00:14:51No entanto,
00:14:52realmente achei que era meu dever.
00:14:55Tem ainda um pequeno trecho que não examinei,
00:14:57ali adiante,
00:14:59atrás do teixo,
00:15:00até o muro oposto,
00:15:02embora quase todas as lápides sejam do século XVIII.
00:15:05Porém, gostaria de sentir que terminei minha tarefa como devia.
00:15:09Então, não teria nada a me recriminar.
00:15:12Seja como for,
00:15:13deixarei para amanhã.
00:15:15—Isso mesmo!
00:15:16—apoiou Tupense.
00:15:17—Não é preciso fazer tudo de uma só vez.
00:15:20—Olhe,
00:15:21tive uma ideia.
00:15:22Acrescentou.
00:15:24—Depois de tomar chá com Miss Bligg,
00:15:26eu mesma vou dar uma olhada.
00:15:28Do teixo até o muro,
00:15:30o senhor diz?
00:15:31—Ó,
00:15:31mas eu não posso permitir,
00:15:33de maneira nenhuma.
00:15:35Fique tranquilo.
00:15:36Acho que vai ser divertido.
00:15:38Gosto muito de passear em cemitério.
00:15:40Sabe como é?
00:15:42As inscrições mais antigas proporcionam uma espécie de quadro das pessoas que viveram aqui
00:15:47e toda essa espécie de coisa.
00:15:49—Vou até gostar.
00:15:50—É sério.
00:15:51—Por favor,
00:15:52vá para casa descansar.
00:15:54—Bem,
00:15:55naturalmente eu devo preparar um pouco o meu sermão de logo mais,
00:15:59nem há dúvida.
00:16:00A senhora me parece uma pessoa muito prestativa,
00:16:04uma verdadeira amiga.
00:16:05Sorriu-lhe e foi embora para a casa paroquial.
00:16:09Tupense consultou o relógio de pulso.
00:16:11Dirigiu-se à residência de Miss Bleeck.
00:16:14—É melhor terminar logo com isso,
00:16:16pensou.
00:16:17A porta da frente estava aberta e encontrou-a carregando um prato de pães de minuto recém-tirados do forno
00:16:23entre o corredor e a sala de visitas.
00:16:26—Ó,
00:16:27ela finalmente,
00:16:28cara Mr. Beresford.
00:16:30Estou tão contente em vê-la.
00:16:32O chá já está quase pronto.
00:16:34Botei a chaleira no fogo.
00:16:36Só falta encher o bule.
00:16:38Espero que tenha feito todas as compras.
00:16:41Acrescentou, olhando de maneira um tanto ostensiva para a sacola vazia que Tupense trazia no braço.
00:16:47—Olhe,
00:16:48para ser franca, não tive muita sorte.
00:16:50Retrucou,
00:16:51com a melhor cara que pôde.
00:16:53Sabe como é às vezes,
00:16:55um desses dias em que a gente não consegue a cor ou o tipo de coisa exata que se procura?
00:17:00Mas eu sempre gosto de dar uma olhada por um lugar novo,
00:17:04ainda que não apresente grande interesse.
00:17:06A chaleira deixou escapar um assobio estridente e Miss Bleak se precipitou à cozinha para atendê-la,
00:17:12espalhando uma pilha de cartas por remeter que estavam sobre a mesa do vestíbulo.
00:17:17Tupense abaixou-se para apanhá-las.
00:17:20Reparando,
00:17:21antes de colocá-las no lugar que a de cima era endereçada a uma certa Mrs. York,
00:17:26Rosetrelly escorte para as senhoras idosas.
00:17:29Numa determinada localidade em Cumberland.
00:17:32—Puxa!
00:17:33—pensou,
00:17:34—estou começando a pensar que neste país só existem asilos de velhice.
00:17:38Garanto que não demora muito para que Tommy e eu também ingressemos num.
00:17:42Pouco tempo antes,
00:17:44um amigo todo solícito lhes escrevera,
00:17:46recomendando um ótimo estabelecimento em Devon,
00:17:50para casais,
00:17:51na maioria,
00:17:52funcionários públicos aposentados.
00:17:54Comida de boa qualidade.
00:17:56Levava-se a própria mobília e objetos de uso pessoal.
00:18:00Miss Bleak reapareceu com o bully
00:18:03e as duas sentaram-se para tomar chá.
00:18:05A conversa da dona da casa era menos melodramática e colorida que a de Mr.
00:18:10Coplegue e preocupava-se mais em obter informações do que em fornecê-las.
00:18:14Tupence comentou vagamente os anos passados no serviço diplomático no
00:18:18estrangeiro,
00:18:19as dificuldades da vida doméstica na Inglaterra,
00:18:22entrando em detalhes sobre um filho e uma filha,
00:18:25ambos casados e com prole,
00:18:27e desviou o assunto delicadamente para as.
00:18:30Múltiplas atividades de Miss Bleak insultam o chancelor,
00:18:33o Instituto Feminino,
00:18:35guias,
00:18:35escoteiros,
00:18:36a União Conservadora das Mulheres,
00:18:39conferências,
00:18:40arte grega,
00:18:41fabricação de geleias,
00:18:43ornamentação de flores,
00:18:45o Clube do Desenho,
00:18:46a Sociedade de Arqueologia,
00:18:48a saúde do pastor,
00:18:49a necessidade de persuadi-lo a cuidar um pouco de si mesmo,
00:18:53sua distração,
00:18:55as lamentáveis diferenças de opinião entre os zeladores da igreja.
00:18:59Tupence elogiou os pãezinhos,
00:19:01agradeceu a hospitalidade e levantou-se para ir embora.
00:19:05A senhora possui uma vitalidade maravilhosa,
00:19:08Miss Bleak,
00:19:09felicitoa.
00:19:10Não sei como consegue se ocupar de tanta coisa ao mesmo tempo.
00:19:14Devo confessar que, após um dia de excursão e compras,
00:19:17gosto de descansar um pouco em minha cama,
00:19:19apenas meia hora,
00:19:21mais ou menos,
00:19:22de olho fechado.
00:19:23Numa cama bem comoda,
00:19:25lógico.
00:19:26Tenho de lhe agradecer muito por me recomendar a Mr. Schopleg,
00:19:30uma mulher de toda confiança,
00:19:32embora não há que negar que fale demais.
00:19:35Oh!
00:19:36Achei extremamente divertidas as histórias que me contou dos moradores locais.
00:19:40A maior parte do tempo, ela nem sabe do que está falando.
00:19:44Pretende demorar-se alguns dias.
00:19:47Oh!
00:19:47Não?
00:19:48Vou-me embora amanhã.
00:19:50Fiquei decepcionada.
00:19:51Não encontrei nenhuma pequena propriedade conveniente.
00:19:55Tinha esperança naquela casa tão pitoresca à beira do canal.
00:19:59A vantagem foi sua.
00:20:01Está em péssimo estado de conservação.
00:20:03Locadores ausentes, é uma pena.
00:20:06Nem consegui descobrir a quem pertence.
00:20:09Vai ver que a senhora sabe.
00:20:11Parece conhecer tudo por aqui.
00:20:13Nunca me interessei muito por aquela casa.
00:20:16Sempre muda de dono.
00:20:18Não dá para acompanhar o andamento.
00:20:20Os perres ocupam a metade,
00:20:22enquanto a outra parte simplesmente se estraga e arruína.
00:20:26Toupei se tornou a se despedir e partiu para a residência de Mr. Coplegg.
00:20:31Encontrou tudo quieto e aparentemente deserto.
00:20:34Subiu ao quarto.
00:20:36Largou a sacola de compras vazia.
00:20:38Lavou o rosto.
00:20:39Impôu o nariz.
00:20:41Saiu de novo na ponta dos pés.
00:20:43Observou a rua em ambas as direções e depois,
00:20:46deixando o carro onde estava,
00:20:48dobrou rapidamente à esquina e tomou um atalho que cruzava o campo atrás da aldeia e ia dar,
00:20:53eventualmente, num torniquete que comunicava com o cemitério.
00:20:58Toupei se entrou e, conforme prometera,
00:21:01pôs-se a examinar as lápides.
00:21:03Era a hora do crepúsculo e reinava uma grande tranquilidade no local.
00:21:07Não tinha realmente nenhum motivo oculto para proceder àquela busca.
00:21:12Não havia nada ali que esperasse descobrir.
00:21:15Tratava-se,
00:21:16de fato,
00:21:17de mera delicadeza de sua parte.
00:21:19O velho pastor era um encanto de pessoa e Toupence gostaria de que ele se sentisse inteiramente em paz com a própria consciência.
00:21:27Levará uma agenda e um lápis para a eventualidade de achar qualquer coisa digna de anotar para ele.
00:21:33Presumia que devia apenas procurar uma provável sepultura que assinalasse o lugar onde estava enterrada uma criança da idade indicada.
00:21:41Não viu nenhuma que fosse tão recente.
00:21:44A maioria apresentava restrito interesse,
00:21:47não tendo suficiente antiguidade para despertar curiosidade ou mostrar inscrições comoventes ou ternas.
00:21:53Eram quase todas de pessoas relativamente idosas.
00:21:57Mesmo assim, demorou-se um pouco a contemplá-las, compondo quadros na imaginação.
00:22:02Janiel Vaud, falecida a 6 de janeiro, na idade de 45 anos.
00:22:08William Maro, falecido a 5 de janeiro, saudades eternas.
00:22:13Mary Travis, com 5 anos apenas.
00:22:1614 de março de 1835.
00:22:20Há mais de um século.
00:22:21Em tua presença, a plenitude da alegria.
00:22:25Feliz Mary Travis!
00:22:27Chegou bem perto do muro.
00:22:29As sepulturas naquele recanto estavam abandonadas e cobertas de era.
00:22:33Ninguém parecia cuidar desse pedaço do cemitério.
00:22:36Várias lápides já nem se achavam mais em posição vertical, espalhadas pelo chão.
00:22:42O muro estava danificado e desmoronando.
00:22:45Havia lugares em que se desfizera por completo.
00:22:48Ficando escondido pela igreja, não podia ser visto da estrada,
00:22:52e, sem dúvida, os moleques vinham fazer todo o estrago que podiam.
00:22:56Tupence curvou-se sobre uma das lajes.
00:22:59Os dizeres originais estavam gastos e ilegíveis.
00:23:03Mas erguendo-a de lado, Tupence distinguiu algumas letras e palavras rabiscadas toscamente,
00:23:08agora também em parte cobertas pela vegetação.
00:23:12Abaixou-se para traçá-las com o indicador e decifrou palavras isoladas.
00:23:16— Ai de quem!
00:23:17— Escandalizar!
00:23:18— Inocentes!
00:23:20— Mó!
00:23:21— Mó!
00:23:21— Mó!
00:23:22— E embaixo!
00:23:23— No entalhe mal feito!
00:23:25— Aqui jaz lily-waters!
00:23:27Tupence, de espanto, reteve o fôlego.
00:23:31Percebeu que havia uma sombra às suas costas.
00:23:33Mas, antes que pudesse se virar,
00:23:36sentiu uma violenta pancada na nuca e caiu de bruço sobre o túmulo,
00:23:40mergulhando na dor e nas trevas.
00:23:43Terceira parte A Esposa Desaparecida
00:23:46Capítulo 10
00:23:47Uma Conferência
00:23:48E depois
00:23:49Então,
00:23:50Beresford,
00:23:51perguntou o major-general Sir Josiah Penn,
00:23:55K.M.G.,
00:23:56C.B.D.C.O.,
00:23:57com a solenidade apropriada à profusão impressiva de letras que acompanhavam seu nome,
00:24:02que me diz de todo esse lero-lero.
00:24:04Por essa observação, Tommy deduziu que o velho Joshie,
00:24:08como era irreverentemente apelidado pelas costas,
00:24:11não estava impressionado com o resultado do andamento das conferências de que participavam.
00:24:16Conversa afiada não resolve nada,
00:24:19prosseguiu Sir Josiah.
00:24:21Muita fumaça e pouco fogo.
00:24:23E, se alguém sugere uma medida sensata,
00:24:25na mesma hora quatro gênios se levantam para protestar.
00:24:29Francamente,
00:24:30não sei por que essa gente toda vem aqui.
00:24:33Isto é,
00:24:33no fundo eu sei,
00:24:35pelo menos no meu caso.
00:24:37Os outros é que não sabem.
00:24:39Se eu não viesse,
00:24:40teria de ficar em casa.
00:24:42E sabe o que acontece lá?
00:24:43Sou tiranizado,
00:24:45Beresford,
00:24:46pela governanta,
00:24:47pelo jardineiro.
00:24:49É um velho escocês que nem sequer me deixa tocar em meus próprios pêssegos.
00:24:53Por isso venho para cá.
00:24:55Me mexo de um lado para o outro e finjo que estou exercendo uma função útil,
00:24:59garantindo a segurança da pátria.
00:25:02Que rematada tolice!
00:25:03Mas,
00:25:04e você?
00:25:05Ainda é relativamente moço.
00:25:07Por que desperdiça seu tempo com um troço desses?
00:25:11Ninguém lhe prestará atenção,
00:25:13mesmo que diga coisas que valham a pena ouvir.
00:25:16Tommy,
00:25:16ligeiramente divertido com o fato de que,
00:25:19apesar de se considerar em idade avançada fosse julgado jovem por Sir Josiah Penn,
00:25:24sacudiu a cabeça.
00:25:26Pelos seus cálculos,
00:25:27o major-general devia estar com muito mais de oitenta anos,
00:25:31mas, embora estivesse um pouco surdo e sofresse de bronquite crônica,
00:25:35ninguém o fazia de tolo.
00:25:37—Se o senhor não viesse,
00:25:39afirmou,
00:25:40não se chegaria a nenhum resultado.
00:25:42—Também acho, disse o general.
00:25:44Sou um velho bulldog desentado,
00:25:47mas ainda posso latir.
00:25:48—Como vai, misters Tommy?
00:25:50—Faz tempo que não nos vemos.
00:25:52Tommy informou que Tupence ia bem e andava sempre ativa.
00:25:56Ela sempre foi.
00:25:57Às vezes até parecia ter o diabo no corpo.
00:26:01A Garravaz é um pressentimento aparentemente absurdo que lhe vinha a ideia
00:26:05e depois descobria-se que não era tão absurdo assim.
00:26:08—Muito divertida!
00:26:09comentou, com ar de aprovação.
00:26:12—Não simpatizo com essas mulheres sérias de meia-idade que a gente encontra hoje em dia,
00:26:17todas empenhadas numa causa com C maiúsculo.
00:26:20—E quanto às moças!
00:26:22sacudiu a cabeça.
00:26:24—Não são como as do meu tempo.
00:26:26—Como eram lindas!
00:26:27Aqueles vestidos de musselina!
00:26:29—E os chapéus cloche que usaram certa época?
00:26:32—Você se recorda?
00:26:34—Não.
00:26:34Imagino que estaria na escola.
00:26:36Precisava-se espiar por baixo da aba para enxergar o rosto.
00:26:40Uma coisa tantalizante, e elas sabiam.
00:26:43Agora me lembrei.
00:26:45—Espere!
00:26:45Era uma aparenta sua.
00:26:47Uma tia.
00:26:48Não é mesmo?
00:26:49—Ada.
00:26:50Ada Fanchave.
00:26:51Tia Ada.
00:26:53A moça mais bonita que vi em toda a minha vida.
00:26:56Tommy mal conseguiu disfarçar sua surpresa.
00:26:59Parecia-lhe inacreditável que Tia Ada pudesse ter sido considerada um paradigma de beleza.
00:27:05O velho Joshi continuava, todo agitado.
00:27:08Sim, parecia uma pintura.
00:27:11E como era viva!
00:27:12Alegre!
00:27:13Provocante como só ela!
00:27:15Ainda me lembro da última vez que nos vimos.
00:27:18Eu era um subalterno, de partida para a Índia.
00:27:21Fomos a um piquenique na praia, em noite de luar.
00:27:25Nos afastamos do grupo e sentamos num rochedo, olhando o mar.
00:27:29Tommy fitou-o com grande interesse.
00:27:31Aquela papada, a cabeça careca, as sobrancelhas ersutas e a enorme barriga.
00:27:37Imaginou Tia Ada, o buço incipiente, o sorriso malévolo, os cabelos grisalhos, cor de ferro,
00:27:44o olhar malicioso.
00:27:46O que o tempo faz com as pessoas?
00:27:48Tentou visualizar um belo jovem subalterno e uma linda moça ao luar.
00:27:53Desistiu.
00:27:54— Fabuloso! — disse Sir Josiah Penn com profundo suspiro.
00:27:58— Ah, sim!
00:27:59Fabuloso!
00:28:00Queria pedi-la em casamento naquela mesma noite,
00:28:03mas de que jeito se era apenas um subalterno que ganhava um soldo irrisório?
00:28:08Teríamos de esperar cinco anos, no mínimo para casar.
00:28:11Era um noivado longo demais para uma moça aceitar.
00:28:15Enfim, sabe como são essas coisas?
00:28:18Fui para a Índia e passou-se muito tempo antes que pudesse obter uma licença.
00:28:23Trocamos algumas cartas, mas depois a correspondência cessou, como geralmente acontece.
00:28:29Jamais a revi.
00:28:31E, no entanto, sabe, nunca consegui esquecê-la.
00:28:35Pensava nela com frequência.
00:28:37Lembro-me de que certa vez, anos mais tarde, quase lhe escrevi.
00:28:42Soube que se achava nas imediações de uma casa onde eu estava hospedado.
00:28:46Quis ir procurá-la, perguntar se podia visitá-la.
00:28:50Aí, então, disse comigo mesmo,
00:28:52não seja idiota,
00:28:53vai ver que provavelmente mudou muito.
00:28:56Passados mais alguns anos,
00:28:58escutei um sujeito dizer que ela era uma das mulheres mais feias que já tinha visto.
00:29:03Mal pude acreditar nos meus ouvidos,
00:29:06mas, de fato, creio que foi uma sorte nunca tê-la encontrado de novo.
00:29:10Por onde anda agora?
00:29:12Continua viva?
00:29:13Não.
00:29:14Morreu há duas ou três semanas.
00:29:16Para falar a verdade, respondeu Tommy.
00:29:19Realmente?
00:29:20Não diga.
00:29:21É, suponho que estaria com.
00:29:24Quanto mesmo?
00:29:25Setenta e cinco ou setenta e seis.
00:29:27Até um pouco mais velha, talvez.
00:29:30Tinha oitenta.
00:29:32Imagine só!
00:29:33A morena e vivaizada.
00:29:35Onde morreu?
00:29:36Estava numa casa de saúde ou morava com alguém.
00:29:39Nunca se casou, não foi?
00:29:42Não, confirmou Tommy, nunca.
00:29:45Estava num asilo de velhice.
00:29:47Muito bom, por sinal.
00:29:49Chamado Sunny Veede.
00:29:51Ah, conheço de nome.
00:29:53Sunny Veede.
00:29:54Creio que minha irmã conhecia uma senhora internada lá.
00:29:57Uma tal mistress.
00:29:59Ora, como era mesmo?
00:30:01Mistress Carstairs.
00:30:03Chegou a encontrá-la?
00:30:05Não.
00:30:05Não cheguei a ver muita gente lá.
00:30:08A gente costumava apenas visitar tia Ada.
00:30:11Deve ser um negócio difícil.
00:30:13Também.
00:30:14Quero dizer, nunca se sabe o que conversar.
00:30:17Com titia.
00:30:18Então, era um problema.
00:30:21Uma verdadeira fera.
00:30:22Sabe.
00:30:23Não duvido.
00:30:24O general riu.
00:30:26Sabia ser um autêntico demônio quando queria, no tempo de moça.
00:30:30Deu um suspiro.
00:30:31Essa coisa de envelhecer é terrível.
00:30:34Uma das amigas de minha irmã sofria de manias.
00:30:37Coitada!
00:30:38Vivia dizendo que tinha matado alguém.
00:30:41—Santo Deus!
00:30:42exclamou Tommy.
00:30:43E tinha mesmo.
00:30:45Oh!
00:30:45Acho que não.
00:30:46Parece que ninguém acreditava.
00:30:49Eu creio.
00:30:50Continuou o general.
00:30:51Pensativo.
00:30:53Que talvez tivesse.
00:30:54Sabe?
00:30:55Quando a gente começa a espalhar coisas desse tipo com o ar mais alegre deste mundo, ninguém acredita.
00:31:01Não é mesmo?
00:31:02Que tal a ideia, hein?
00:31:04Quem ela julgava ter assassinado?
00:31:06Sei lá!
00:31:07O marido.
00:31:08Nunca soube o que ele fazia nem como era.
00:31:11Quando viemos a conhecê-la, já estava viúva.
00:31:14—Olhe!
00:31:15acrescentou com um suspiro.
00:31:17Lamento a notícia da morte de Ada.
00:31:19Não li no jornal.
00:31:21Se não, teria enviado flores ou qualquer coisa.
00:31:24Um buquê de rosas ou algo parecido.
00:31:27Na época era o que as moças usavam nos vestidos de gala.
00:31:31Ficava tão bonito!
00:31:32Lembro-me de que Ada tinha um...
00:31:34Cor de hortência.
00:31:36Uma espécie de malva.
00:31:38Todo azulado.
00:31:39Com botões de rosa no peito.
00:31:41Uma vez me deu um.
00:31:42Não verdadeiro.
00:31:44Lógico.
00:31:45Artificial.
00:31:46Guardei durante muito tempo.
00:31:48Anos.
00:31:49—Eu sei!
00:31:50disse, percebendo o olhar de Tommy, que dá vontade de rir, não é?
00:31:55Ouça o que lhe digo.
00:31:56Rapaz, quando a gente fica realmente velho e gaga que nem eu, volta a ser sentimental de novo.
00:32:03Bem, acho melhor ir andando para assistir ao último ato deste ridículo espetáculo.
00:32:08Dê lembranças a Misters ter quando chegar em casa.
00:32:11No dia seguinte.
00:32:13No trem.
00:32:14Tommy recapitulou essa conversa, sorrindo consigo mesmo e tentando outra vez imaginar a terrível tia e o ardente major-general em seus dias de juventude.
00:32:23Preciso contar a Tupense.
00:32:25Ela vai achar graça.
00:32:27O que será que andou fazendo durante minha ausência?
00:32:30Tornou a sorrir.
00:32:32O fiel Albert abriu a porta de entrada com Radiante acolhida.
00:32:36Que bom que o senhor está de volta.
00:32:38Eu que o diga.
00:32:39Tommy entregou-lhe a mala.
00:32:41Onde está Misters Beresford?
00:32:43Ainda não chegou, patrão.
00:32:46Quer dizer que ela foi para fora.
00:32:48Há três ou quatro dias.
00:32:50Mas virá para o jantar.
00:32:52Telefonou ontem avisando.
00:32:54O que é que ela anda tramando, Albert?
00:32:57Francamente, não sei.
00:32:59Foi de carro, mas levou junto uma porção de guias ferroviários.
00:33:03Pode estar em qualquer lugar, por assim dizer.
00:33:06Sim, sem dúvida.
00:33:08Retrocou Tommy com convicção.
00:33:10Onde o diabo perdeu as botas, ou no fim do mundo,
00:33:14e, de certo na volta, perdeu a conexão num brejo qualquer.
00:33:17Que Deus proteja as ferroviárias britânicas.
00:33:20Ela telefonou ontem.
00:33:22Então?
00:33:23Não disse em que lugar estava.
00:33:25Não.
00:33:26A que horas foi isso?
00:33:27De manhã.
00:33:28Antes do almoço.
00:33:30Disse apenas que estava tudo bem.
00:33:32Não tinha certeza da hora em que ia chegar,
00:33:35mas achava que seria muito antes do jantar e sugeriu uma galinha.
00:33:39Fica bem para o senhor também?
00:33:41Fica, respondeu Tommy, consultando o relógio de pulso.
00:33:45Só que ela vai ter de se apressar.
00:33:47Eu controlo a galinha no forno, prometeu Albert.
00:33:51Tommy sorriu.
00:33:52Isso mesmo.
00:33:53Segure-a pelo rabo.
00:33:55Como vai você, Albert?
00:33:57Tudo em ordem em casa.
00:33:59Houve um susto com sarampo, mas não foi nada.
00:34:03O doutor disse que é benigno.
00:34:05Ótimo.
00:34:06Tommy subiu a escada assobiando alegremente.
00:34:09Entrou no banheiro, fez a barba, lavou-se,
00:34:12passou ao quarto de dormir e olhou em torno.
00:34:15Apresentava aquele curioso ar de abandono que certos dormitórios têm
00:34:20quando os ocupantes se ausentam.
00:34:22Frio e inóspito.
00:34:23Estava tudo escrupulosamente arrumado e limpo.
00:34:27Sentiu uma sensação de tristeza como a que ocorreria a um cão fiel, por exemplo.
00:34:32Percorrendo com o olhar, parecia-lhe que Tupence nunca existira.
00:34:36Nenhum talco esparramado, nenhum livro virado para baixo, de capa aberta, marcando a página.
00:34:43—Patrão!
00:34:44—Era Albert!
00:34:45Parado na soleira da porta.
00:34:48—Que é?
00:34:48—Estou ficando preocupado com a galinha.
00:34:51—Ora!
00:34:52A galinha que vá para o inferno!
00:34:54exclamou.
00:34:55—Você parece que não tem outra coisa na cabeça.
00:34:58—Ué!
00:34:59Eu pensei que o senhor e a patroa chegariam o mais tardar às oito.
00:35:02Quero dizer, estariam à mesa no máximo a essa hora.
00:35:06—Foi o que eu também pensei!
00:35:08disse Tommy, olhando o relógio.
00:35:10—Santo Deus!
00:35:12Já faltam vinte e cinco para as nove!
00:35:14—Exatamente!
00:35:15—Patrão!
00:35:16—E a galinha?
00:35:17—Ora essa!
00:35:18atalhou Tommy.
00:35:20Tire-a do forno e vamos comê-la de uma vez.
00:35:22—Bem feito para Tupence!
00:35:24Vou voltar muito antes do jantar.
00:35:27—Pois sim!
00:35:28Claro que algumas pessoas jantam tarde, comentou Albert.
00:35:32—Uma vez estive na Espanha, hein!
00:35:34Acredite!
00:35:35Nunca se conseguia comer antes das dez.
00:35:37—Tá noite!
00:35:39—Veja só!
00:35:40—Pagãos!
00:35:41—Está bem!
00:35:42retrocou Tommy, distraído.
00:35:44—A propósito, não sabe onde ela andou este tempo todo?
00:35:48—O senhor se refere à patroa.
00:35:50—Não sei!
00:35:51—Não!
00:35:51—Correndo por aí!
00:35:53—Acho eu!
00:35:54Pelo que pude entender, a primeira coisa que ela pensou foi viajar de trem.
00:35:59Estava sempre consultando o ABC, com os horários e tudo mais.
00:36:03É!
00:36:04Imagino que cada um se diverte como pode.
00:36:07Ela, pelo jeito, tem um fraco por viajar de trem.
00:36:11Mesmo assim, gostaria de saber onde está.
00:36:14Deserto sentada na sala de espera da estação de um brejo qualquer.
00:36:18Ela sabia que o senhor ia chegar hoje.
00:36:21Não sabia, patrão?
00:36:22Não se preocupe que ela acaba aparecendo.
00:36:25Tenho certeza!
00:36:27Tommy percebeu que estava recebendo um penhor de lealdade.
00:36:30Ele e Albert se achavam solidários em censurar uma tupence que, durante seu idilho com as
00:36:36ferrovias britânicas, negligenciava a pontualidade de receber o marido com um acolhimento condigno.
00:36:43Albert retirou-se para livrar a galinha da possível desgraça de ser cremada no forno.
00:36:48Tommy, que esboçara um gesto para acompanhá-lo, deteve-se e olhou a lareira.
00:36:53Aproximou-se lentamente e contemplou o quadro ali pendurado.
00:36:57Estranho que ela tivesse tanta certeza de ter visto antes aquela casa.
00:37:02Tommy estava absolutamente seguro de que nunca a vira.
00:37:06Em todo caso, parecia-lhe uma casa comum.
00:37:09Devia haver uma porção.
00:37:11Iguais.
00:37:12Espichou-se o máximo que pôde e, como ainda assim não lograsse enxergar bem, tirou-o do
00:37:17gancho e levou-o para perto da lâmpada.
00:37:19Uma residência tranquila e simpática.
00:37:22Trazia a assinatura do pintor.
00:37:24O nome começava por B, embora não desse para entender exatamente.
00:37:29Boussort.
00:37:30Boucher.
00:37:31Conseguiria uma lente de aumento para examinar melhor.
00:37:34Um alegre repique de sincerros veio do vestíbulo.
00:37:39Albert se encantara com os sincerros suíços que Tommy e Tupence compraram certa vez em
00:37:43Grindelwald.
00:37:44Tornará-se um virtuoso em manejá-los.
00:37:47O jantar estava na mesa.
00:37:49Tommy se encaminhou à sala de refeições.
00:37:52Achava esquisito que Tupence ainda não houvesse chegado.
00:37:56Mesmo que tivesse furado um pneu, o que era mais que provável, admirava-se de que não
00:38:01telefonasse para explicar ou se desculpar pelo atraso.
00:38:05Podia adivinhar que eu ficaria preocupado, disse consigo mesmo.
00:38:08Não, naturalmente, que algum dia tivesse ficado, não com Tupence.
00:38:14Sempre saía-se bem em tudo.
00:38:17Albert contrariou essa disposição.
00:38:19Tomara que não tenha sofrido um acidente, observou, oferecendo-lhe um prato de repolho
00:38:24e sacudindo a cabeça de modo lúgubre.
00:38:27Tire isso daqui.
00:38:29Você sabe que eu detesto repolho, disse Tommy.
00:38:32Como?
00:38:33Um acidente.
00:38:34São apenas nove e meia.
00:38:36Andar de carro na estrada hoje em dia é um verdadeiro suicídio, afirmou Albert.
00:38:41Qualquer pessoa pode sofrer um desastre.
00:38:44A campainha do telefone tocou.
00:38:46— É ela! exclamou Albert.
00:38:49Largando logo o prato de repolho no aparador, saiu às pressas da sala.
00:38:54Tommy se levantou, abandonando a galinha, e seguiu.
00:38:58Já estava dizendo, deixe que eu atendo, quando Albert falou.
00:39:02— Alô?
00:39:03— Sim, Mr. Beresford está.
00:39:06Vai atender.
00:39:07Virou-se para Tommy.
00:39:09Um tal de Dr.
00:39:10Murray quer falar com o senhor.
00:39:11— Dr.
00:39:12Murray?
00:39:13Tommy pensou um instante.
00:39:15O nome parecia familiar, mas, de momento, não podia saber quem era.
00:39:19Se Tupan se tivesse sofrido um acidente, e, então, com um suspiro de alívio, lembrou-se
00:39:25de que o Dr.
00:39:26Murray era o médico que atendia as velhas em Sunny Ridge.
00:39:30Talvez fosse algo relacionado com os formulários de óbito de Tia Ada, autêntico filho de
00:39:35nossos dias.
00:39:37Tommy imediatamente supus que se tratava de um problema burocrático qualquer, alguma
00:39:42coisa que deveria ter assinado ou que o Dr.
00:39:44Murray se esquecera de assinar.
00:39:46— Pronto.
00:39:47Atendeu.
00:39:48Aqui é Beresford.
00:39:49— Ah!
00:39:50Que bom que o encontrei em casa.
00:39:53Espero que se recorde de mim.
00:39:55Tratei de sua tia, Miss Fanchave.
00:39:57Me lembro perfeitamente.
00:39:59Sim.
00:40:00Desejava alguma coisa.
00:40:02Precisava muito ter uma conversa com o senhor qualquer dia desses.
00:40:06Que tal se marcássemos um encontro na cidade, talvez?
00:40:10— Sim.
00:40:12— Não?
00:40:13— Não.
00:40:14— Perfeitamente.
00:40:15Mas...
00:40:161.
00:40:17O assunto não pode ser tratado pelo telefone.
00:40:18Preferia que não.
00:40:19Não há tanta urgência.
00:40:21Não vou dizer que haja, porém gostaria de ter uma conversa com o senhor.
00:40:26— Alguma coisa errada?
00:40:28— Perguntou Tommy, surpreso por se expressar dessa maneira.
00:40:31— Porque haveria alguma coisa errada?
00:40:34— De fato, não.
00:40:35Talvez eu esteja fazendo tempestade em copo d'água.
00:40:39Provavelmente estou.
00:40:40Porém, ocorreram certos acontecimentos bem curiosos em Sunny Ridge nesses últimos tempos.
00:40:46Nada em relação a Mr. Lancaster, não é?
00:40:50— Perguntou Tommy.
00:40:51— Mr. Lancaster.
00:40:52— O médico pareceu surpreso.
00:40:54— Oh, não.
00:40:56Ela foi embora já há algum tempo.
00:40:58Creio mesmo que...
00:40:59— Antes da morte de sua tia.
00:41:02Trata-se de algo bem diferente.
00:41:04Estive fora.
00:41:05Acabo de chegar.
00:41:07— Quem sabe não seria melhor eu ligar para o senhor amanhã de manhã?
00:41:11Então combinaríamos.
00:41:12— Perfeito.
00:41:13Deixo-lhe meu telefone.
00:41:15Estarei na clínica até às dez.
00:41:18— Más notícias.
00:41:19— Indagou Albert quando Tommy voltou à sala de refeições.
00:41:23— Pelo amor de Deus!
00:41:25Albert!
00:41:26— Pare de bancar a ave de mau agouro.
00:41:28— Retrocou Tommy, irritado.
00:41:30— Não.
00:41:31Claro que não foram más notícias.
00:41:33Pensei talvez que a patroa...
00:41:35No dia seguinte, porém, não houve carta nem telefonema nem telegrama.
00:41:41Albert olhou para Tommy, abriu e fechou a boca várias vezes, julgando com toda a razão
00:41:46que previsões sombrias de sua parte não seriam bem recebidas.
00:41:50Finalmente, Tommy se compadeceu dele, engoliu um último naco de torrada, coberto de geleia
00:41:56de laranja e misturado com um pouco de café, e disse...
00:42:01— Está bem.
00:42:02Albert, deixe que a pergunta parta de mim.
00:42:05Onde anda ela?
00:42:06— O que lhe aconteceu?
00:42:07E o que devemos fazer?
00:42:10— Chamar a polícia.
00:42:11— Patrão?
00:42:12— Não tenho certeza.
00:42:13Escute.
00:42:14Fez uma pausa.
00:42:16Se ela sofreu um desastre.
00:42:18Mas tinha a carteira de motorista e uma porção de documentos de identidade.
00:42:23Os hospitais são muito rápidos para comunicar essas coisas, entrar em contato com parentes
00:42:28e tudo mais.
00:42:29— Não quero me precipitar.
00:42:31Ela...
00:42:32Ela...
00:42:33— Talvez não queira.
00:42:34— Você não tem nenhuma ideia.
00:42:35— Nenhuma mesmo.
00:42:37Albert, para onde ela tensionava a ir?
00:42:41— Nada que tenha dito.
00:42:42Um lugar, uma região especial, nenhuma referência a um nome qualquer.
00:42:48Albert sacudiu a cabeça.
00:42:49Como era o jeito dela?
00:42:51Alegre.
00:42:52Agitada.
00:42:53Triste.
00:42:54Inquieta.
00:42:55A resposta de Albert foi instantânea.
00:42:58Três da vida.
00:43:00Estourando de contentamento.
00:43:01— Que nem um perdigueiro no rastro!
00:43:04— disse Tommy.
00:43:05— Isso mesmo.
00:43:06Patrão, o senhor sabe como ela fica?
00:43:09— Atrás de alguma pista.
00:43:11Só queria saber.
00:43:13Parou para refletir.
00:43:14Alguma coisa aconteceu e, tal como acabava de dizer a Albert, Tupen se saiu correndo
00:43:20como um perdigueiro de bom faro.
00:43:22Antiontem telefonou, avisando que ia chegar.
00:43:25— Por quê?
00:43:26— Então, não voltou.
00:43:28— Mas neste momento — pensou Tommy — esteja sentada em algum lugar, pregando mentiras
00:43:34com tanto prazer que se esqueceu do resto.
00:43:37Se andava empenhada nalguma busca, ficaria extremamente aborrecida se ele se abalasse
00:43:42a avisar a polícia, balindo feito um carneiro, que a esposa tinha desaparecido.
00:43:47Parecia ouvi-la.
00:43:48Como é que você pode ser tão boboca para fazer uma coisa dessas?
00:43:53Sou perfeitamente capaz de cuidar de mim mesma.
00:43:56Já era tempo que soubesse disso, mas seria, de fato, capaz.
00:44:02Nunca se podia saber com certeza aonde a imaginação de Tupen se alevaria.
00:44:06Há algum risco.
00:44:08Por enquanto não se manifestara nenhuma evidência de perigo nessa história, exceto, conforme
00:44:14se observou há pouco, na própria imaginação de Tupen se.
00:44:18Se fosse a polícia declarando que a esposa não viera para casa como pretendia, haviam
00:44:24de ficar sentados, muito comedidos, porém, no mínimo, rindo a socapa, e, depois, com
00:44:30absoluta certeza e sempre guardando o maior tato, perguntariam quem eram os amigos dela.
00:44:35—Tenho de encontrá-la sozinho, disse Tommy.
00:44:39Há de estar em algum lugar.
00:44:41Seja norte, sul, leste ou oeste, pouco se me dá.
00:44:45Só sei que foi uma verdadeira biruta em não deixar uma indicação qualquer sobre onde
00:44:50se achava quando telefonou.
00:44:52—Mas caísse nas mãos de uma quadrilha, sugeriu Albert.
00:44:56—Ora, deixe de criancices, Albert.
00:45:00Você já está taludo demais para esse tipo de brincadeira.
00:45:03—Que tenciona fazer, patrão?
00:45:06—Irei a Londres, declarou Tommy, consultando o relógio.
00:45:10Primeiro vou almoçar no clube com o doutor Murray, que ligou ontem à noite e quer me
00:45:15falar alguma coisa relacionada aos negócios de minha falecida tia.
00:45:19É possível que me dê algum palpite aproveitável.
00:45:22Afinal de contas, a história toda começou em Sunny Ridge.
00:45:26Também pretendo levar junto aquele quadro pendurado em cima da lareira do nosso quarto.
00:45:32Quer dizer que vai levá-lo a Scotland Yard?
00:45:35—Não, respondeu Tommy.
00:45:37Vou levá-lo a Bondi Street.
00:45:40CAPÍTULO XI BONDI STREET, DOUTOR MURRAY
00:45:43Tommy saltou do táxi, pagou a corrida e curvou-se de novo para retirar do interior um pacote
00:45:49mal feito que continha, obviamente, um quadro.
00:45:52Sobraçando da melhor forma que pôde, entrou na New Athenian Galeries, uma das mais tradicionais
00:45:58e importantes galerias de pintura em Londres.
00:46:01Tommy não era um grande comprador de quadros, porém viera à New Athenian porque um amigo
00:46:05oficiava ali.
00:46:07Oficiava era bem o termo, devido ao seu ar de interesse solícito, a voz abafada, o sorriso
00:46:13conciliatório, tudo extremamente eclesiástico.
00:46:17Um rapaz louro abandonou o que estava fazendo e aproximou-se, iluminado por um sorriso de
00:46:22reconhecimento.
00:46:23—Olá, Tommy, disse, há quanto tempo não nos vemos, que é isto que você traz debaixo
00:46:30do braço?
00:46:31Não me diga que resolveu dedicar-se à pintura depois de velho.
00:46:35Muita gente inventa de fazer o mesmo, com resultados geralmente deploráveis.
00:46:40Duvido que a pintura criativa alguma vez tenha sido o meu forte, retrocou Tommy, embora deva
00:46:46confessar que ainda outro dia me senti fortemente atraído por um livrinho que ensinava, nos
00:46:51termos mais simples, como uma criança de cinco anos podia pintar em aquarela.
00:46:57Deus nos livre que você comece isso!
00:46:59— Vovó Moses ao inverso.
00:47:01— Para ser franco, Robert, queria apenas consultar sua opinião de técnico em pintura.
00:47:08Diga o que acha disto.
00:47:10Robert tomou jeitosamente o quadro das mãos de Tommy e desembrulhou com perícia o pacote
00:47:15mal feito, revelando a habilidade de um homem acostumado a lidar com qualquer tipo de embalagem
00:47:20de obras de arte dos tamanhos mais diversos.
00:47:23Retirou o quadro e colocou-o numa cadeira, curvando-se para examiná-lo bem.
00:47:28E depois recuou cinco ou seis passos.
00:47:31Olhou para Tommy.
00:47:33— Então?
00:47:34— Perguntou.
00:47:35— Qual é o problema?
00:47:36— O que é que você quer saber?
00:47:38— Pretende vendê-lo.
00:47:39— Por acaso?
00:47:40— Não.
00:47:41— Respondeu Tommy.
00:47:42— Não pretendo.
00:47:43— Não?
00:47:45— Robert, quero apenas uma informação.
00:47:48Para começar, quem é o pintor?
00:47:50Pois olhe, se quiser vendê-lo, a ocasião não podia ser melhor.
00:47:54Há dez anos seria diferente.
00:47:57Mas hoje a pintura de Boscovan está de novo em moda.
00:48:00— Boscovan?
00:48:02— Tommy fez um ar interrogativo.
00:48:03— É esse o nome dele?
00:48:05Notei que a assinatura começava por B, mas não consegui decifrar.
00:48:09— Ah!
00:48:11Nem há dúvida de que é dele.
00:48:13Fui grande voga há cerca de vinte e cinco anos.
00:48:16Vendia bem.
00:48:17Fez uma porção de exposições.
00:48:19E todo mundo comprava.
00:48:21Tecnicamente, tinha um estilo perfeito.
00:48:24Depois, como sempre acontece, a febre passou e mal conseguia vender um quadro.
00:48:30Ultimamente, porém, recuperou a popularidade.
00:48:34Ele, Stichort e Fondela estão todos voltando.
00:48:38— Boscovan?
00:48:40— Repetiu Tommy.
00:48:41— B-O-S-C-O-W-N?
00:48:43— Escandiu Robert.
00:48:44Prestativo.
00:48:45— Continua pintando.
00:48:47— Não.
00:48:48Morreu.
00:48:49Faz alguns anos.
00:48:50Já era bem velho.
00:48:52Creio que devia ter uns sessenta e cinco quando morreu.
00:48:55Muito prolífico.
00:48:56Sabe, deixou uma infinidade de telas.
00:49:00Para dizer a verdade, estamos pensando em organizar uma mostra da obra dele aqui na loja dentro de uns quatro ou cinco meses.
00:49:07Acho que será um bom negócio.
00:49:09— Por que todo esse interesse por ele?
00:49:12— Seria uma história muito longa para contar.
00:49:14Respondeu Tommy.
00:49:16— Qualquer dia destes, eu convido você para almoçar e esclareço tudo desde o início.
00:49:21É muito comprida, complicada e realmente muito boba.
00:49:25Eu somente queria saber quem era esse Boscovan e se, por acaso, não podia me informar onde fica a casa deste quadro.
00:49:32Quanto a isso, não tenho a menor ideia.
00:49:34É o tipo de coisa que ele gostava de pintar, sabe?
00:49:38Pequenas casas rurais, geralmente situadas em locais solitários, às vezes uma granja, outras com um par de vacas por perto.
00:49:47Se incluía alguma carroça, via-se apenas de longe.
00:49:50Calmas cenas bucólicas.
00:49:52Nada de esboços ou borrões.
00:49:54Certas ocasiões a superfície do quadro parece quase de esmalte.
00:49:59Era uma técnica sui generis, muito apreciada.
00:50:02Grande parte dos temas que pintou foram feitos na França, a maioria na Normandia.
00:50:07Existe uma tela dele atualmente aqui na galeria.
00:50:11Espere um instante que eu busco.
00:50:13Chegou à beira da escada e chamou alguém lá embaixo.
00:50:16Não demorou muito.
00:50:18Voltou com um pequeno quadro na mão e colocou-o em cima de outra cadeira.
00:50:22— Pronto!
00:50:23Cá está! — disse.
00:50:25— Igreja na Normandia?
00:50:27— Sim!
00:50:27— Concordou Tommy.
00:50:29— Percebo.
00:50:30O mesmo tipo de coisa.
00:50:32Minha mulher diz que ninguém jamais morou naquela casa, a do quadro que eu trouxe.
00:50:37Agora entendo ao que ela se referia.
00:50:39Duvido que alguém tivesse assistido ou venha assistir missa nesta igreja.
00:50:44— É, provavelmente tem razão.
00:50:46Moradas tranquilas, pacíficas, sem nenhum morador.
00:50:50Ele quase não pintava gente, sabe?
00:50:53Às vezes surge uma que outra figura na paisagem, mas é muito raro.
00:50:58De certo modo, acho que lhes dá um encanto especial, uma espécie de sensação de isolamento.
00:51:04Era como se ele removesse todos os seres humanos e a paz dos campos ficasse muito melhor sem eles.
00:51:10Pensando bem, talvez seja por isso que o gosto do público se inclinasse de novo por ele.
00:51:16Hoje em dia há gente demais.
00:51:18Carros, barulho nas ruas, um excesso de ruídos e agitação.
00:51:23Paz, uma paz inalterável.
00:51:25Tudo entregue à natureza.
00:51:27Sim, não me admiro.
00:51:29Que tipo de homem foi ele?
00:51:31Não o conheci pessoalmente.
00:51:33Não é do meu tempo.
00:51:35Presumido, segundo dizem, no mínimo se julgava melhor pintor do que de fato era.
00:51:41O protótipo do Garganta.
00:51:43Afável, bastante simpático.
00:51:45Mulherengo.
00:51:46E não faz nenhuma ideia de onde fica esta região, porque é na Inglaterra, suponho.
00:51:52Sim, creio que é.
00:51:54Quer que o descubra para você.
00:51:56Acha possível?
00:51:57Provavelmente, a melhor coisa a fazer seria perguntar à mulher dele, isto é, à viúva.
00:52:04Era casado com Emma Wieg, a escultora.
00:52:07Famosa, não muito produtiva.
00:52:09Tem uma obra realmente vigorosa.
00:52:12Você poderia procurá-la.
00:52:14Mora em Amstead.
00:52:15Se quiser, dou-lhe o endereço.
00:52:18Trocamos bastante correspondência ultimamente a respeito desta exposição dos trabalhos do marido que está programada.
00:52:24Vamos aproveitar para incluir algumas peças menores de suas esculturas.
00:52:29Vou buscar o endereço para você.
00:52:31Foi a escrivaninha.
00:52:33Folheou um livro razão.
00:52:35Rabiscou qualquer coisa num cartão e trouxe de volta.
00:52:38Pronto.
00:52:39Tome.
00:52:40Disse.
00:52:41Não sei que mistério insondável é esse.
00:52:43Você sempre foi dado a enigmas.
00:52:45Não?
00:52:46Tenhai um belo exemplar da obra do homem.
00:52:49Talvez pudéssemos usá-lo na exposição.
00:52:52Quando chegar perto da data, eu lhe escrevo.
00:52:55Para lembrar.
00:52:56Não conhece uma tal de Mr. Lancaster?
00:52:58Por acaso?
00:53:00Olhe.
00:53:00Assim de momento.
00:53:02Creio que não.
00:53:03É pintora ou troço parecido.
00:53:05Não me consta que seja.
00:53:07É apenas uma senhora idosa vivendo seus derradeiros anos num asilo de velhice.
00:53:12Ela entra na história porque este quadro lhe pertencia antes de dá-lo de presente a uma tia minha.
00:53:18Pois não posso dizer que o nome signifique alguma coisa para mim.
00:53:22É melhor você falar com Mrs. Boscova.
00:53:25Como é ela?
00:53:26Era bem mais moça que o marido, acho eu.
00:53:29Uma personalidade e tanto.
00:53:31Sacudiu a cabeça umas duas vezes.
00:53:34Sim.
00:53:35Uma personalidade e tanto.
00:53:37Como no mínimo você verá.
00:53:39Pegou o quadro e entregou-o do alto da escada,
00:53:42pedindo a alguém no andar térreo para embrulhá-lo de novo.
00:53:45Que bom para você.
00:53:46Ter tantos lacaios à disposição, ironizou Tommy.
00:53:50Olhou ao redor, reparando pela primeira vez no ambiente.
00:53:54Que negócio é aquele pendurado ali?
00:53:57Perguntou com repugnância.
00:53:59Pouja Jerozki.
00:54:00Um jovem eslavo interessante.
00:54:02Consta que produz todas as suas obras sob a influência de drogas.
00:54:07Não gosta.
00:54:08Tommy concentrou o olhar numa grande sacola de corda que parecia ter se emaranhado num campo verde metálico cheio de vacas deformadas.
00:54:16— Francamente, não.
00:54:18— Feliz teu! — retrucou Robert.
00:54:21— Venha. Vamos almoçar juntos.
00:54:23— Não posso.
00:54:24Marquei encontro com o médico no clube.
00:54:27— Você não está doente?
00:54:29— Está. Estou ótimo.
00:54:31Minha pressão é tão boa que decepciona cada.
00:54:34— Doutor, que eu consulto.
00:54:36— Então, por que precisa falar com ele?
00:54:38— Ora, — disse Tommy alegremente, — é só por causa de um cadáver.
00:54:43Obrigado pelo auxílio.
00:54:45Até à vista.
00:54:46Tommy cumprimentou o doutor Murray com certa curiosidade.
00:54:50Presumia que se tratasse de alguma formalidade relacionada à morte de tia Ada,
00:54:55mas não conseguia imaginar por que diabos o médico não queria nem sequer tocar no assunto pelo telefone.
00:55:01— Desculpe o atraso — disse o doutor Murray, apertando-lhe a mão,
00:55:05mas o trânsito estava um caso sério e eu não tinha muita certeza da localização.
00:55:10— Não conheço bem esta parte de Londres.
00:55:13— Pois é uma pena que tivesse de vir até aqui — replicou Tommy.
00:55:17— Podíamos ter marcado o encontro num ponto mais conveniente.
00:55:21— Quer dizer, então, que de momento está disponível?
00:55:25— De momento, sim. Estive ausente na semana passada.
00:55:29— Ah, é. Creio que alguém me disse quando liguei para a sua casa.
00:55:33Tommy indicou uma poltrona, sugeriu um drink e colocou cigarros e fósforos ao lado do doutor Murray.
00:55:40Depois que ambos se instalaram à vontade, o médico começou a falar.
00:55:44— Tenho certeza de que lhe despertei a curiosidade, mas, para ser franco, houve um transtorno em Sunny Ridge.
00:55:51Trata-se de um problema difícil e intrincado que, por um lado, nada tem a ver com o senhor.
00:55:58Não possuo o mínimo direito de aborrecê-lo com isso,
00:56:01porém há uma leve probabilidade de que talvez saiba alguma coisa que possa me ajudar.
00:56:07— Bem, claro que farei tudo o que estiver a meu alcance.
00:56:10Trata-se de algo relacionado com minha tia, Miss Funchave, não de modo direto.
00:56:16No entanto, de certa forma, desrespeito também a ela.
00:56:20Posso falar-lhe confidencialmente? Não posso, Mr. Beresford.
00:56:25Naturalmente que sim.
00:56:27Para dizer a verdade, outro dia estive conversando com um amigo comum e ele me contou algumas coisas a seu respeito.
00:56:34Soube que, durante a última guerra, teve uma missão bastante melindrosa.
00:56:39— Eu não diria que fosse tão séria assim — retrocou Tommy, da maneira mais neutra possível.
00:56:45— Oh! Não! Compreendo perfeitamente que é uma coisa que não se pode comentar.
00:56:50Acho que hoje, de fato, não tem mais importância.
00:56:53A guerra aconteceu há muito tempo. Minha esposa e eu éramos jovens na época.
00:56:59Em todo caso, nada tem a ver com o motivo por que quero falar-lhe.
00:57:03Mas, assim ao menos, sinto que posso fazê-lo com franqueza,
00:57:07confiante de que não repetirá o que lhe estou dizendo,
00:57:10embora seja possível que, mais tarde, tudo venha a público.
00:57:13Houve um transtorno em Sunny Ridge, pelo que entendi?
00:57:17— Sim. Há pouco tempo, uma de nossas pacientes morreu.
00:57:21— Uma tal de Mr. Smoad?
00:57:23Não sei se chegou a conhecê-la ou se sua tia alguma vez a mencionou.
00:57:27— Mr. Smoad? — Tommy refletiu.
00:57:30— Não. Tenho a impressão de que não.
00:57:33— Seja como for, não me lembro. Não era das mais velhas.
00:57:37Tinha pouco mais de setenta e não sofria de nenhuma espécie de moléstia grave.
00:57:42Tratava-se apenas de uma mulher sem parentes próximos,
00:57:45que não dispunha de ninguém para cuidar dela na vida doméstica.
00:57:49Pertencia à categoria que eu chamo de irrequieta.
00:57:52Criaturas que, à medida que envelhecem, ficam cada vez mais parecidas com galinhas.
00:57:58Cacarejam, esquecem coisas, arrumam dificuldades e depois se preocupam.
00:58:04Atrapalham-se todas sem o menor motivo. Não há praticamente nada errado com elas.
00:58:10Rigorosamente falando, não sofrem de distúrbios mentais.
00:58:14Porém, não param de cacarejar, sugeriu Tommy.
00:58:18Justamente. Mr. Smoad era assim.
00:58:21Provocava grande confusão entre as enfermeiras, apesar de simpatizarem com ela.
00:58:26Tinha o hábito de esquecer que já havia comido,
00:58:29fazendo um estardalhaço por não ter recebido a refeição quando, na verdade,
00:58:34acabará realmente de devorar um lauto jantar.
00:58:37—Ah! exclamou Tommy, lembrando-se.
00:58:40—Dona Chocolate, como disse?
00:58:43—Desculpe, pediu Tommy.
00:58:45É o apelido que minha mulher e eu lhe tínhamos dado.
00:58:48Um dia, quando passamos pelo corredor, ela saiu aos berros,
00:58:53chamando a enfermeira Jane para reclamar que não havia ganho seu chocolate.
00:58:57Uma mulherzinha desmiolada muito simpática.
00:59:00Caímos na risada e pegamos o costume de chamá-la de Dona Chocolate.
00:59:05—Quer dizer, então, que morreu?
00:59:07Não fiquei especialmente surpreso com sua morte,
00:59:11prosseguiu o Dr. Murray.
00:59:13É praticamente impossível profetizar com exatidão a época em que uma senhora idosa há de morrer.
00:59:19Algumas, cuja saúde se encontra seriamente afetada
00:59:22e que, após o resultado de um exame físico,
00:59:25a gente acha que mal resistirão até o fim do ano,
00:59:28duram às vezes mais de dez.
00:59:30Agarram-se à vida com tal empenho
00:59:32que uma simples deficiência física não é capaz de derrotá-las.
00:59:36Em compensação, há outras, de saúde relativamente boa
00:59:40e que dão a impressão de que se transformarão em macróbias.
00:59:43De repente, pegam uma bronquite ou gripe,
00:59:47demonstram falta da estamina indispensável ao pronto restabelecimento
00:59:51e morrem com espantosa facilidade.
00:59:54Portanto, como eu estava dizendo,
00:59:56na qualidade de médico de um asilo de senhoras idosas,
01:00:00não me sinto surpreso quando ocorre o que se pode denominar de uma morte mais ou menos imprevista.
01:00:05No caso de Mr. Smoad, contudo, foi um pouco diferente.
01:00:10Faleceu durante o sono sem ter acusado nenhum sintoma de moléstia
01:00:14e não tive outro remédio senão considerar sua morte como inesperada.
01:00:19Empregarei a frase que sempre me intrigou no Macbeth, de Shakespeare.
01:00:23Só queria o que ele quis dizer ao se referir à esposa.
01:00:27Ela devia ter morrido mais adiante.
01:00:30De fato, lembro-me de que também fiquei pensando na intenção de Shakespeare.
01:00:34Concordou Tommy?
01:00:36Esqueci de quem era a encenação e qual o ator que interpretava Macbeth,
01:00:40mas havia uma forte sugestão na montagem
01:00:42e Macbeth certamente fazia tudo para dar a impressão de que estava insinuando ao médico
01:00:47que lei de Macbeth precisava ser eliminada.
01:00:50É de presumir que o médico tenha compreendido.
01:00:53Foi então que Macbeth, sentindo-se seguro após a morte da esposa,
01:00:58sabendo que ela não poderia mais prejudicá-lo com suas indiscrições
01:01:02ou seu cérebro rapidamente em declínio, exprime autêntica afeição e pesar.
01:01:07Ela devia ter morrido mais adiante.
01:01:10Exatamente. Retrocou o doutor Murray.
01:01:13Assim me senti eu em relação a Mr. Smoad.
01:01:16Achei que devia ter morrido mais tarde.
01:01:19Não há três semanas. Sem motivo aparente.
01:01:22Tommy não respondeu.
01:01:23Contentou-se em fitar o médico com um olhar de expectativa.
01:01:27A nossa profissão oferece certos problemas.
01:01:30Quando se fica perplexo com a causa-mortes de um paciente,
01:01:34só existe uma maneira de certificar-se.
01:01:37Através da autópsia.
01:01:39Os parentes da pessoa falecida não gostam.
01:01:41Mas se o médico exige e o resultado for, como pode perfeitamente acontecer,
01:01:47um caso de morte natural ou de alguma doença ou mal
01:01:50que nem sempre apresentam sinais externos ou sintomas,
01:01:53então a sua carreira profissional se expõe a ficar seriamente comprometida
01:01:57por ter emitido um diagnóstico duvidoso.
01:02:00Percebo que há de ter sido delicado.
01:02:02Os parentes em questão são primos distantes.
01:02:05Por isso me encarreguei de obter o consentimento deles,
01:02:09uma vez que apurar a causa da morte constituía matéria de interesse científico.
01:02:14Se um paciente sucumbe durante o sono,
01:02:16é aconselhável aumentar os conhecimentos médicos da gente.
01:02:20Dissimulei um pouco.
01:02:21Note-se, não tornei a coisa demasiado formal.
01:02:25Felizmente, nem se importaram.
01:02:27Fiquei com o espírito bem aliviado.
01:02:30Quando, após a autópsia, encontrasse tudo em ordem,
01:02:34podia dar um atestado de óbito sem o menor receio.
01:02:37Qualquer pessoa é capaz de morrer do que se denomina vulgarmente colapso cardíaco,
01:02:43cujas causas podem ser as mais diversas.
01:02:45Para falar a verdade,
01:02:47o coração de Mr. Smoj estava, de fato, em condições excelentes para a idade que tinha.
01:02:52Sofria de artrite e reumatismo,
01:02:55além de distúrbios ocasionais do fígado,
01:02:57porém nenhuma dessas coisas parecia responsável pelo seu falecimento durante o sono.
01:03:02O Dr. Murray fez uma pausa.
01:03:05Tommy abriu a boca e tornou a fechá-la.
01:03:07O médico sacudiu a cabeça.
01:03:09— Sim, Mr. Beresford.
01:03:12Vejo que entendeu aonde pretendo chegar.
01:03:14A morte foi consequência de uma dose excessiva de morfina.
01:03:18— Santo Deus!
01:03:19A exclamação lhe escapou, enquanto os olhos se arregalavam.
01:03:24— É, parece incrível.
01:03:26Mas a análise provou de maneira irrefutável.
01:03:29Surgiu a dúvida.
01:03:30Como teria sido administrada?
01:03:33Ela não tomava morfina.
01:03:35Não era uma paciente que sofresse dores.
01:03:37Restavam três explicações.
01:03:40Evidentemente,
01:03:41talvez tivesse tomado por acaso.
01:03:43É implausível.
01:03:45Podia também ter se apossado,
01:03:47por engano,
01:03:48do remédio destinado a outra doente,
01:03:51porém essa hipótese é inverossímil.
01:03:53Ninguém deixa um estoque de morfina nas mãos de um paciente
01:03:56e o asilo não admite pessoas veciadas
01:03:59que possam dispor de um abastecimento de uma coisa dessas em seu poder.
01:04:03Se se tratasse de um suicídio premeditado,
01:04:06eu me surpreenderia bastante.
01:04:08Mr. Smody,
01:04:09embora se preocupasse à toa com ninharias,
01:04:12gozava de uma disposição perfeitamente alegre
01:04:15e estou certo de que nunca pensou em terminar com a própria vida.
01:04:19A terceira explicação é que a dose fatal lhe fosse administrada de modo proposital.
01:04:24Mas por quem?
01:04:25E por quê?
01:04:26Naturalmente que Miss Packard,
01:04:28em sua qualidade de enfermeira hospitalar diplomada e superintendente,
01:04:32está perfeitamente autorizada a ter estoques de morfina
01:04:36e outros entorpecentes em seu poder e que guarda no armário,
01:04:39trancados à chave.
01:04:41Em tais casos como ciática e artrite reumática,
01:04:44pode ocorrer uma dor tão aguda e desesperada
01:04:47que de vez em quando torna-se indispensável o uso da droga.
01:04:51Tínhamos esperança de descobrir alguma circunstância
01:04:54em que Mr. Smody pudesse ter recebido
01:04:56qualquer quantidade perigosa de morfina por engano
01:04:59ou que ela própria tivesse tomado,
01:05:02na ilusão de que curasse indigestão ou insônia.
01:05:05Porém, não logramos apurar a menor possibilidade.
01:05:08Decidimos, então,
01:05:09por sugestão de Miss Packard e concordância minha,
01:05:12examinar cuidadosamente o registro de mortes
01:05:15em situações semelhantes que ocorreram em Sunny Ridge durante os últimos dois anos.
01:05:20Ainda bem que foram raros.
01:05:22Ao todo, creio que sete,
01:05:24o que representa uma média razoável
01:05:26para as pessoas pertencentes a esse grupo de idade.
01:05:29Dois casos de bronquite.
01:05:31Absolutamente normais.
01:05:33Dois de gripe.
01:05:34Quase sempre fatais nos meses de inverno,
01:05:36em virtude da pouca resistência oferecida por mulheres frágeis e idosas.
01:05:41E mais três.
01:05:42Hesitou alguns segundos e depois continuou.
01:05:45Mr. Beresford,
01:05:47não me sinto satisfeito a respeito desses últimos,
01:05:50pelo menos decididamente, em relação a dois óbitos.
01:05:54Eram perfeitamente prováveis.
01:05:56Nada imprevistos.
01:05:57Porém, eu me atreveria a afirmar que são implausíveis.
01:06:01Não se trata de casos que,
01:06:03examinados em retrospecto,
01:06:05à luz da reflexão e pesquisa,
01:06:07me deixem inteiramente convencidos.
01:06:09Por incrível que pareça,
01:06:11tem-se de aceitar a possibilidade de que existe alguém em Sunny Ridge que é,
01:06:15talvez por motivos mentais,
01:06:17um assassino.
01:06:18Um criminoso de quem ninguém desconfia.
01:06:21Fez-se silêncio durante um certo momento.
01:06:24Tom me deu um suspiro.
01:06:25Não duvido do que me contou,
01:06:27disse,
01:06:28mas, mesmo assim,
01:06:29francamente,
01:06:30parece inacreditável.
01:06:32Essas coisas
01:06:33certamente não podem acontecer.
01:06:36Nisso o senhor se engana.
01:06:38Retrocou o implacável o Dr. Murray.
01:06:40Acontecem, sim.
01:06:41Tomemos,
01:06:42por exemplo,
01:06:44certos casos patológicos.
01:06:46Uma mulher que fazia serviço doméstico.
01:06:49Trabalhou como cozinheira em diversas casas de família.
01:06:52Era simpática,
01:06:54bondosa,
01:06:55aparentemente agradável,
01:06:56fiel aos patrões,
01:06:58cozinhando bem,
01:06:59gostando de estar em sua companhia.
01:07:01No entanto,
01:07:02cedo ou tarde,
01:07:04aconteciam coisas.
01:07:05Em geral, um prato de sanduíches.
01:07:08Às vezes,
01:07:09farnés de piquenique.
01:07:11Sem o mínimo motivo,
01:07:12continham arsênico.
01:07:14Numa pilha de sanduíches,
01:07:16apenas dois ou três estavam envenenados.
01:07:19Pelo visto,
01:07:20somente o acaso determinava quem os comeria.
01:07:23Parecia não existir maldade pessoal.
01:07:26De vez em quando,
01:07:27evitava-se a tragédia.
01:07:29A mesma mulher ficava três ou quatro meses no emprego,
01:07:32sem que se registrasse o menor vestígio de doença.
01:07:35Nada.
01:07:36De repente, mudava de casa.
01:07:38Num prazo de três semanas,
01:07:40dois membros da família morriam depois de comer bacon no café da manhã.
01:07:44O fato de que todas essas coisas sucedessem em diferentes regiões da Inglaterra
01:07:49e a intervalos regulares,
01:07:50fez com que a polícia demorasse algum tempo para achar a pista.
01:07:54Claro que ela sempre trocava de nome.
01:07:56Mas há tantas mulheres de meia-idade simpáticas,
01:07:59eficientes e que sabem cozinhar,
01:08:01que foi difícil encontrar a que estavam procurando.
01:08:04Por que ela fazia isso?
01:08:06Não creio que alguém tenha realmente descoberto.
01:08:09Houve várias teorias contraditórias,
01:08:12sobretudo de psicólogos.
01:08:14É óbvio.
01:08:15Era uma espécie de fanática religiosa
01:08:17e é provável que uma determinada forma de loucura mística
01:08:20lhe desse a sensação de que possuía uma missão divina
01:08:23para livrar o mundo de certas pessoas,
01:08:26pois não consta que lhes devotasse qualquer animosidade especial.
01:08:30Depois surgiu também aquela francesa,
01:08:32Jeanne Gebron,
01:08:33que se intitulava o Anjo da Piedade.
01:08:36Ficava tão preocupada quando adoecia o filho de algum vizinho
01:08:40que corria para cuidar da criança.
01:08:42Zelava noite e dia à cabeceira.
01:08:44Nesse caso também levou certo tempo até descobrirem
01:08:48que os objetos de sua solicitude nunca se restabeleciam.
01:08:51Em vez disso, todos morriam.
01:08:54De novo.
01:08:55Por quê?
01:08:56É verdade que perderá o próprio filho quando moça.
01:08:59A desgraça a deixou prostrada de dor.
01:09:02Talvez fosse a causa de sua carreira criminosa.
01:09:05Se o filho dela tinha morrido,
01:09:07todos os outros também deviam morrer.
01:09:09Ou, conforme alguns pensaram,
01:09:12talvez o próprio filho também tivesse sido uma das vítimas.
01:09:16Estou sentindo um calafrio na espinha, disse Tommy.
01:09:19Citei os exemplos mais melodramáticos.
01:09:22Retrocou o médico.
01:09:23Pode tratar-se de algo bem mais simples.
01:09:26Lembra-se do caso Armstrong?
01:09:28Qualquer pessoa que o ofendesse ou o insultasse,
01:09:31às vezes bastava ele pensar que tivesse sido insultado.
01:09:35Via-se logo convidada a tomar chá com sanduíches de arsênico.
01:09:39Uma espécie de suscetibilidade em último grau.
01:09:42Seus primeiros crimes foram, obviamente,
01:09:45meros homicídios para obter vantagens pessoais.
01:09:48Heranças à eliminação da esposa para se casar com outra.
01:09:51Houve também o caso da enfermeira Vahiner,
01:09:54que mantinha um asilo.
01:09:56Todos lhe confiavam os bens que possuíam
01:09:58em troca da garantia de uma velhice confortável
01:10:01pelo resto da vida, que nunca era muito longa.
01:10:04Aplicava lismorfina.
01:10:06Também, uma mulher incrivelmente bondosa,
01:10:09mas totalmente destituída de escrúpulos,
01:10:11creio que se considerava uma bem-feitora.
01:10:14Se sua suposição sobre essas mortes é válida,
01:10:17não tem nenhuma ideia de quem possa ser?
01:10:20Não.
01:10:21Parece não haver indicação de espécie alguma.
01:10:24Admitindo-se a hipótese de que o assassino
01:10:26sofra provavelmente das faculdades mentais,
01:10:29a loucura é uma coisa muito difícil de reconhecer
01:10:32em determinadas manifestações.
01:10:35Será alguém, digamos, que detesta a gente velha,
01:10:38que teve a vida prejudicada ou arruinada,
01:10:41pelo menos na sua opinião, por alguma pessoa idosa?
01:10:45Ou se trata, talvez, de alguém que tem
01:10:48uma concepção própria da eutanásia
01:10:50e acha que todo mundo com mais de 60 anos de idade
01:10:53deve ser exterminado sem dor?
01:10:55Podia ser qualquer um, naturalmente.
01:10:58Uma paciente, ou um membro da equipe,
01:11:01uma enfermeira ou uma empregada doméstica.
01:11:04Discuti o assunto longamente com Melissa Packard,
01:11:07a administradora do estabelecimento.
01:11:10É uma mulher muito competente, sagaz, prática,
01:11:14com absoluto controle tanto das hóspedes
01:11:17como das subalternas.
01:11:18Ela insiste que não possui a menor suspeita
01:11:21ou indício de qualquer espécie
01:11:23e eu tenho certeza de que é a pura verdade.
01:11:25Mas por que me procurou?
01:11:27O que posso fazer?
01:11:29Sua tia, Miss Fanchave, morou lá alguns anos,
01:11:32era uma criatura de apreciável inteligência,
01:11:36embora muitas vezes fingisse ser o contrário.
01:11:40Dispunha de recursos nada convencionais
01:11:42para se divertir, adotando ar e ceniz,
01:11:45quando na realidade tinha a cabeça bem no lugar.
01:11:48O que eu gostaria que o senhor fizesse,
01:11:51Mr. Beresford, é procurar lembrar-se
01:11:53com exatidão e sua esposa, também.
01:11:57Existe algo que se recorde de ter ouvido
01:11:59Miss Fanchave comentar ou insinuar
01:12:01que nos fornecesse uma pista,
01:12:04algo que ela tivesse visto ou notado,
01:12:06que alguém lhe contasse e que julgasse esquisito.
01:12:09As velhas enxergam e reparam numa série de coisas
01:12:12e uma pessoa realmente perspicaz
01:12:14que nem Miss Fanchave deveria estar a par de tudo
01:12:17que se passasse num lugar como Sanirid.
01:12:19Vivem desocupadas, compreende,
01:12:22com todo o tempo disponível para olhar em torno
01:12:25e tirar deduções e até conclusões precipitadas,
01:12:28que podem parecer fantásticas,
01:12:30mas às vezes resultam assombrosas
01:12:32e completamente acertadas.
01:12:34Tom me sacudiu a cabeça.
01:12:36Sei o que quer dizer,
01:12:38porém não me recordo de nada desse gênero.
01:12:41Soube que sua esposa está viajando.
01:12:43Não julga que ela talvez se lembre de algo
01:12:45que não lhe tenha chamado a atenção?
01:12:48Posso perguntar, mas duvido.
01:12:50Hesitou, depois se decidiu.
01:12:53Escute aqui.
01:12:54Havia uma coisa que intrigava minha mulher
01:12:57a respeito de uma das velhas,
01:12:59uma tal de Mr. Lancaster.
01:13:01Mr. Lancaster?
01:13:02Sim.
01:13:03Minha esposa meteu na cabeça que Mr. Lancaster
01:13:06tinha sido retirada do asilo
01:13:07por alguns supostos parentes de um modo brusco demais.
01:13:11Para dizer a verdade,
01:13:12Mr. Lancaster deu um quadro de presente à minha tia,
01:13:16e minha mulher achou que devia se oferecer para devolvê-lo
01:13:19e então tentou entrar em contato com ela
01:13:22para saber se não gostaria de recebê-la de volta.
01:13:25Bem, não resta dúvida de que foi uma atitude
01:13:28muito correta da parte de Mr. Beresford.
01:13:31Acontece, porém, que não houve meios de localizá-la.
01:13:35Conseguiu-se o endereço do hotel
01:13:37onde consta que teriam se hospedado,
01:13:40Mr. Lancaster e os parentes,
01:13:42mas ninguém com esse nome esteve lá
01:13:44ou sequer fez reserva de quartos.
01:13:46É mesmo?
01:13:47Que estranho!
01:13:48Sim, Tupence também achou.
01:13:51Em Sunny Ridge não deixaram nenhum outro endereço.
01:13:54De fato, fizemos inúmeras tentativas
01:13:57para entrar em contato com Mr. Lancaster
01:13:59ou com a tal mistress, Johnson,
01:14:02creio que se chamava, sem obter qualquer resultado.
01:14:05Havia um procurador que, segundo creio,
01:14:08pagava todas as contas
01:14:10e tomou as providências necessárias com Miss Packard.
01:14:13Nós o procuramos.
01:14:15A única coisa que pôde fazer
01:14:17foi me dar o endereço de um banco.
01:14:19E os bancos, acrescentou Tommy friamente,
01:14:22não fornecem informação de espécie alguma,
01:14:25especialmente se os clientes dão recomendação nesse sentido.
01:14:29Tem razão.
01:14:30Minha mulher escreveu a Mr. Lancaster
01:14:33por intermédia do banco
01:14:34e a Mistress Johnson também,
01:14:36porém nunca recebeu resposta.
01:14:38Isso parece um pouco fora do comum.
01:14:41Contudo, as pessoas nem sempre respondem
01:14:44as cartas que recebem.
01:14:45Talvez tenham viajado para o exterior.
01:14:48Exatamente.
01:14:49Por isso não me preocupei.
01:14:51Mas com minha mulher foi diferente.
01:14:54Parece convicta de que aconteceu
01:14:56qualquer coisa com o Mr. Lancaster.
01:14:58Para ser franco,
01:14:59durante o tempo em que estive fora de casa,
01:15:02ela disse que ia investigar,
01:15:03mas não sei precisamente
01:15:05o que queria insinuar com isso.
01:15:07Talvez ir em pessoa ao hotel,
01:15:09ou ao banco,
01:15:10ou mesmo ao procurador.
01:15:12Seja como for,
01:15:14disse que pretendia tentar
01:15:15obter maiores informações.
01:15:17O doutor Murray,
01:15:18embora acompanhasse a conversa cortesmente,
01:15:21denotava traços de um tédio paciente
01:15:23no comportamento.
01:15:25Em resumo,
01:15:26o que é que ela achou?
01:15:28Que Mr. Lancaster estivesse correndo
01:15:30um risco qualquer.
01:15:31Inclusive que alguma coisa
01:15:33já podia ter lhe acontecido.
01:15:35O médico arqueou as sobrancelhas.
01:15:38Ora, francamente,
01:15:39nem sou capaz de imaginar que...
01:15:41Talvez tudo lhe pareça
01:15:43uma perfeita idiotice,
01:15:45prosseguiu Tommy.
01:15:46No entanto,
01:15:47minha esposa telefonou
01:15:48avisando que voltaria ontem à noite
01:15:51e não voltou.
01:15:52Ela disse expressamente
01:15:54que pretendia voltar?
01:15:55Disse.
01:15:56Sabia que eu ia chegar.
01:15:58Entende,
01:15:59de uma conferência
01:16:00a que tive de comparecer.
01:16:01De modo que ligou
01:16:02para nosso empregado,
01:16:04Albert,
01:16:05prevenindo que estaria em casa
01:16:07à hora do jantar.
01:16:08E isso lhe parece
01:16:09uma atitude incomum nela?
01:16:11Perguntou Murray.
01:16:13Agora fitava Tommy
01:16:14com certo interesse.
01:16:16— Sim, respondeu.
01:16:17Não parece coisa de tupence.
01:16:20Se fosse chegar tarde
01:16:21ou mudasse de planos,
01:16:22telefonaria novamente
01:16:24ou mandaria um telegrama.
01:16:26— E está preocupado
01:16:27por causa dela?
01:16:28— Estou.
01:16:29— Sim, afirmou.
01:16:311.
01:16:32— Procurou a polícia?
01:16:33— Não.
01:16:34— O que pensariam?
01:16:35— Não que eu tenha motivo
01:16:37para acreditar
01:16:37que ela esteja metida
01:16:39em irascada,
01:16:40um perigo
01:16:40ou qualquer coisa do gênero.
01:16:42Quero dizer,
01:16:43se tivesse sofrido um acidente
01:16:45ou estivesse no hospital,
01:16:47fosse como fosse,
01:16:48alguém me notificaria logo,
01:16:50não é mesmo?
01:16:51Também me parece,
01:16:53sim,
01:16:54se levasse algum
01:16:55meio de identificação.
01:16:56Tinha a carteira de motorista
01:16:58e provavelmente cartas
01:17:00e várias outras coisas.
01:17:02O doutor Murray
01:17:03franziu a testa.
01:17:04Tommy continuou logo
01:17:06e agora o senhor me aparece
01:17:08com esse negócio
01:17:09sobre Sunny Reed,
01:17:10pessoas que morreram
01:17:11quando não deviam.
01:17:13Suponhamos que a velhota
01:17:14houvesse descoberto algo,
01:17:16visto alguma coisa,
01:17:17ou desconfiado,
01:17:19e se pusesse a falar
01:17:20a todo mundo.
01:17:21Teria de ser silenciada
01:17:22de qualquer maneira
01:17:23e, por isso,
01:17:24a levaram logo embora
01:17:25para um lugar
01:17:26onde não pudesse
01:17:27ser encontrada.
01:17:28É inevitável imaginar
01:17:30que tudo faz parte
01:17:31da mesma trama.
01:17:32É esquisito,
01:17:33não há a menor sombra
01:17:34de dúvida.
01:17:35Que tenciona fazer agora?
01:17:37Vou também começar a investigar
01:17:39por conta própria.
01:17:40Em primeiro lugar,
01:17:42falar com os tais procuradores.
01:17:44Talvez não sejam nada suspeitos,
01:17:46mas, em todo caso,
01:17:47gostaria de dar uma olhada
01:17:49e tirar minhas próprias conclusões.
01:17:51Trevas.
01:17:52E assim chegamos ao fim
01:17:54de mais um capítulo
01:17:55do NetDrive Audiobook.
01:17:57Se essa história
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01:18:09para ser notificado
01:18:10sempre que um novo capítulo
01:18:11for lançado.
01:18:13Mas essa trama
01:18:14ainda tem muito a revelar.
01:18:15O que será que nos espera
01:18:17no próximo capítulo?
01:18:19Será que os pressentimentos
01:18:20estavam certos?
01:18:21Ou ainda há reviravoltas
01:18:23inesperadas por vir?
01:18:24Continue acompanhando
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01:18:40Muito obrigado
01:18:40por ouvir até aqui.
01:18:42Nos vemos no próximo capítulo
01:18:44de Um Pressentimento Funesto.
01:18:46Até lá!
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