A modernidade a serviço do projeto colonial a província colonial de Angola

  • há 7 anos
Enquadramento Geral

Este texto foi originalmente escrito, pelo respetivo coordenador, para a edição impressa como introdução geral ao volume correspondente à área do globo em questão, sendo que foi deixado ao critério de cada um a possibilidade de o ir atualizando. É complementado pelos textos, da mesma autoria, relativos a cada uma das subdivisões geográficas segundo as quais as entradas desse mesmo volume foram agrupadas.



Traços comuns do património de origem portuguesa na África Subsaariana

Ao contrário do que se verifica no Brasil, no Oriente e nas áreas do Islão, o património de origem portuguesa na África meridional e central constitui um conjunto descontínuo e fragmentado, onde se podem distinguir dois tipos de territorialidade – um formado por dois vastos territórios coesos, continentais, outro composto por vários espaços dispersos, distribuídos ao longo de dois oceanos – e construções de duas grandes épocas – a Moderna e a Contemporânea – quantitativamente dominadas pelo património edificado nos últimos cinquenta anos da dominação colonial.

A dimensão contemporânea dominante do património existente imprime ao conjunto características próprias, nomeadamente o aumento de complexidade inerente a territórios de ocupação mais densa, com cidades maiores, mais espraiadas em relação às urbes da Idade Moderna, e conteúdos materiais mais diversificados. Estes aspectos, por sua vez, implicam problemas e cautelas especiais ao analisar os processos históricos referentes a épocas muito recentes. A título exemplificativo, podem citar‐se os notáveis exemplos de programas urbanísticos contemporâneos, quer entre as grandes cidades, quer no quadro das cidades menores, de Maputo a Lichinga, de Namibe a Lubango. Similares casos ocorrem na arquitetura, com a participação de muitos e qualificados autores “de escola”. São situações inovadoras que coexistem com assinaláveis casos de cidades mais antigas, como Luanda, Benguela, a Ilha de Moçambique, São Tomé, com as suas correlatas arquiteturas.

Por outro lado, a predominância do contemporâneo explica que nos encontremos naquilo que podemos designar por uma fase intermédia do conhecimento histórico sobre o património de origem portuguesa da África Subsaariana, ou seja, uma situação de determinação e identificação dos territórios que abrange, no gradual conhecimento dos seus sistemas urbanos e recheios arquiteturais, uma situação de busca, definição e caracterização dos documentos e de muitos dos seus monumentos. Tal situação desaconselha grandes interpretações globais, ou pelo menos exige especial cuidado nesse tipo de abordagem. Entretanto, e uma vez que a investigação original dos estudiosos dos PALOP parece francamente promissora, considerou‐se importante integrá‐la no quadro deste projeto.

A opção de considerar a África Subsaariana uma área autónoma do património de origem portuguesa justifica‐se pelo facto de nela se poderem distinguir características próprias, por comparação com outras áreas de influência portuguesa, como o Brasil ou o Oriente: 1) a duração da ocupação colonial desta área. Iniciada em Quatrocentos, prolongou‐se, desenvolveu‐se e firmou‐se durante o século XIX, até finais do século XX, o que não sucedeu com o Brasil, ou só sucedeu de forma residual no Oriente; 2) a diversidade das topologias de ocupação. Se nos séculos XV e XVI, a ocupação africana desempenhou um papel secundário no contexto do chamado Primeiro Império, com definição sobretudo de entrepostos pontuais e de rota marítima, já nos séculos XVII e XVIII se verificou uma certa penetração nos espaços interiores, seguindo os grandes rios, sobretudo nos casos angolano e moçambicano, com a extensão da colonização nas regiões do Kwanza e do Zambeze, e ao mesmo tempo a gradual ocupação de quase todas as ilhas de Cabo Verde, e a tentativa de reestruturação urbana pombalina na Ilha do Príncipe (> imagem junta, 2001). Finalmente, com a emergência do chamado Terceiro Império, foi encetada e consolidada a definição de vastas áreas territoriais em Angola e Moçambique, concretizada por meio de uma grande série de redes infraestruturais, construções urbanas e consequentes edificações arquitetónicas, que definiram a rede urbana atual dos dois países; 3) a relativa continuidade secular, institucional, político‐social e cultural conseguida, ao contrário do que sucedeu na América Portuguesa ou no Oriente (Médio‐Arábico, Extremo-Índico) – o que permitiu à propaganda colonial dos séculos XIX e XX, do constitucionalismo ao salazarismo, criar e promover a imagem da chamada África Portuguesa.

Duração, Diversidade e Continuidade são, pois, as características que aqui definem a área geográfica e conferem aos vestígios urbanísticos e arquitetónicos de influência portuguesa da África Subsaariana um carácter original.

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